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Rio de Janeiro, 27 de abril de 2024


País

Ações contra deslizamentos devem incluir sistema de alerta

Bruno Alfano, Clarissa Pains e Juliana Oliveto - Do Portal

05/01/2010

 José Araruna

A luta contra desastres como os que mataram 50 na região de Angra, na virada do ano, exige uma série de ações coordenadas – desde o mapeamento atualizado das áreas de risco e de obras para impedir deslizamentos de terra até sistemas de alerta à população. O prognóstico do geólogo Claudio Amaral, professor de Engenharia Civil da PUC-Rio, indica os primeiros passos de um manual de enfrentamento de desastres naturais. Desde o dia 2 de janeiro, Amaral pesquisa, na área de Angra, evidências, dados, informações, subsídios para o desenvolvimento deste plano de ações.

Cumpridas as prioridades, como a realocação dos moradores das áreas mais atingidas, o especialista prescreve dois tipos de obras para evitar tragégias do gênero: as ativas, para impedir ou reduzir a chance de deslizamento; e passivas, para evitar que, em caso de deslizamento, o a terra chegue até as casas. Segundo levantamento da Secretaria Estadual de Obras, a região concentra cerca de 70 áreas de risco.

– Há lugares onde o risco é tão grande que serão necessárias as duas obras, senão nem precisará chover muito para que haja um novo deslizamento. É preciso mapear e interditar as áreas de risco, informar e conscientizar a população – afirma o professor – Também é necessária a elaboração de um sistema de alerta pela prefeitura, que sinalize quando o nível de chuva ultrapassar o limite previsto, porque esses acidentes são recorrentes em Angra dos Reis.

Para Amaral, os governos estadual e municipais devem se alinhar em torno de iniciativas para aprimorar a estrutura da região; para que Angra e cidades vizinhas possam melhor enfrentar fenômenos da natureza, principalmente em áreas chuvosas.

– A maior lição a ser tirada com a tragédia de Angra é que os deslizamentos são eventos naturais, são previsíveis, esperados. A chuva apenas deflagra o processo, o que não pode deixar consequências sejam desastrosas. No Japão e nos Estados Unidos, por exemplo, terremotos são recorrentes, mas os dois países dão show em enfrentamento de desastres. Temos muito o que aprender com eles – observa.

Há, por enquanto, 50 mortes confirmadas na região. De acordo com especialistas, o número só não é maior devido ao trabalho da Defesa Civil do município. Amaral sonha que a rapidez no socorro seja acompanhada pela aplicação de antítodos contra desastres do tipo:

– Gostaria muito que todas as obras necessárias fossem realizadas ao longo deste ano, mas, provavelmente, não serão. Nossa cultura de tomada de decisões e liberação de projetos ainda é muito lenta, atrasada.

Solo úmido e pressão da água da chuva agravam riscos

 José Araruna

O excesso de chuvas é a causa natural dos deslizamentos. A água se infiltra e deixa a terra encharcada, até atingir a rocha. Então, a camada de terra se desprende, perde sustentação e desce, levando tudo o que encontra pela frente.

Próximo ao da Amazônia, o índice de chuvas em Angra é considerado alto – o que copntribui para a identificação de aproximadamente 70 áreas com risco de deslizamentos ou alagamentos.

O também professor da PUC-Rio Eurípedes Vargas, especialista em geotecnia e doutor em Engenharia Civil, explica que a pressão da água no solo e a inclinação da superfície são aspectos fundamentais para entender o que aconteceu na madrugada do dia 1º:

– Quanto mais chove, mais aumenta a pressão da água. O efeito é tanto pior quanto mais úmido o solo está e quanto mais inclinada é a encosta.

Os cuidados preventivos, acrescenta Vargas, incluem a manutenção regular dos tubos de água:

– Com o tempo, a tubulação fica gasta e a água vaza, deixando o solo úmido. Quando vem a chuva, o solo não aguenta e desliza. Foi o que aconteceu em 2007 no túnel Rebouças, por exemplo.

Claudio Amaral ressalva: apesar de este tipo de cuidado urbano seja importante, não é suficiente para diminuir o impacto de deslizamentos como os de Angra. Segundo ele, embora não se possa evitar o acúmulo de água no solo, é possível fazê-la escoar mais rapidamente por meio de drenagens. Esta solução deve ser "muito bem pensada, porque se a terra deslizar por cima das calhas e represar a água dentro do solo, as conseqüências poderão ser piores", observa Vargas.

