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Rio de Janeiro, 3 de maio de 2024


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PUC-Rio reúne especialistas em homenagem a Joaquim Nabuco

Yasmim Rosa - Do Portal

05/05/2010

Fotos: Fundação Joaquim Nabuco

Em homenagem ao centenário da morte de Joaquim Nabuco, o Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio promoveu no dia 6 de maio, o debate Joaquim Nabuco: história e política. Para participar da mesa-redonda foram convidados a professora da universidade Maria Alice Rezende, o professor da Universidade Estadual Paulista (UNESP) Marco Aurélio Nogueira e o presidente da Fundação Casa Rui Barbosa, José Almino. O seminário foi transmitido ao vivo pelo Portal PUC-Rio Digital (veja as palestras e o debate com o público) e fez parte do movimento em torno do Ano Joaquim Nabuco, instituído por uma lei federal em 2009. 

Segundo a professora Maria Alice Rezende, o encontro teve a finalidade de chamar a atenção para a história do Brasil e a importância de Joaquim Nabuco no processo político do país.

– O Departamento tem essa marca de pensar o Brasil, a nossa história.

Poucos intelectuais foram tão importantes para a história brasileira como Joaquim Aurélio Barreto Nabuco de Araújo (Recife, 1849 – Washington, 1910). O pensador, escritor, historiador, jurista, jornalista, diplomata e político pernambucano teve uma passagem significativa na vida política do Brasil e foi uma figura atuante no processo de abolição da escravatura que ocorreu em 1888.

Autor de obras importantes como O abolicionismo (1883), Balmaceda (1895), A escravidão (1949), Um estadista do Império (1896) e Um estadista do Império. Nabuco de Araújo: sua vida, suas opiniões, sua época (1897), Joaquim Nabuco foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. No livro Minha formação, publicado em 1895, ele conta episódios de sua vida em uma família escravocrata e sua posterior opção em favor dos escravos e da abolição.  

Filho de Nabuco de Araújo, uma das figuras mais importantes do Segundo Reinado, ele cresceu em uma casa onde a política era um tema recorrente. As festas e banquetes fizeram com que Nabuco tivesse os primeiros contatos com ministros, senadores e personagens ilustres. Ele integrou a geração de homens que delinearam as bases da nação, dando início a tendências profundas e de longo prazo no país.

De acordo com Maria Alice, Joaquim Nabuco contribuiu de diversas formas para a formação do país. Segundo ela, Nabuco foi um dos principais intérpretes do Brasil e traduziu a política de forma original.  

– Ele não tem uma contribuição específica. A grande obra da vida dele foi a abolicionista, que ficou mais evidente e marcou a sua vida. Vários livros de sua autoria são sobre esse assunto – afirmou Maria Alice.

O político pernambucano foi um dos homens que lutou pela abolição da escravidão no Brasil e deu consistência ao movimento abolicionista. Sua história de vida diz muito sobre essa opção em favor dos escravos. Ele passou parte de sua infância morando com os padrinhos em uma fazenda em Pernambuco e conviveu com a escravidão diretamente nesse período. Quando adulto, quis mudar o cenário brasileiro e acabar com um sistema que já não se justificava naquele momento. A Lei Áurea assinada pela princesa Isabel em 13 de maio de 1888 foi uma vitória para o movimento abolicionista e o início de transformações importantes para o Brasil.  

Para o professor Mauro Aurélio Nogueira, autor do livro O encontro de Joaquim Nabuco com a política - As desventuras do liberalismo, Nabuco foi um político diferente, que associou a causa pública a uma “boa dose de sofisticação intelectual”. Ele fez política em uma época em que esse era um assunto de elites bem educadas, que atuavam com “punhos de renda”. Atuou em um momento em que a política não era massificada como hoje.

– Ele mostrou que a política só tem a ganhar se definir com clareza um foco de atuação: quer dizer, deixar explícita uma meta a ser alcançada. “A grande questão política do Brasil é a escravidão”, disse nos anos do abolicionismo. Qual a nossa grande questão atual? Se ouvirmos com atenção os discursos políticos, descobrimos somente generalidades, desenvolvimento, criação de empregos, estabilidade financeira, recuperação do Estado, infraestrutura, coisas que seguramente são importantes, mas que não configuram uma imagem de país.

