Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 6 de maio de 2024


País

"Foi um debate de apresentação dos candidatos"

Bruno Alfano - Do Portal

06/08/2010

 Divulgação

Foi realizado na noite de quinta-feira (05/08) o primeiro dos cinco debates confirmados na televisão entre os candidatos à Presidência nas eleições deste ano no país. Dilma Rousseff (PT), José Serra (PSDB), Marina Silva (PV) e Plínio de Arruda Sampaio (PSOL) estiveram na ocasião na TV Bandeirantes para um confronto mediado pelo jornalista Ricardo Boechat. O encontro – como era esperado – foi marcado pela polarização entre os candidatos do PT e do PSDB, que lideram as pesquisas. O Portal PUC-Rio Digital convidou o cientista político Ricardo Ismael, professor e coordenador do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio, para analisar o embate.

Segundo Ismael, o nervosismo atrapalhou a estreia de Dilma Rousseff nos primeiros blocos. Enquanto isso, Serra conseguiu, com a experiência de outras campanhas, se sair bem, mesmo sem ser carismático. O cientista político ainda criticou a atuação de Marina Silva, considerando que ela “perdeu a oportunidade de se posicionar como liderança” e elogiou a postura mais radical do socialista Plínio de Arruda.

Portal PUC-Rio Digital: Como o senhor avalia o primeiro debate da corrida presidencial de 2010?

 Mauro Pimentel RI: Olhando de uma maneira geral, o debate foi bom. Atendeu a expectativa. Os candidatos foram ouvidos sobre as questões mais problemáticas. Houve também algumas questões de caráter ideológico e alguns confrontos que deram um "molho" à disputa. Gostei que os temas abordados foram bem específicos. Acho importante que os debates sejam divididos em blocos com os temas mais relevantes dentro da agenda das eleições, como acontece nos Estados Unidos, por exemplo. Foi um debate de apresentação dos candidatos. Aconteceram confrontos, mas todos dentro de um limite. Não houve pancadaria. A campanha só pega fogo quando vai para a mídia, quando a televisão fomenta.  A internet só serve para repercutir os fatos. O grande veículo ainda vai ser a televisão, uma grande massa da população depende dela. Cada vez mais a mídia vai dar espaço para as eleições. Agora, a população vai entrar no clima. Acho que na primeira quinzena de setembro os assuntos mais polêmicos vão entrar em pauta.

P: Como um debate como esse pode ajudar o eleitor? 

RI: Na verdade, o debate ajuda no processo de decisão do voto do eleitor. Ele está vendo como o candidato reage, como se sai de improviso, como é o seu raciocino rápido e como se sai em uma situação difícil. O debate também mostra se ele tem o perfil de liderança. Essa esgrima que existe é importante. E, assim, é evidente que haverá conflitos. Ali, o candidato se mostra de uma maneira mais real – o que é importante para a decisão do voto. Esse debate serviu também para começar a campanha. Ajuda a massa de eleitores que está oscilando entre os candidatos e ainda não parou para pensar nos prós e nos contras de cada um.

P: Como, em sua opinião, foi a atuação do candidato José Serra?

RI: O Serra levou um sete ou oito. Ou seja, aquele aluno que passou na avaliação. Pode ser melhor? Isso é uma questão de dia, de oportunidade. Ele faz exatamente aquilo que tenta fazer: se colocar como a pessoa preparada, com experiência administrativa. Entretanto, ele não é um cara carismático, que vá emocionar. Até vi no twitter do Bruno Mazzeo ele dizendo que ‘se dependesse de carisma ele não tinha candidato’, mas o concurso não é de carisma e sim de presidência. É diferente. Se você tem um candidato que além de preparado é um cara carismático, melhor, mas isso não é uma credencial. O fato é que o Serra é mais racional, ele tem um certo ar professoral. Eu não esperava muito mais que isso. Se lembrarmos que o objetivo dele é se comparar com a Dilma e não com o Lula, ele obteve êxito. Mas está muito início. Ele precisa de uma seqüência de debates para ressaltar essa comparação. Ele foi confrontado pela Dilma em algumas questões mas conseguiu se sair bem, como no caso das privatizações, na questão da APAE [Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais]. Assim, ele colocou Dilma na defensiva e conseguiu se destacar.

P: E qual a análise que o senhor faz da atuação no debate da candidata Dilma Rousseff?

RI: A Dilma vai tentar fazer menos debates possíveis porque ela quer que predomine, na decisão do voto, o programa no rádio e na televisão, onde ela tem mais tempo do que Serra. Além disso, vai ter Lula do lado dela o tempo todo. No debate, o eleitor não olha o Lula. Olha a Dilma, e olha o Serra e olha a Marina. Ela gostaria que a campanha fosse só na televisão. Porque ali tem teleprompter, tem edição e tem o Lula. Ali ela não erra.

