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Rio de Janeiro, 2 de maio de 2024


País

O saldo do verão no Rio e em São Paulo: 140 mortes

Luísa Sandes e Yasmim Rosa - Do Portal

01/03/2010

José Araruna

O verão brasileiro de 2010, o mais quente dos últimos anos, não foi repleto apenas de muito sol, mas também de excesso de chuvas que inundaram as ruas do país. Os temporais foram responsáveis por ao menos 140 mortes tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo. Além das dezenas de vítimas, o saldo trágico do verão inclui desalojamento de famílias, água suja acumulada, doenças e um custo que soma milhões de reais.

Entre os locais mais atingidos pelas enchentes está Ilha Grande, em Angra dos Reis, litoral sul-fluminense, onde deslizamentos de terra na madrugada do dia 1º de janeiro mataram cerca de 50 pessoas. Entre uma das áreas mais afetadas do estado, está a Zona Oeste. Segundo o vice-coordenador do Núcleo Interdisciplinar do Meio Ambiente da PUC-Rio (Nima), Fernando Walcacer, além das encostas, a região é um dos locais mais suscetíveis a enchentes devido à fragilidade do solo.

– É preocupante quando o governo fala em ocupar o Recreio e o restante daquela área. As construções vão tornar o solo ainda mais impermeável e as enchentes vão ser frequentes. O que as autoridades devem fazer é um estudo da região e impedir que a Zona Oeste seja toda ocupada – afirmou o especialista.

Os custos para recuperar as áreas atingidas impressionam. Apenas em Angra dos Reis, R$ 214 milhões foram solicitados pela Prefeitura local e, de acordo com a Secretaria Estadual do Meio Ambiente, serão construídas três mil novas unidades habitacionais na cidade. Já na Baixada Fluminense, as obras somam R$ 550 milhões. O aporte dará continuidade ao Projeto Iguaçu, que prevê limpeza de rios, drenagens, construção de uma barragem para conter cheias no rio Dona Eugênia e de um dique entre a rodovia Washington Luiz e a via Dutra. As obras são consideradas fundamentais para evitar futuras catástrofes.

– Não é possível controlar o volume das chuvas, mas para que esses problemas urbanos que a cidade enfrenta todos os anos sejam solucionados, é preciso gerar novas políticas de uso do solo, conter o desmatamento, criar mais galerias, sanear a cidade e organizar um projeto de construções – declarou Walcacer.

A retirada de famílias que vivem às margens dos rios da Baixada é uma das principais precauções a serem tomadas pelo governo do Rio. Segundo dados divulgados pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente, até janeiro, 550 famílias já tinham se mudado e pelo menos mil ainda seriam retiradas e realocadas em unidades habitacionais construídas pelo Projeto Iguaçu em São João de Meriti, Belford Roxo e Mesquita.

José Araruna – Aqui no Rio, as enchentes e os deslizamentos são causados, principalmente, pelo crescimento urbano excessivo, sem planejamento e em áreas de risco, pelo desmatamento, pela erosão do solo, pela falta de galerias, pela falta de um sistema de saneamento básico, pela impermeabilidade do solo e uma série de outros motivos – disse o vice-coordenador do Nima.

Em São Paulo, o registro da quantidade de água em um único mês é o maior desde que as chuvas são medidas, há 77 anos. O volume já é equivalente a quase metade do esperado para o ano inteiro. Por causa do excesso de água, a companhia de saneamento básico do estado abriu dois reservatórios, o que não acorria há mais de dez anos. De 23 de dezembro até 9 de fevereiro, houve um acúmulo de 629 mm (cada milímetro equivale a um litro de água por metro quadrado). O dia mais chuvoso foi 21 de janeiro, quando a chuva somou 63,7 mm.

Segundo a professora do Departamento de Geografia Adriana Filgueira Leite, as chuvas intensas em São Paulo são efeito da Zona de Convergência do Atlântico Sul, uma faixa de nebulosidade que se estende do Atlântico à Amazônia.

– A ação do El Niño também intensifica as chuvas no estado. Essa massa quente impede a passagem da massa de ar fria para o Rio de Janeiro. É por isso que, desde o início do ano, apenas uma massa fria chegou ao Rio. As poucas chuvas que aconteceram no estado não foram causadas por massas frias – declarou.

Das 71 mortes em São Paulo, 44 foram causadas por deslizamento de terra, 18 por inundações e nove por raios. Além das 46 cidades em situação de emergência, outros três municípios estiveram em estado de calamidade pública. Ao todo, 156 cidades do estado foram afetadas pelas chuvas.

– Acredito que as chuvas vão continuar em São Paulo até março. Os dados mostram que esse é um fenômeno atípico que quando acontece apresenta uma intensidade anormal – observou Adriana.

As chuvas deixaram desalojadas, temporariamente, cerca de 22 mil pessoas, na casa de amigos ou familiares e quase 11 mil em abrigos públicos. Atualmente, mais de cinco mil pessoas permanecem amparadas pelo governo de São Paulo.

– Os cientistas se dividem quanto ao motivo da intensidade das chuvas neste verão. Uns dizem que é apenas o efeito do El Niño e, por isso, a quantidade de chuvas não é uma surpresa. Outros falam que isso já é um efeito da poluição e da ação do homem e que as chuvas são os primeiros sintomas do aquecimento global. Mas, independente dessas opiniões, a morte de 32 pessoas em São Paulo, no início do mês, por causa do calor não foi normal. Eu nunca tinha visto isso aqui no Brasil – comentou Walcacer.