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Rio de Janeiro, 6 de maio de 2024


País

Fábio Leite: “O STF tem que ser dessacralizado”

Bruno Alfano e Luísa Sandes - Do Portal

12/08/2010

 Camila Grinsztejn O professor do Departamento de Direito da PUC-Rio Fábio Leite (foto) chamou a atenção para a prejudicial sacralização do Supremo Tribunal Federal em debate na universidade. Segundo Leite, o órgão tem uma grande importância para a sociedade, mas não pode ser tratado como “o único guardião da interpretação da Constituição”.

– Não é democrático que apenas um setor da sociedade interprete a Constituição. Uma questão religiosa, por exemplo, tem que ser discutida por antropólogos, sociólogos e religiosos e não apenas por juristas – exemplificou.

A declaração foi feita na quarta-feira (11/08), na mesa-redonda "Caminhos do Brasil no Direito", parte do seminário “Caminhos do Brasil” – realizado essa semana na PUC-Rio e organizado por estudantes da universidade. Na série de debates, setores da sociedade discutem os rumos do país em sete encontros, sobre os rumos do país “Na Política”, “Na Cultura”, “No Direito”, “Na Sustentabilidade”, “No Desenvolvimento”, “Na Economia” e “No Rio de Janeiro”.

Em sua palestra, o professor Fábio Leite criticou também o fato de que o STF passou a legislar.

– Em alguns processos, o Supremo deixou de interpretar a Constituição e passou a fazer escolhas. Para isso já existem os deputados – lembrou.

O problema, segundo o professor, é que uma decisão do colegiado não é reversível. “Se o Supremo decide algo, não dá para ir às ruas e protestar, pois aquilo foi considerado inconstitucional”. Além disso, Fábio Leite defendeu que os ministros são pessoas como quaisquer outras, mas, na prática, são muito mais prestigiados do que, por exemplo, os parlamentares:

– Um bom exemplo é o atual ministro da Defesa, Nelson Jobim. Ele já foi ministro do Supremo e deputado federal, ou seja, a mesma passou pelo Judiciário, Legislativo e agora está no Executivo. O ministro do Supremo é igual a todo mundo.    

 Camila Grinsztejn No debate, além de Fábio Leite, Joaquim Falcão, ex-aluno da PUC-Rio e atual diretor da Escola Jurídica da Fundação Getúlio Vargas, apontou outros desafios para a consolidação da democracia brasileira. Focando nas eleições, Falcão defendeu a proteção do voto livre.

– A universalização do voto já foi garantida. Agora devemos protegê-lo contra a influência de quem detêm o poder econômico, o político e dos meios de comunicação.

Entretanto, o professor acredita que esse processo de consolidação será permanente, mas que, ao mesmo tempo, já está bem encaminhado. Para Falcão, debates sobre o aperfeiçoamento das regras eleitorais são sinais positivos:

– O caso da atuação do presidente Lula nessas eleições, por exemplo, já sucitou o debate. Isso é mostra de evolução.

Falcão defendeu que uma democracia forte proporciona o Brasil a ter suas próprias ideias e importar cada vez menos soluções de fora, que nem sempre atendem às demandas do país. Exemplos como o etanol e o voto eletrônico foram citados como criações dos brasileiros. Além desses, a transmissão ao vivo das cortes brasileiras também aparece como uma invenção brasileira.

– Em nenhum lugar do mundo há esse mecanismo de transparência – afirmou.

 Camila Grinsztejn Na tarde de terça-feira, as eleições também apareceram em primeiro plano nas discussões. No debate “Caminhos do Brasil na Política”, o professor Ricardo Ismael (foto), coordenador de graduação do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio, afirmou que uma nova classe média emergiu no país nos últimos anos e isso, segundo ele, gera fortes desdobramentos políticos. Para o cientista político, o fortalecimento desse grupo social no Brasil pode suscitar uma tendência conservadora no processo eleitoral. Com medo de perder posição, a classe pode favorecer a continuidade.

Além disso, o professor Ismael chamou a atenção para a ampliação da classe C, conhecida como baixa classe média, que para ele pode ser explicada pelo aumento do salário mínimo, diminuição crescente da taxa de desemprego e criação do Programa Bolsa Família.

– A nova classe média pode pensar que não se mexe em time que está ganhando na hora de escolher seu candidato – explicou Ismael. – A expansão da classe média faz com que o poder central tenha cada dia mais poder. Porém, é falso dizer que só o governo é responsável por isso, municípios e estados também contribuíram para o desenvolvimento do Brasil – defendeu.

O seminário também contou com a participação do ex-ministro do Planejamento João Paulo dos Reis Velloso (1969-1979), que definiu a globalização como um fenômeno social, político, cultural e ambiental. Para ele, nos anos 1950, o Brasil era um país considerado subdesenvolvido, nos anos 1970, em desenvolvimento e hoje, emergente.

– Quero antes de morrer ser chamado de desenvolvido – disse João Paulo dos Reis Velloso, de 79 anos.

Para o ex-ministro, o maior problema do Brasil é institucional, não econômico. Por isso, o país precisa passar por uma revolução política e usar todo o potencial que tem para se desenvolver.