P: Mas como foi sua estreia nos debates eleitorais?

 Mauro Pimentel RI: A Dilma começou muito nervosa. O primeiro bloco dela realmente não foi muito bom e o Serra acabou levando vantagem. Só a partir do segundo bloco ela começou a ficar mais à vontade. A partir daí é que ela começou a se colocar de uma forma mais clara, respeitando o tempo, se dirigindo ao expectador. Tentando, inclusive, fazer algumas criticas ao governo Fernando Henrique e tentando colocar o Serra em uma situação difícil.

P: Então, a experiência de outros pleitos contou a favor do candidato Serra?

RI: Sim. Por estar claramente mais à vontade e também porque conta com muita habilidade de neutralizar questões adversas levantadas por Dilma, jogando imediatamente uma critica à adversária. Mas, em alguns momentos, como na questão da eletrificarão rural e da indústria naval, Dilma levou vantagem. Serra se sente mais à vontade nas discussões relativas à economia e à saúde e quando mostra sua experiência como prefeito e governador.

P: Qual candidato deixou mais a desejar?

RI: Eu acho que quem não se saiu bem foi a Marina. Ela deu a sensação de que ficou aquém do que se imaginava dela. Estava muito tensa, no inicio, com a fisionomia fechada, e um tanto quanto burocrática: respostas sem brilho, muito óbvias. Só a partir da pergunta feita por Dilma a ela – sobre o crack – que Marina começou a se soltar e deu uma resposta muito boa. Depois ela também se saiu bem na pergunta feita pelo Joelmir Beting [jornalista da TV Bandeirantes] sobre a questão do paradigma social e ambiental. No final, quando ela fala do poema do ‘Dado’, também conseguiu encontrar um bom tom. Entretanto, no geral, ela perdeu uma oportunidade de aparecer mais. Eu acho que a Marina cometeu três erros principais: primeiro tratar a Dilma como ministra. Acho que ela se sentiu em reunião, como ex-ministra que foi, e ficou formal demais. Depois, ela precisa urgentemente explicar qual é o significado de desenvolvimento que ela propõe. Porque, no fundo, o que ela está propondo é um novo tipo de desenvolvimento: com uma economia que não produza gases que prejudiquem o efeito estufa, mas ela precisa transformar isso em uma linguagem mais popular possível para ser entendida por todos. E, terceiro, ela é quem mais depende das mídias alternativas porque o tempo de televisão dela é baixo. E, principalmente, ela tem que se destravar nos debates. Tem que se mostrar como liderança – que ela é.

P: Qual a importância do debate para a candidata do PV?

RI: O debate, para ela e para o Plínio, é importante, pois o tempo é igual para todos. No horário eleitoral da televisão e do rádio, Dilma e Serra têm muito mais tempo.

P: Como o senhor avalia a performance no debate do candidato Plínio de Arruda, do PSOL?

 Mauro Pimentel RI: O Plínio, de uma certa maneira, conseguiu dar visibilidade a sua campanha. Ele puxou a discussão para o confronto ideológico. Assumiu logo que tinha a "defesa da igualdade", dentro do debate. E passou a sempre marcar a diferença ideológica entre ele (e o seu partido) com relação às candidaturas Dilma, Serra e Marina. Eu daria sempre o seguinte desconto: a Dilma, o Serra e a Marina estão tentando ganhar a eleição, têm chances de governar. Acho que o Plínio falou como quem não tem pretensão de ganhar e aí pode assumir muitas vezes posições que estão voltadas apenas para o partido. Enquanto os outros não podem falar só para o partido: eles têm que falar para o conjunto da sociedade porque estão pensando em governar. E quando governa você têm que levar em conta muito mais coisas do que somente os interesses do partido.  

P: Quais os efeitos que esse debate acarretará para o restante da disputa?

RI: Esse primeiro debate tem quatro efeitos: primeiro, quem assistiu ao debate, ou ouviu comentar, vai se interessar em assistir ao próximo. Acho que a audiência do próximo vai ser maior do que a do primeiro. Depois, deu para o Serra perceber que ganha mais do que perde com os debates. Mesmo treinada a Dilma não tem experiência, nem habilidade para lidar com a situação. Em terceiro lugar, o Plínio ganhou força para participar dos outros debates. E, por último, a Marina deu uma esfriada na militância dela. Quando o candidato não vai bem – e a Marina não foi – a militância sofre um baque.