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Rio de Janeiro, 20 de abril de 2024


Esporte

De estagiário a diretor-executivo

João Mauro Senise - Da sala de aula

20/07/2010

Mauro Pimentel

“Depois de 14 fins de semana seguidos sem folga, estava voltando para Londres, na esperança de descansar um pouco, quando vem a famosa frase: aproveita que você está aí perto e vai até a Suécia fazer uma matéria com o filho do Garrincha para o Fantástico.”

A frase foi dirigida a João Pedro Paes Leme, correspondente da TV Globo em Londres. Junto com o cinegrafista Sergio Gills, João Pedro foi entrevistar Ulf Lindberg Henrik, o filho “perdido” de Mané Garrincha com a sueca Margareta Lindberg. Ulf é fruto de uma “escapulida” que Garrincha deu durante uma excursão do Botafogo à Europa, em 1959.

Seria mais uma reportagem na carreira de Paes Leme, não fosse o pedido inusitado que veio do Brasil. “O pessoal do Fantástico queria que eu trouxesse um fio de cabelo do Ulf para fazer um teste de DNA. Eles queriam confirmar se Ulf era mesmo o filho do Garrincha. Não sabia como ia sair dessa encrenca”, conta. "A entrevista estava chegando ao fim, e eu não tinha coragem de fazer o pedido. De tempo em tempo, o Sergio cochichava no meu ouvido: 'tá acabando a entrevista, olha o cabelo!'

João Pedro foi ao carro buscar um envelope para guardar o cabelo de Ulf. Quando voltou, criou coragem e fez o pedido. “Quando perguntei a ele se podia me dar um fio de cabelo para fazermos um teste de DNA, ele começou a rir e disse que não tinha o menor problema. Segurou uma mecha do cabelo e perguntou se eu queria que ele cortasse em frente à câmera.”

Terminada a entrevista, hora de voltar para Londres, editar a matéria e enviar para o Brasil. A reportagem seria exibida no dia seguinte. No caminho para Rottenburgo, de onde sairia o avião para Londres, uma forte tempestade de neve começou a se formar. “O dia, que estava claro, ficou preto em um segundo. Parecia desenho animado, com a neve nos seguindo”, conta.

Quando conseguiram chegar ao aeroporto, os carros estavam cobertos de neve e máquinas já trabalhavam para limpar as estradas. Na fila para o check-in, outro problema: o cabelo de Ulf tinha sumido. “Ficamos desesperados. Procuramos em todos os lugares possíveis e nada do cabelo.”

João Pedro resolveu então voltar até o carro para procurar o envelope. O automóvel, que era alugado, já tinha saído do aeroporto. “Tivemos que ir até a locadora. Por sorte, o envelope estava dentro do porta-luvas”.

Apesar do contratempo, Paes Leme voltou ao aeroporto a tempo de fazer o check-in. Meia hora depois, todos os voos que saíam de Rottenburgo tinham sido cancelados por conta da tempestade de neve. A companhia aérea pagou o hotel e a matéria, que era para o Fantástico, acabou sendo exibida no Jornal Nacional de segunda-feira.

Antes de rodar o mundo como correspondente, João Pedro Paes Leme queria ser biólogo. Chegou a cursar cinco períodos até que, em 1989, largou o curso e prestou vestibular para jornalismo. No começo da carreira, João Pedro foi estagiário do Jornal do Brasil.

“Quando entrei no JB, só havia vaga na editoria de Esportes. Como sou apaixonado pelo assunto, percebi que tinha uma grande chance de realizar o sonho de ser correspondente internacional. E foi o que aconteceu mais tarde”, conta. No Jornal do Brasil, João Pedro trabalhou com nomes do jornalismo como Zuenir Ventura e Arthur Xexéo.

Em 1996, foi trabalhar na TV Globo, cobrindo Fórmula 1. “Rodei o mundo fazendo Fórmula 1. Foi uma experiência muito interessante. Ao mesmo tempo, o Globo Repórter aproveitava minhas viagens e eu acabava fazendo matérias para o programa”, diz.

Em 1998, João Pedro foi convidado para ser correspondente em Londres, substituindo Marcos Uchoa, que pediu licença para ficar com a família. “Sempre desejei morar fora e trabalhar como correspondente. Eu ainda era pouco experiente em TV, mas acho que aprendia as coisas com rapidez”.

Londres era o pólo da TV Globo na Europa. Em vez de um repórter, a cidade tinha seis ou sete profissionais. “Trabalhei com ótimos profissionais, como Ana Paula Padrão, Tonico Ferreira, Beth Lima, William Waack e Cesar Tralli.” As reuniões de pauta ocorriam toda manhã. Algumas eram sugeridas pelo Brasil e outras pelos próprios correspondentes.

“Dávamos uma olhada na BBC de seis da manhã a nove e meia para ver que assuntos poderiam interessar ao Brasil. Em seguida, definíamos quem ia fazer que matéria, de acordo com o perfil do repórter.”

Em 2004, foi enviado para a França como correspondente, onde ficou durante dois anos. Com uma equipe reduzida - apenas um cinegrafista – João Pedro trabalhava de casa, roteirizando e editando o material. Nesse tempo, cobriu quatro viagens do presidente Lula à Europa, o Ano da França no Brasil e entrevistou o então chefe de estado francês, Jacques Chirac, apenas para citar alguns trabalhos.

“A assessoria do Chirac era bem criteriosa, mas não criaram nenhum tipo de problema. Só fizeram apenas uma restrição: não trataríamos de assuntos ligados a política interna do pais. Era um momento delicado, as véspera de eleições presidenciais”, recorda.

Hoje, diretor-executivo de esportes da TV Globo, João Pedro Paes Leme sente saudades do tempo em que era repórter. “Na vida de repórter você tem dias muito diferentes. Na vida de executivo, você tem rotina. É um pouco cansativo porque não te dá novidades no dia-a-dia. Mas procuro driblar essa situação em busca de novos desafios, novas histórias, novos projetos”, conclui.