Em áreas mais expostas, serão colocadas mantas plásticas, como solução imediata contra o acúmulo de água. Mas, de acordo com Amaral, só com obras estruturais as consequências de novos deslizamentos poderão ser amenizadas.

José Araruna, também doutor em Engenharia Civil e professor da PUC-Rio, reforça a necessidade de "rigoroso mapeamento" da região e destaca a importância do esforço conjunto de profissionais:

– Depois da tragédia, fica mais fácil observar a área onde não há mata. Mas é uma região que ainda não se conhece bem. Não se sabe exatamente as áreas que oferecem mais riscos. Agora, é importante a ajuda de engenheiros para planejar com cuidado a retirada dos blocos de pedras. Cada um deles deve pesar cerca de 200 kg.

Em 2002, 40 mortos e 100 feridos

Em 2002, Angra viveu tragédia semelhante. Contou 40 mortos, 100 feridos e um número recorde de 670 casas interditadas. Cerca de 70 mil moravam em casas construídas nas encostas de morros. A ocupação desordenada foi considerada a principal causa dos deslizamentos que atingiram, principalmente, bairros erguidos sobre brejos, manguezais e áreas que absorviam a água da chuva.

 José Araruna

– Na recente calamidade, os deslizamentos concentraram-se no centro do município. A ocupação desordenada das encostas ainda é um problema, porém a tragédia na Ilha Grande foi um fenômeno natural, muito mais do que intervenção humana – compara Vargas – As pedras do rio Rainha, que corta a PUC-Rio, por exemplo, foram parar ali devido a deslizamentos, eventos naturais, recorrentes principalmente em nosso estado. Infelizmente, no litoral fluminense, as proporções foram enormes e não estávamos preparados.

Chuvas também afetam Baixada e Pavuna, e ativam solidariedade

As calamidades deflagradas pelas chuvas desta época do ano – que se intensificam devido ao fenômeno El Niño, provocado pelo aquecimento das águas do Oceano Pacífico – transtornaram outras partes do Rio e do Brasil. A Baixada Fluminense e do bairro da Pavuna, na Zona Norte da capital, por exemplo, sofrem com alagamentos.

Segundo a moradora de Duque de Caxias Roseana Brum, que trabalha no bandejão da PUC-Rio, a chuva do dia 31 de dezembro nem foi tão forte para justificar o alagamento da região. Ela observa, no entanto, que os valões continuam cheios mesmo quando as chuvas dão uma trégua.

– A partir das três da madrugada, a água começou a subir com muita força. Foi rápido e não deu para salvar muita coisa. Minha sogra perdeu geladeira, sofá, cama, até o carro – conta – Até hoje não apareceu ninguém do poder público para limpar. As ruas estão cheias de barro e galhos. São os moradores que estão limpando.

Aos 26, Leonardo da Rocha, funcionário também da PUC-Rio, diz que já testemunhou incontáveis alagamentos na Pavuna. Segundo ele, os bueiros entupidos são a principal causa do problema sistemático:

– Quando chove, acaba alagando, a água chega ao joelho. Apenas um bueiro funciona direito. Nos outros, a água volta. Somos nós, moradores, que temos que desentupir.

As chuvas recentem tiraram de Leonardo uma estante e um armário. O saldo poderia ter sido pior se ele morasse no bairro próximo de Barros Filho: "Foi pior: houve deslizamento de barranco, de árvore". A proximidade com alagamentos não lhe rouba, no entanto, o ânimo da viagem de férias programada para Ilha Grande. "Fico um pouco receoso, mas não vou deixar de ir", assegura.

Moradora de Cascadura, também na Zona Norte, a ascensorista Edna Cristina acompanha o drama dos vizinhos cujas casas foram interditadas devido ao risco de deslizamento. Estão abrigados numa igreja. Ilustram o drama de aproximadamente 200 pessoas da área.

– Nunca havia acontecido deslizamentos na região. A prefeitura prometeu às vítimas o Aluguel Social (adiantamento referente a três meses de aluguel), mas esta não é a solução – afirma – O moradores estão fazendo mutirão para cozinhar e ajudar as vítimas.