 Segundo o professor, a maior contribuição do escritor para o Brasil foi demonstrar que a política não pode se valorizar e cumprir funções positivas se não estiver associada a quadros ideais bem estruturados e transparentes. “É o que falta para a política atual”, afirmou Marco Aurélio Nogueira. Não há “uma idéia-força que articule e dê sentido às medidas mais importantes que são propostas. Um exemplo seria tratar do desenvolvimento econômico sem apresentar um plano definido de desenvolvimento social”, completou.

De acordo com o professor, Nabuco também se destacou por “emprestar poesia” a todas as causas a que se dedicou, reforçando suas intervenções com “construções ideológicas e valorativas densas”.

– Essas construções traziam consigo uma identidade e davam maior “universalidade” às suas proposições. Com isso, ele não só “embelezava” a política, mas dava nobreza e consistência a ela, coisas que faltam bastante hoje em dia – afirmou Marco Aurélio.

Para a Maria Alice, além de um dos maiores pensadores sobre a vida da elite brasileira, ele também refletiu sobre uma forma de liberalismo calcado em uma modernização sem revolução, o chamado “liberalismo contido”. Ele defendia um processo de transformação progressiva sem mudanças radicais. 

– Ao contrário de Frei Caneca, Nabuco pensou um processo de transformação à inglesa. Podemos dizer que ele continua atual quando pensamos a partir do liberalismo, que ao longo da história do Brasil, tentou acomodar a mudança com a conservação. Essas transformações se dão em um tempo dilatado e não destrói lideranças. Esta é uma marca contemporânea.

Apesar de apresentar uma característica reformista, Nabuco seguiu um caminho inverso ao se colocar contra a proclamação da República e defender a monarquia. Para Nogueira, foi a experiência política fora do país que o levou a apoiar a permanência de um sistema monarquista.

Em Londres e nos países europeus por onde circulou, ele consolidou sua admiração pelo parlamentarismo, até mais do que pela monarquia. Nos Estados Unidos, conheceu o presidencialismo republicano numa versão diferente que se tinha na América do Sul. No entanto, chegou à conclusão de que aquilo que valia para os norte-americanos não valia necessariamente para os sul-americanos. Para ele, na América do Sul, em particular no Brasil, faltavam elementos importantes de sustentação de um sistema presidencial eficiente, que moderasse as ações do presidente e neutralizasse o risco de autoritarismo e tirania.

– O principal argumento para a conservação da monarquista era a convicção de que, num país continental como o Brasil, com uma população cortada pela escravidão e pelo despreparo político, um sistema como a monarquia, com seus ritos, seu simbolismo e, sobretudo, com a continuidade administrativa assegurada pela hereditariedade do rei, poderia ser um importante fator de unidade nacional e construção da cidadania – afirmou o professor Marco Aurélio Nogueira.

Outros fatores, como a questão dos escravos, também ajudam a explicar a opção monarquista. Nogueira ressaltou que Nabuco foi abolicionista sem deixar de ser monarquista, numa época que era mais fácil ser republicano. Em certos momentos colaborou com a República, mas em todas às vezes seguiu aquilo que achava que era importante para a nação. Mas muitos republicanos eram contrários à abolição, o que dificultava a aproximação de Nabuco. Ele foi contra a proclamação da República por acreditar que a continuidade da monarquia iria garantir a implantação da Lei Áurea, e, assim, fazer com que a abolição fosse “mais do que a mera liberdade jurídica dos escravos”.

– Também foi contra a República por ter acumulado muitas afinidades com pessoas e procedimentos típicos do regime monárquico. Mas creio que o mais importante de sua atitude foi a desconfiança na capacidade que os republicanos teriam de pavimentar um caminho pacífico para o desenvolvimento político e social do país. Não me parece que isso tenha sido retrocesso em sua trajetória política. Mas o Nabuco que emerge com o fim da Monarquia é "outro", bem menos revolucionário e combativo, bem mais conservador e introspectivo.