A vida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva dá um belo roteiro de cinema, não há dúvidas. Muitos acreditam, no entanto, que esta não tenha sido a única motivação do diretor Fábio Barreto. A exibição programada para o ano eleitoral (entra em circuto no dia 1º de janeiro) e os R$ 12 milhões doados despertam suposições panfletárias. Em meio à polêmica, especialistas da PUC-Rio fazem uma reflexão sobre as implicações acumuladas pelo longa antes mesmo da estreia nacional. Mostram que a iniciativa exige uma interpretação menos simplista do que sugere a etiqueta de propaganda política.
O professor de cinema Ney Costa, reforça o grupo dos que avaliam Lula, o filho do Brasil como peça de campanha eleitoral:
– O filme do Lula será utilizado como instrumento de propaganda, o que não é correto, pois as campanhas, de acordo com a lei, só devem começar a serem veiculadas em julho, três meses antes das eleições. Além disso, o culto à personalidade é uma operação cinematográfica bastante perigosa.
Ele concorda que a vida do presidente rende um bom roteiro, mas critica o que considera uma abordagem mítica de Lula e a época para a qual o filme foi planejado:
– A trajetória do presidente é fascinante. Ele expressa a mobilidade social do povo brasileiro. Mas, o filme não vai por este viés. Os produtores objetivam criar uma fusão da imagem de um líder político com a nação, ou seja, eles apelam para o sentimentalismo. Se o projeto de mostrar a comovente história de vida do presidente, fosse concluído depois das eleições em 2010, ele teria outra conotação. No momento, a intenção de veicular o filme tem caráter político.
Críticos como Ney argumentam que, ao realizar o filme Lula, o filho do Brasil, inspirado na biografia oficial do presidente, escrita pela jornalista Denise Paraná, Barreto deixou de fora passagens que pudessem causar constrangimento ao protagonista da história. O cientista político Ricardo Ismael, professor do Departamento de Sociologia da PUC-Rio, acredita que o filme poderá provocar um forte impacto no período pré-eleitoral. Pois, na opinião de Ismael, o longa é um culto à personalidade:
– O filme promove a consolidação de uma imagem favorável do presidente. E é inegável que estão tentando influenciar não apenas a campanha para a presidência, como também as eleições para deputados, governadores, senadores etc. A escolha da data do lançamento é questionável, pois coincide com um processo eleitoral em andamento Essa “coincidência” acaba beneficiando pessoas aliadas ao PT. O filme teria que ter estreado um ano e meio antes das eleições ou seis meses depois.
Contudo, de acordo com o cientista político, o longa-metragem não terá forte influência na campanha de Dilma Rouseff, pré-canditada do governo.
– Provavelmente os ganhos de Dilma serão pequenos. O maior beneficiado será o próprio Lula. Só 20% da população correspondem à parcela que mantém um apoio incondicional ao presidente. Para conquistar a confiança do eleitorado, Dilma terá que fazer e se esforçar mais. Talvez os únicos votos que Lula consiga transferir para a sua cadidata sejam os chamados “votos de gratidão” ou “votos de reconhecimento”, que são os votos dados à Dilma em retribuição aos feitos de seu mandato.
Ismael critica esse tipo de voto:
– As pessoas devem votar de acordo com suas convicções, não de acordo com o que agradaria ao candidato anterior ou ao partido dele.
O professor de política da PUC-Rio Vladimyr Lombardo discorda, em parte. Para ele, não há evidências de que o filme seja uma jogada política.
– Não acredito que tenha sido um projeto encomendado. A explicação mais plausível é que o cineasta tenha se aproveitado do momento pré-eleitoral para que seu filme tivesse uma maior repercussão.
Mas, assim como Ricardo Ismael, Vladimyr não acredita que o filme tenha uma influência significativa nas eleições para a presidência no próximo ano.
– O fato de as pessoas gostarem e darem apoio a Lula não garante que ele consiga transferir votos suficientes para eleger a sua candidata, Dilma Rouseff.
O professor apoia a iniciativa capaz de abrir espaço para outros cineastas realizarem filmes de figuras que foram relevantes para o Brasil.
– Assim como fizeram com Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek, é importante deixar registrado para futuras gerações quem foram os personagens que fizeram história no nosso país.
Parte da polêmica gerada remete ao patrocínio. Os produtores foram orientados a não aceitar dinheiro público nem incentivos fiscais. Conseguiram patrocínios de 18 empresas, a maioria com algum tipo de ligação ao governo. A soma totalizou R$ 12 milhões.
Outra cifra importante refere-se às 500 cópias que serão distribuídas em circuito nacional no próximo mês – um recorde na história do cinema brasileiro. A primeira exibição pública do longa-metragem, que abriu o Festival de Cinema de Brasília, foi no dia 17 de novembro. A estreia oficial será em janeiro.
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