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Rio de Janeiro, 5 de maio de 2024


País

Especialistas avaliam as táticas na Copa dos Royalties

Evandro Lima Rodrigues e Lucas Soares - Do Portal

21/06/2010

O Senado aprovou na madrugada de 15 de junho, a algumas horas do início da Copa, a emenda que redistribui os royalties da exploração de petróleo no mar,  inclusive fora da área do ambicionado pré-sal, para todos os estados da federação. O polêmico projeto, que subtrairá dos cofres fluminenses algo em torno de R$ 7 bilhões, passará por votação na Câmara antes de ir para a sanção do presidente Lula. Os governadores do Rio, Sérgio Cabral, e do Espírito Santo, Paulo Hartung, confiam no veto presidencial, mas a virada insinua-se difícil. Enquanto o time de Dunga avança na África do Sul, parlamentares afiam as táticas retóricas, políticas e regimentais para vencer a disputa iniciada em março deste ano, quando o deputado Ibsen Pinheiro deu o pontapé inicial para a troca do modelo de distribuição dos royalties. Na avaliação do economista José Márcio Camargo, professor de Teoria do Desenvolvimento Econômico da PUC-Rio, o texto protocolado pelo senador Pedro Simon (PMDB-RS), mesmo se aprovada pelo presidente Lula, não passará no Supremo Tribunal Federal (STF), pois apresenta, supostamente, trechos inconstitucionais. Já o também professor da PUC-Rio e doutor em Ciência Política Ricardo Ismael, acredita que o governador Sérgio Cabral corre o risco de perder o jogo, porque "não se articulou para revertê-lo". 

Segundo a nova proposta protocolada por Simon, cabe a União compensar perdas de estados produtores, como Rio de Janeiro e Espírito Santo. Para o Camargo, "o problema deveria ser resolvido já na esfera Legislativa". Se o presidente Lula não vetar a emenda, o Supremo deve considerá-la inconstitucional, prevê o professor. Camargo acredita que, no entanto, que o presidente terá "bom senso" e não assumirá a fatura política do rombo de R$ 7 bilhões no Rio de Janeiro, especialmente em ano eleitoral: 

– Acho pouco provável que o Lula vote a favor [da emenda]. Ele não depende disso para eleger sua candidata (Dilma Roussef). 

O contra-ataque de Sérgio Cabral, concentrado no alerta dos efeitos drásticos da redistribuição dos royalties na economia fluminense, revela-se tardio, avalia Ricardo Ismael. Para o cientista político, a aprovação do projeto no Senado só aconteceu devido "à falta de articulação do governador":

– Ele errou três vezes: quando desmobilizou a população e não continuou com a campanha em defesa do Rio;  quando não se articulou com o presidente Lula; e quando não atentou para o fato de a proposta sair de membros do próprio partido [PMDB].

Quanto à decisão do presidente, Ismael mostra-se em dúvida. “A questão é se ele [Lula] vai desagradar 25 [estados] em prol de dois”, pondera. Para o especialista, seria mais razoável não discutir isso agora e esperar uma proposta intermediária.

Já a jurista Leise Taveira, professora do Departamento de Comunicação da PUC-Rio, acredita que a decisão do presidente Lula "não fará diferença". Ela lembra: “quem manda na lei é o Poder Legislativo”. Se o Congresso resolver derrubar o veto do presidente, a bola voltará ao Supremo.

– Todas as possibilidades são viáveis, ainda mais em ano eleitoral, no qual ninguém quer se comprometer – afirmou.

Camargo considera improvável o jogo ser decidido no Congresso. Pois, segundo ele, a lei é "claramente inconstitucional". O economista lamenta o que chama de “judicialização do legislativo”, mas lembra que os estados do Rio e Espírito Santo têm direitos consagrados pela Constituição.

O projeto que recria a emanda proposta pelo deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) foi aprovada por 41 votos, contra  28 contra. A aprovação da emenda frustrou a estratégia traçada pelo governo de deixar a discussão dos royalties para depois das eleições.

– Difícil aceitar essa posição de gritar depois do acontecido, do leite derramado. O governador foi omisso – opina Ismael.

O especialista avalia que a questão precisava de mais tempo para amadurecer. A crise federativa gerada pela discussão poderia ser evitada caso a bancada do Senado tivesse mobilizado os colegas. Segundo ele, as regras para compensações financeiras devem ser iguais para todos os estados:

– Se muda a regra para os royalties do petróleo, tem que mudar também para os recursos minerais e hídricos – argumenta.

Camargo defende o uso racional dos royalties independente de como ficará a distribuição. O professor ressalta: é importante que tanto governo quanto o setor privado estejam preocupados com possíveis desastres ecológicos durante exploração do petróleo. Ele sugere a criação de uma reserva para o aperfeiçoamento técnico e a capacitação dos profissionais das plataformas:

– O petróleo é uma riqueza importante. O consenso significa que os recursos deveriam ser utilizados para aumentar o estoque de capital humano e físico, e não para consumo imediato.

Novela lubrificada

A discussão sobre a partilha dos royalties do petróleo é antiga. Em março deste ano, uma proposta de emenda ao projeto feita pelo deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) foi aprovada na Câmara dos Deputados. Líderes políticos do estado do Rio de Janeiro mobilizaram a população para uma passeata contra a proposta.

A emenda aprovada pretendia mudar não só a distribuição dos royalties do petróleo do pré-sal, ainda a ser explorado, mas as reservas já exploradas. A mudança prejudicaria o orçamento de estados habituados com a receita vinda do óleo, especialmente Rio e Espírito Santo.