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Rio de Janeiro, 6 de maio de 2024


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"No Brasil, o corpo é a verdadeira roupa"

Lucas Soares - Do Portal

18/03/2010

 Lucas Soares

“O corpo é o mais importante capital na cultura brasileira”, concluiu a professora e antropóloga Mirian Goldenberg em palestra na PUC-Rio, nesta segunda-feira. A pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA) do IFCS, UFRJ, apresentou os resultados de sua pesquisa que já dura mais de 20 anos. Segundo Mirian, o corpo, sobretudo para mulher brasileira, funciona como uma grife.

Com o título Mídia, gênero e envelhecimento: a mulher de 50 anos e o ideal de beleza na cultura brasileira, Mirian abordou o ideal de beleza da mulher brasileira em contraponto a outras culturas. No estudo feito com homens e mulheres cariocas, que responderam a perguntas como “O que você inveja em um(a) homem/mulher?”, “O que você inveja no sexo oposto?” ou “O que te atrai sexualmente?”, a pesquisadora conta que todos os entrevistados, em algum momento, elegeram o corpo como o mais importante.

De acordo com as 835 mulheres entrevistadas, o ideal de beleza feminino é definido por uma mulher “magra, jovem, cabelos loiros e longos, bunda grande, seios firmes, linda e muito atraente”. Reflexo do estereótipo europeizado que a sociedade brasileira vem adotando, observou a professora. Diferentemente do que se imagina, a beleza legitimamente brasileira não é reconhecida. Segundo Mirian, o conceito de mulher brasileira idealizado pelo sociólogo e antropólogo Gilberto Freyre está longe de ser o "ideal":

– Para Freyre, mulher brasileira é do tipo mignon. Cabelos longos, castanhos e crespos, pele morena. Formada da mistura das três raças que formam o país. Sônia Braga seria a maior representante de mulher brasileira no tempo de Freyre. Hoje, a Juliana Paes é a nova mulher brasileira – exemplifica.

A professora ressaltou que as diferentes culturas partilham a inclinação, mesmo inconscientemente, de imitarmos os corpos de quem tem prestígio. Citando o conceito de “imitação prestigiosa” desenvolvido pelo sociólogo francês Marcel Mauss, Mirian reforçou: esse não é um fenômeno apenas brasileiro.

– Quando pensamos em imitar, não é só porque queremos imitar ou sermos iguais. Queremos imitar para conquistar o que essas pessoas, que possuem o corpo como principal capital, têm e nós não temos.

 Lucas Soares No Brasil, jogadores de futebol, modelos, atores e apresentadores ditam a moda. Pessoas imitam não só os apectos físicos, mas o comportamento dos famosos, apontou Mirian. Ela destacou ainda a relação que nós brasileiros temos com a roupa. Enquanto na França, por exemplo, as roupas funcionam como camuflagem, no Brasil as mulheres se vestem para moldar o corpo. Roupas viram "meros acessórios" nas mãos das brasileiras, opinou a pesquisadora. Na França, contou Mirian, as adolescentes imitam as mães para aprenderem a se portar como adultas. No Brasil, ao contrário, mães e filhas se vestem da mesma maneira para “parecerem mais jovens”, o que é impensável na Europa. Segundo a professora, ser uma mulher madura e se comportar como tal na França é um valor. No Brasil, é ser taxada como velha:

– A verdadeira roupa no Brasil é o corpo.

Na palestra, Mirian esclareceu aspectos do estudo que desenvolve há pouco mais de dois anos, no qual pesquisa como as mulheres brasileiras com mais de 50 anos encaravam o envelhecimento em meio à cultura onde o corpo é o "bem" mais valioso. Os resultados mostram que as mulheres brasileiras nessa faixa de idade costumam se queixar da deteriorização do corpo e da falta de companhia. No Brasil, “envelhecer é colecionar rótulos”. Já para as mulheres alemãs, também pesquisadas pela antropóloga, ter 50 anos não significa estar velha.

– O importante é que você esteja produzindo. Lá as mulheres preocupam-se com trabalho, casa, viagem – explica Mirian.

Para outra parte das brasileiras, o envelhecimento traz "vantagens" como uma maior liberdade, não ter que criar filhos e cuidar da casa. No entanto, as entrevistas aponto que a maior "riqueza" é possuir um marido. Segundo Mirian, “marido é um produto raro e altamente valorizado nessa faixa etária”. A estaa riqueza, a pesquisadora deu o nome de “capital marital”.

– Ter um marido, um casamento considerado sólido e satisfatório, é considerado um verdadeiro capital para as brasileiras pesquisadas.