Solidariedade chega ao Twitter

Instrumento recorrente para compensar os lapsos do poder público, a solidariedade chega ao Twitter. O site de relacionamentos se insere nas campanhas de doações a desabrigados em Angra.

Em sua página no microblog, a cantora Preta Gil pediu aos fãs que levem 1kg de alimento não perecível ou roupas para serem doados aos desabrigados em seu próximo show, no dia 7 de janeiro, na boate The Week, no Rio. Já Luciano Huck contou que consultaria o prefeito de Angra dos Reis, Tuca Jordão, sobre como seria possível ajudar os desabrigados. E afirmou que usaria o Twitter para divulgar a campanha.

Governo estadual abre linha de crédito para vítimas

O governo do estado do Rio de Janeiro anunciou no domingo passado, dia 3, que vai abrir uma linha de crédito para os moradores e comerciantes de Angra dos Reis atingidos pela tragédia provocada pelas chuvas. O financiamento de até R$ 5 mil para pessoas físicas e até R$ 50 mil para pessoas jurídicas será liberado pela Invest Rio, agência do estado. Segundo o governo, serão instalados, ainda nesta semana, pontos para o cadastro de interessados em Ilha Grande e no centro de Angra.

Moradores e comerciantes vítimas das recentes chuvas na Baixada Fluminense também contarão com linhas de crédito por meio da Invest Rio. Terão, de acordo com governador Sérgio Cabral, modelo semelhante ao programa de socorro anunciado para Angra dos Reis. Os pontos de cadastro serão determinados até a próxima semana.

Como ajudar

- Prefeitura de Angra dos Reis

As doações de roupas, colchões e alimentos são entregues nos quatro abrigos que estão funcionando em escolas municipais. Um deles, no centro de Angra, é o Colégio Estadual Dr. Artur Vargas (Ceav), na Rua Coronel Carvalho 230. Os interessados em fazer doações podem ligar para os telefones (0xx24) 3377-6046, 3377-7480, 3365-4588 e 3377-7869.

A prefeitura já arrecadou 11,5 toneladas de alimentos, mais de 35 mil peças de roupas de cama e calçados e 28 mil litros de água mineral. Ainda abriu uma conta para doações de qualquer valor, no Banco do Brasil, agência 0460-x, conta corrente 74500-6, em nome de prefeitura de Angra - calamidade pública.

Metade das seis toneladas de produtos arrecadados já foi entregue aos moradores do município. Entre os itens de maior necessidade, estão água, café, vela e fósforos, já que há regiões sem energia elétrica.

- Paróquia São Sebastião, de Angra dos Reis

Doações devem ser depositadas na conta 0036702-8, agência 0459-6, do Banco Bradesco, em nome do padre José Josias Santos Freire.

- Defesa Civil do Rio de Janeiro

Os donativos devem ser entregues na sede do órgão, na Avenida Osvaldo Aranha 156, Praça da Bandeira.

- UERJ

Segundo a secretaria de Comunicação do Estado, a Universidade do Estado do Rio de Janeiro recebe, até o dia 15 de janeiro, donativos que serão enviados à população de Angra dos Reis afetada pelos deslizamentos ocorridos no município.

Alimentos não perecíveis, água potável e roupas podem ser deixados no hall dos elevadores, no andar térreo do Pavilhão Reitor João Lyra Filho, no campus Maracanã.

Quem desejar outras informações deve ligar para o telefone (21) 2334-0638.

- Projeto verão

O Posto 8 (antigo Mistura Fina), na Praia de Ipanema, seguirá a ideia de Preta Gil e dará descontos nos ingressos das apresentações para quem levar 1 Kg de alimento não perecível. Os encontros acontecerão todas as terças, de 5 de janeiro a 23 de fevereiro, na Av. Rainha Elizabeth 769. Outras informações no site www.tercaemmovimento.com.br

- Ceasa

A Associação de Produtores e Usuários da Ceasa pretende angariar, além de legumes, outros alimentos, água, colchões, móveis e itens variados. Informações podem ser obtidas pelo telefone (21) 2333-8274.

- LBV (Legião da Boa Vontade)

As doações podem ser feitas no Centro Educacional, Cultural e Comunitário José de Paiva Netto, na Av. Dom Hélder Câmara 3.059, em Del Castilho, no Rio. Informações pelo telefone (21) 2501-024.