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Rio de Janeiro, 24 de abril de 2024


Campus

Dapieve lembra os "tempos de muita política e cultura"

Bruno Alfano - Do Portal

10/12/2010

 Isabela Sued

Foi a vontade de escrever que levou Arthur Dapieve a entrar no curso de comunicação social da PUC-Rio, em 1982. A habilitação em jornalismo só seria decidida posteriormente e, para isso, a admiração aos professores Fernando Ferreira e Otávio Tostes foi "determinante". Hoje, a paixão pela escrita pode ser medida pelos 12 livros publicados, pela coluna semanal no Globo e pelas aulas de Laboratório de Jornalismo Impresso que ministra na universidade. Segundo o escritor, jornalista e professor, o começo da sua trajetória na universidade não foi fácil. Quando chegou, lembra que teve um “choque de realidade”:

– Eu havia passado a vida toda no mesmo pedaço de Copacabana. Quando fui para PUC, tive contato com gente da sociedade toda.

Além da diversidade humana, o clima de liberdade também chamou a atenção do rapaz de 19 anos que acabara de entrar na faculdade. “Foi uma mudança de mundo”, sintetiza. A atmosfera de fim da ditadura militar era vivida pelos estudantes. Segundo Dapieve, mesmo quem não parecia engajado politicamente participava de alguma maneira do esforço pela retomada do regime democrático:

– Era o espírito da época. Fazer algo para mudar o país. Esse clima tomava a faculdade.

No terceiro ano da graduação, em 1984, o espírito patriótico tornaria-se mais acentuado em Dapieve. A "esmagadora maioria" da turma, inclusive ele, esteve no comício das Diretas Já, na Candelária – a maior manifestação pública da história do Brasil, com um milhão de pessoas reunidas no centro do Rio de Janeiro.

– Eu nunca tive saco para participar de grêmio estudantil ou do Diretório Central de Estudantes, mas sempre acompanhei a política de perto – conta. 

 Isabela Sued Outra lembrança marcante, ainda sob a tinta política, foi a nomeação de José Sarney como o novo presidente do Brasil. Naquela manhã, no meio das férias de verão, Dapieve estava na PUC, pois antecipara duas disciplinas para se formar ainda no ano de 1985. Para o jornalista, Sarney ter assumido no lugar de Tancredo Neves foi uma "ironia histórica":

– Na hora que soube, quase tive um ataque de riso. A gente batalhou para ter um cara lá (Tancredo) e quem assumiu foi o vice dele (Sarney), que até o dia anterior apoiava os militares – disse.

A atmosfera extremamente politizada, porém, não sufocou as manifestações culturais no campus. "A época não era só de política, era de muita produção cultural também", esclarece. De acordo com Dapieve, o Diretório Central dos Estudantes (DCE) e o Centro Acadêmico de Comunicação Social (Cacos) estavam envolvidos na organização de "um monte de experimentações":

– Eu me lembro de rádios-novelas que o Fausto Fawcett fazia ao vivo, nos Pilotis, e era a cara dos anos 1980. 

Outra experiência foi o Flor do Campus, um jornal produzido pelo Departamento de Comunicação Social e editado pelo professor Fernando Ferreira. Por iniciativa de um grupo de alunos, ganhou um suplemento cultural, o Florzim. “Era uma página dupla, do tamanho de um tabloide, na qual a gente publicava poesia, telenovelas, coisas de humor, tudo bem dentro do espírito dos anos 1980”, conta. Arthur Dapieve escrevia os editoriais do jornal universitário. O primeiro foi um desafio que ele não esquece:

– Foi para a gráfica enquanto Tancredo [Neves] estava entre a vida e a morte. A gente não tinha como antecipar o que iria acontecer com ele, nem podia esperar. Então, eu tive que redigir um texto que fizesse sentido com Tancredo morto ou vivo. Assim que o jornal saiu, ele ainda estava vivo, mas logo morreu.

 Isabela Sued A experiência no Florim era o prelúdio da carreira jornalística. No Jornal do Brasil, onde começou, em 1986, e no Globo, Dapieve trabalhou em suplementos culturais. Nos seus livros não é diferente. Romance, crônicas, biografia ou ensaio sobre o jornalismo, o escritor busca na cultura – e especialmente na música brasileira – suas temáticas. Títulos como De cada amor tu herdarás só o cinismo, Morreu na contramão: o suicido como notícia, Renato Russo – um trovador solitário e Brocks: o rock brasileiro dos anos 80 retratam essa proposta.

Cultura também é sinônimo de futebol. O botafoguense Arthur Dapieve tira licença em época de Copa do Mundo para acompanhar todos os jogos. Entretanto, a Copa que acompanhou enquanto universitário não lhe traz boas lembranças. Em 1982, na Espanha, o grande favorito Brasil caiu diante da Itália de Paolo Rossi, que se tornaria a campeã. Uma derrota épica.

– Foi uma frustração que não dá para transmitir – resume.

Contra a frustração, Dapieve escalou a ironia. O jovem universitário passou a usar com frequência a camisa da seleção da algoz Itália.

– Uma coisa é não ganhar a Copa tendo o Dunga à frente, outra coisa é perder quando se tem o melhor time da competição – argumenta.

Na PUC, o futebol também tinha um adversário forte. Entre os contemporâneos de Dapieve, poucos se aventuravam a formar um time da comunicação para disputar os torneios no campus. Os interessados, segundo o jornalista,  juntavam-se aos colegas da engenharia. Nas quatro linhas, Dapieve conheceu Mauro Ventura, hoje colega do Globo:

– O Mauro ainda fazia engenharia quando a gente se conheceu. Depois ele, fez o que era inevitável: passou para comunicação.

 Isabela Sued
O amigo de futebol sugeriu-lhe a primeira arrancada na grande imprensa. Filho de Zuenir Ventura, na época editor do JB (e hoje colunista do Globo), Mauro recomendou a Dapieve que procurasse Zuenir para uma entrevista de emprego, pois este gostava de descobrir novos talentos para o jornal. Do encontro, Dapieve conseguiu a primeira oportunidade profissional.

– Eu mostrei umas pautas para o Zuenir e uma delas vingou. Aí puxou outra, outra, outra. Quando apareceu uma vaga para ser contratado, ele me chamou. Virou um trabalho regular – conta.

Aos 24 anos de profissão, Arthur Dapieve ensina o que sabe na universidade que o formou. Com a experiência de ex-aluno e professor, ele avalia:

– A PUC de hoje é bem diferente da universidade que eu comecei a frequentar. Com a politica de bolsas, há mais variedade ainda de pessoas, e a experiência é mais rica.