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Rio de Janeiro, 27 de abril de 2024


Mundo

A primeira geração da Alemanha reunificada

Ana Terra Athayde - Da sala de aula

10/11/2009

 GHDI

Quando Frederik Lux percorre a rua Frankfurter Alle à noite, os edifícios antigos de Berlim Oriental não escondem o passado: “Sinto como se estivesse na República Democrática Alemã”. Aos 25 anos, o estudante faz parte do grupo de jovens que vivenciou pouco a divisão da Alemanha mas enfrenta as consequências diariamente. Em novembro de 1989, Frederik era muito novo para entender o significado da queda do Muro de Berlim. Agora, ele e milhares de outros jovens ajudam a reconstruir o país. Enfrentam preconceitos e fortes disparidades econômicas entre o leste e o oeste.

Em 1990, a reunificação do país, antes dividido em República Democrática Alemã (RDA, controlada pelos socialistas) e República Federal da Alemanha (RFA), não foi capaz de impulsionar a formação de uma identidade comum entre os jovens. Em 2007, a revista Die Spiegel entrevistou 500 pessoas de 14 a 24 anos para traçar um perfil da sociedade alemã. Segundo a pesquisa, 67% dos jovens do leste e do oeste do país se consideram diferentes uns dos outros. Para Frederik, que mora num bairro no lado ocidental de Berlim, até o corte de cabelo de pessoas de Alemanha Oriental, antiga RDA, acaba virando motivo de preconceito.

– Muita gente do oeste acha que algumas pessoas do leste têm cortes de cabelo engraçados. E outros acham que o dinheiro é a coisa mais importante para as pessoas da Alemanha Ocidental. Dizem que na RDA a solidariedade foi maior. Acho que ainda é assim no lado oriental - observa Frederik.

As dificuldades econômicas defasiam os jovens que moram no leste da Alemanha. “Várias pessoas deixam a região para buscar melhores empregos no outro lado”, explica Max Metzner, morador de Magdeburg. O artista, de 23 anos, ressalva que os anos de regime socialista geraram consequências para todos: “Muito dinheiro tem sido gasto pelo lado ocidental para reconstruir o leste da Alemanha, que estava totalmente destruído”, comenta.

Segundo Max, é comum os jovens do oeste da Alemanha tratarem os do leste com arrogância. Embora sejam menores do que há 20 anos, as diferenças entre um lado e outro resistem:

– A queda do Muro foi algo concreto, mas lidamos com questões internalizadas. A mudança aconteceu de uma hora para a outra, mas não resolveu o problema de existirem grupos diferentes na sociedade. De certa forma, um muro continua existindo – explica Eva Jonathan, professora de Psicologia Social da PUC-Rio.

E o muro ainda vive também em fragmentos espalhados pela capital. Em várias partes de  Berlim, encontram-se partes da barreira de pé ou marcações no asfalto indicando por onde passava. Em vez de encarar os resquícios tangíveis do muro como uma incômoda lembrança, a nova geração valoriza o seu simbolismo. “A cidade está tenta preservá-lo, porque ele faz parte da nossa história”, argumenta Daniela Fink, de 24 anos.

Apesar de reconhecer que há preconceitos entre os moradores dos dois lados da Alemanha, Daniela garante que os jovens são mais abertos à unificação. Ela diz que mora no lado ocidental de Berlim "apenas por praticidade", pois fica mais próximo à faculdade. “Para sair à noite, não há melhor lugar que Berlim Oriental”, comenta. A arquitetura da capital não a deixa esquecer o passado:

– É possível identificar que parte pertencia à RFA e qual era da RDA: existem mais plattenbauten (grandes edifícios de concreto pré-fabricados) no lado oriental e os bairros de Berlim Ocidental são normalmente mais ricos.

Frederik não arrisca prever se as diferenças entre os lados da cidade e do país vão sumir, mas acredita que a geração nova será "mais integrada". Assim como Daniela, ele considera o muro uma parte importante da história da capital alemã cuja memória deve ser preservada: 

– É difícil imaginar que, dentro de Berlim, pessoas foram assassinadas tentando cruzar a fronteira. Hoje acho muito interessante morar tão perto da antiga barreira entre dois mundos.

Se os tempos fossem outros e a cidade ainda estivesse partida, os jovens indicam a preferência pelo lado ocidental. Para Daniela, a falta de liberdade de escolha imposta pelo regime socialista no leste alemão é o principal fator que a faria escolher o outro lado. Já Frederik argumenta que o desenvolvimento econômico no leste foi pior, e lembra as privações pelas quais os moradores da RDA passavam: “Eu teria saudade de bananas e café”.

* Matéria produzida em sala de aula para a disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso, ministrada pelo professor Arthur Dapieve.

 

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- Desafios para manter aceso o sonho socialista (Luísa Côrtes Fonseca)