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Rio de Janeiro, 27 de julho de 2024


Campus

Gustavo Franco: "Quanto mais trem bala, maiores os juros"

Carina Bacelar - Do Portal

16/08/2010

Mauro Pimentel

No debate sobre os rumos da economia brasileira, parte do ciclo de palestras Caminhos do Brasil, sexta-feira passada, na PUC-Rio, as lembranças venceram as propostas. O ex-ministro Pedro Malan e o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco, integrantes da equipe econômica do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, enalteceram a estabilidade e as estratégias monetaristas empregadas na gestão FHC, que consideram essenciais para o avanço do país. Franco alertou que "investimentos estatais pesados", para aproximar o país do ritmo chinês, podem mantê-lo refém dos juros altos. Já o professor José Márcio Camargo, do Departamento de Economia da PUC-Rio, apontou a necessidade de o Brasil investir tanto em "capital físico", relacionado às finanças, quanto em capital humano, correspondente à qualificação dos cidadãos.

Após relembrar os "bons momentos" vividos na PUC como graduando em economia, Malan voltou a memória para a herança - positiva, na visão dele - deixada para o governo Lula. O economista disse que considera "primitiva" a visão de que o pais "só tomou seu rumo". Por outro lado, elogiou a transição feita por Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda do presidente Lula.

Ainda com o olhar no retrovisor, Pedro Malan exaltou o fato de o país ter superado a hiperinflação, que chegou a 100% ao ano no início dos anos 1990 e hoje gira em torno de 4,5 %. Para o Brasil assumir o protagonismo econômico desejado, ele apontou o que considera os principais desafios: qualificar a mão de obra qualificada; ampliar os investimentos em ciência e tecnologia; aumentar a eficácia das instituições políticas; melhorar a infraestrutura; aperfeiçoar a coordenação entre investimentos públicos e privados. 

No mesmo tom crítico de Malan, Gustavo Franco observou que a competição "desenfreada" pelos benefícios do setor público dificulta a eficiência dos serviços, e lembrou as conquistas do Plano Real . Segundo ele, a estabilização dos índices inflacionários possuía uma “intenção igualitária”:

– Desenvolvimentistas acham que devem tributar o pobre. Mas a estabilização apareceu com uma intenção igualitária. O Plano Real conquistou o coração do brasileiro. Nada do que foi feito na nossa época foi desfeito – disse o economista.

Ao explicar as elevadas taxas de juros do período 1994-2002, Franco criticou a forma como se tenta alcançar índices de crescimento semelhantes aos da China. Ele afirmou também que, por medo de criticarem os investimentos estatais pesados – aos quais apelidou de “neogeiselismo”, em referência ao governo do general Ernesto Geisel (1974-78) –, os principais candidatos à Presidência parecem iguais:

– A taxa de juros reflete os fundamentos fiscais e financeiros da gestão, reflete as finanças públicas. A tentativa de construir um “neogeiselismo” chinês expulsa a demanda privada por investimentos. O setor público consegue ficar grande, mas a custo de juros altos. Quanto mais houver Belo Monte e trem bala, por exemplo, maiores serão os juros para financiar esses investimentos – argumentou.

Na avaliação de José Márcio Camargo, o crescimento brasileiro passa pelo maior investimento em educação. O professor ressaltou a importância da qualificação dos cidadãos para um crescimento sustentado, de longo prazo.  O retorno do investimento em educação, segundo ele, seria "enorme": um ano de qualificação elevaria a renda em 12%. Trata-se de uma estimativa média, ressalva Camargo, pois "para ricos o retorno é maior" e para os mais pobres, menor. Parte dessa diferença justifica-se pelo salto qualitativo entre a educação recebida pela população de maior renda, capaz de pagar por bons colégios e universidades, e pelos mais carentes, dependentes das deficiências da rede pública de ensino.

– A educação ainda é pouco valorizada na sociedade brasileira. Apesar de as pesquisas revelarem a área como uma das que mais preocupam a população, nenhum político importante em nível nacional tem como prioridade a educação – criticou.

O professor considera que a “universidade pública pode perfeitamente ser financiada com o dinheiro privado”. Alegou que, como 95% dos alunos estão entre os 10% mais ricos da população, têm condições de pagar pelo ensino superior. Assim, os investimentos públicos seriam canalizados para a educação do pré-escolar ao ensino médio. O problema, ponderou Canmargo, não é o acesso à educação, pois 98% das crianças estão na escola, mas sim a qualidade do ensino oferecido.

– É preciso criar oportunidades para que os mais pobres sejam estimulados a investir em educação. Muitos olham em volta, vêem a baixa taxa de retorno e desistem – observou.