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Rio de Janeiro, 19 de abril de 2024


Cultura

Para especialista, inclusão deve guiar modelo de TV digital

Bruno Alfano - Do Portal

14/06/2010

Mauro Pimentel

A nova tecnologia de transmissão de sinais de TV foi tema de um dos 38 livros lançados no XIX Encontro Anual da Associação Nacional dos Programas em Pós-graduação em Comunicação (Compós 2010), realizada de 8 a 11 de junho na PUC-Rio. Em “TV Digital, Economia Política e Democracia”, organizado pelo professor da Unisinos Valério Brittos, 12 textos dialogam com o futuro da televisão no Brasil, quando a revolução da TV digital estiver em pleno funcionamento. Em 2007, 17 cidades, incluindo o Rio de Janeiro, receberam o sinal digital; e até 2012 o processo estará concluído em todo o país, com a aposentadoria do sinal analógico. Os principais efeitos desse admirável mundo novo, especialmente os proporcionados pela interatividade, devem demorar um pouco mais para tornarem-se efetivos. Ainda assim, é possível prever um reforço significativo à inclusão digital de milhões de brasileiros, afirma Valério. Em entrevista ao Portal PUC-Rio Digital, o especialista explica por que a nova tecnologia tende a ser essencial para a inclusão  – "desde que a sociedade cobre investimento público contra a exclusão"  –, aponta caminhos para transformar em prática o discurso da interatividade e conta como foi a organização do livro récém-lançado.

Portal: Qual a principal questão abordada no livro?

Valério: Acho que a grande preocupação dos textos que compõem o livro é a construção de um padrão estético alternativo. Uma outra forma de fazer audiovisual alternativa ao padrão hegemônico. Uma alternativa que fale de outras questões, com abertura para diversidade; e a baixo custo, para que a própria sociedade possa fazer audiovisual, e participar dessa arena midiática, independente dos grandes conglomerados de mídia. Este é o nosso grande desafio. Acreditamos que seja possível com a prática desse padrão técnico estético alternativo.

P: O que o senhor acha do modelo de TV implantado pelo Brasil?

V: O Brasil poderia ter construído um outro modelo de TV digital. Mas, diante do que foi definido, a solução é apostar na interatividade. Pesquisadores e a sociedade têm que se mobilizar a favor da instalação do ginga – software que garante a interatividade – em todos os conversores, televisores e celulares. Além disso, tem que se definir um canal de retorno para se ter uma interatividade plena. Se o Brasil conseguir isso, teremos um grande avanço. Será possível, por exemplo, realizar votações de governo e marcações de consultas pela TV digital. Mas a interatividade, por enquanto, é só um discurso.

 Mauro Pimentel

P: Como será a interatividade no Brasil e o que falta para se tornar realidade?

V: Para a interatividade simples, basta que se tenha um software, no caso o ginga, que será instalado no conversor e no televisor. Assim, o usuário poderá receber os conteúdos via TV e interagir. No caso da interatividade avançada, é preciso de um canal de retorno – que leve o sinal do receptor (casa) até o operador de televisão (emissora). Só assim, ele [o usuário] pode dar uma resposta, responder uma votação, marcar uma consulta, pedir determinados conteúdos e até mandar conteúdos para a televisão, como um pequeno vídeo. Mas é preciso investimento público, porque o canal de retorno tem que ser uma rede sem fio e gratuita. Se for paga e com o preço alto, exclui uma grande parte de população. A gente tem que lutar por isso agora.

P: Qual a posição do Brasil, em relação aos outros países, na implantação da TV digital?

V: É difícil criar um parâmetro de comparação com outros países. São modelos diferentes. No caso dos EUA, por exemplo, 90% da população recebe televisão por sistema fechado, e isso se reflete no formato de interatividade, de distribuição de conteúdo etc. Como o Brasil tem uma condição específica, acaba sendo um grande laboratório. Porque nenhum país, das dimensões do Brasil e com os problemas como os nossos, passou por essa transição do analógico para o digital, em termos de televisão. O Brasil é um caso atípico: tem pouca TV por assinatura, tem um grau de exclusão da sociedade digital, é um país grande em território e é um grande produtor de conteúdo audiovisual. Podemos desenvolver um modelo a ser seguido, pela Índia, por exemplo, e outros tantos.

P: A interatividade é vantajosa para as grandes empresas de produção de comunicação?

V: O modelo interativo de TV digital é vantajoso economicamente para as empresas de produção de comunicação. A principal vantagem é mesmo a possibilidade de inclusão social: atores sociais que estão fora do mundo digital passariam a participar desse mundo via TV digital. Ao mesmo tempo, ele é vantajoso para as emissora de televisão, porque representa a produção de mais conteúdos que, como se diz, vão fidelizar o público. Se as pessoas tiverem conteúdos mais interativos, elas tenderão a consumir mais TV. Este é o novo desafio da televisão, até para não perder público. 

P: As pessoas que passarem a produzir conteúdo serão consumidores-produtores. Qual o perfil desses "atores"?

V: Vários públicos devem participar deste processo, mas a gente tem se preocupado especialmente com o público jovem, o universitário. Porque quanto mais jovem, mais preparado para o novo, mais tem vontade de fazer diferente, de participar dessas questões, e já tem algum grau de relacionamento próximo com a mídia. O universitário torna-se, assim, o principal público para participar desse processo. Logicamente, os alunos de comunicação – jornalismo, publicidade, cinema, relações públicas – se interessam mais, pois têm um conhecimento técnico adquirido.