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Rio de Janeiro, 5 de maio de 2024


País

Os direitos e limites da liberdade de expressão

Lucas Soares - Do Portal

20/05/2010

Mauro Pimentel

Maior qualificação do profissional de imprensa, democratização do acesso à informação e auto-regulamentação da mídia. Estas foram algumas das propostas defendidas por juristas e jornalistas reunidos no Seminário sobre Liberdade de Imprensa: Realidade, Obstáculos e Soluções. Embora tenham divergido sobre a necessidade de se criar novas legislações para nortear a atividade jornalística, eles concordaram que o profissional, que age de acordo com a lei, não pode ser censurado.

A jornalista Leise Taveira (foto), também advogada e professora da PUC-Rio, defendeu a soberania da Constituição na resolução de casos que envolvam a imprensa, para suprir a falta de uma regulamentação específica. Ela enfatizou que “decisões judiciais não caracterizam censura”.

 Mauro Pimentel – A Constituição é a nossa Carta Magna. Não é para brincar, não é para enfeitar. É para conhecer, respeitar e obedecer – ressaltou.

Já o jornalista e também professor da PUC Chico Otávio (foto) criticou os mecanismos de controle embutidos, segundo ele, nas regulamentações. Para o repórter do Globo, são ferramentas de censura disfarçadas:

 – Tenho medo da palavra limite. O estabelecimento de mecanismos de controle, tutelas, normas, tudo isso me assusta muito.

Na opinião dele, o controle social espontâneo da mídia é "o mais importante mecanismo" para regular a imprensa, ou seja, para manter o conteúdo dentro da excelência exigida pelos compromissos ético e democrático. O jornalista mostrou-se preocupado também com a autocensura. Embora defenda que a publicação ou não de uma denúncia deva ser cuidadosamente avaliada, Chico criticou o que ele chamou de “indústria da moral”:  Mauro Pimentel

– O problema é que essa indústria, movimentada por figuras como o juiz Nicolau [dos Santos Neto, condenado por corrupção], o Maluf e o Daniel Dantas, traz para redações o perigo da autocensura. Muitas vezes o editor de uma matéria é o advogado – alertou.

Chico Otávio debateu com os alunos "o golpe abaixo da cintura" sofrido no mês passado. Um e-mail falso em nome do repórter foi enviado para 180 desembargadores do Rio de Janeiro. Para ele, o episódio pode representar uma "estratégia de boicote ao trabalho de jornalistas".

Leise foi taxativa ao argumentar que não existem direitos absolutos. Para ela, a liberdade de imprensa tem limites, mas cabe ao jornalista definir o que deve ou não publicar. De acordo com o artigo 5º da Constituição, é garantida a liberdade de imprensa, desde que seja vedado o anonimato, lembrou Leise. Para a professora, o Estado deve garantir que o “direito de imprensa se sobreponha ao direito de empresa”:

– Muitas vezes os interesses comerciais, que são típicos da sociedade capitalista, fazem com que o direito de empresa se sobreponha ao direito de imprensa. Portanto, o Estado, que um dia foi o algoz da liberdade, hoje deve ser um garantidor da qualidade da imprensa.

 Mauro Pimentel Julio Mesquita (foto), de O Estado de S.Paulo, afirmou que, durante os 135 anos de história, o jornal sofreu censura de diversas formas. A primeira "privação de liberdade de expressão" aconteceu, segundo ele, no governo de Artur Bernardes. Com o Estado Novo, mais uma vez os jornalistas foram censurados por criticarem o governo de Getúlio. A maior privação remonta ao regime militar, comparou. Neste período, lembrou Mesquita, os censores ficavam de plantão na redação. O Estadão ganhou visibilidade mundial ao denunciar a censura prévia com a publicação de trechos de Os Lusíadas, de Luís de Camões, no lugar de reportagens proibidas pelos censores.

– O jornal deixou de se autocensurar. Essa pretensão só acabou em 1975, após terem sidos multilados ou elimindos mais de 1.100 textos. Nossos leitores não deixaram, contudo, de saber que os jornais estavam impedidos de publicarem informações ou emitirem opiniões.

O jornalista comentou ainda o caso mais recente. Em julho de 2009, os veículos de comunicação do Grupo Estado ficaram impedidos de publicarem informações sobre a operação Boi Barrica, devido a um processo movido por Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney. Fernando alegou que o processo pelo qual era investigado corria em segredo de justiça.

 Mauro Pimentel Jéssica Carvalho Morris (foto), advogada e representante da Anistia Internacional, lembrou as dificuldades impostas aos jornalistas, sobretudo na América Latina. Segundo ela, a liberdade de imprensa "diminuiu" em 2009, pelo oitavo ano seguido. Os números são da Freedom House, organização não-governamental que realiza uma série de pesquisas, defesas e publicações para promover os direitos humanos, a liberdade de imprensa e o estado de direito.

– Dos 196 países e territórios, 69 foram classificados como livres, 64 como parcialmente livres e 63 como não-livres. Muitos declínios observados aconteceram em democracias emergentes como países da América Latina e da antiga União Soviética – especificou.

A advogada ressaltou ainda a importância dos acordos e pactos internacionais assinados pelo Brasil para a manutenção da liberdade de imprensa, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos e o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. No cenário da América Latina, são três os acordos: Declaração Americana sobre os Direitos do Homem; a Convenção Interamericana dos Direitos Humanos; e o Tratado Internacional de Chapultepec, o qual o Brasil assinou duas vezes.  Mauro Pimentel “A primeira em 1996, quando o presidente era Fernando Henrique Cardoso, e em 2006, pelo presidente Lula", lembrou Jéssica. Os estudantes foram convidados a assinar a declaração em apoio à liberdade de expressão.

O advogado Carlos José Guimarães (foto), professor da Escola Superior de Advocacia, destacou que a democratização dos meios de comunicação não é suficiente para a garantia da liberdade. É importante, segundo ele, que a mídia seja "liberta dos políticos que controlam os meios de comunicação". Assim como Leise, Guimarães argumentou que o Judiciário, quando decide, não é censor:

– A redação da Constituição não foi feita à toa. Censura é ato político.

O coordenador do curso de Jornalismo da PUC-Rio, professor Leonel Aguiar (foto), defendeu a exigência do diploma. Disse que a universidade está na vanguarda pelo apoio à formação específica.

 Mauro Pimentel – Nada mais justo do que o profissional que queira trabalhar na área se qualifique. Estamos na defesa pela qualificação específica, pautada pelos debates teóricos, políticos e técnicos – explicou o professor.

Ele defendeu também o controle social da mídia e lembrou que a auto-regulamentação, importante para a liberdade de imprensa, de certa forma já acontece:

– Quando um jornalista ganha um prêmio, por exemplo, isso demonstra que nós jornalistas entendemos que aquela matéria ou aquela reportagem é o que tem de melhor na produção jornalística – disse.