Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 7 de maio de 2024


País

As memórias e os novos passos do vilão da política brasileira

Marcelo Brüzzi - Da sala de aula

08/09/2009

Agência Brasil

Entre ascensões e quedas, Fernando Collor de Melo (PTB-AL) sempre esteve com os holofotes em sua direção. Depois de deixar a Presidência da República diante de acusações de esquemas de corrupção, Collor conquistou o direito de voltar à vida pública, foi eleito senador e escolhido pelos próprios parlamentares para ocupar um cargo estratégico no Senado. Aos 59 anos, é presidente da Comissão de Infraestrutura da Casa, responsável pelos principais investimentos do país em áreas como transportes, comunicações e aeroportos. No entanto, cientistas políticos não acreditam que o atual senador possa voltar a ocupar a cadeira de presidente do Brasil.

Segundo o professor do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio Ricardo Ismael, Collor hoje é uma “figura apagada, sem grande destaque”. “O impeachment e os episódios de corrupção selaram a trajetória política nacional do Collor. Desde que ele voltou, nunca mais conseguiu, dentro do Congresso Nacional e dentro de onde está instalada a mídia nacional – Brasília, Rio e São Paulo –, um espaço que desse a ele condição de ser presidente da República. Ele consegue se recuperar apenas em seu estado”, avalia Ismael.

No entanto, de acordo com o cientista político Paulo D’Ávila (PUC-Rio), o ex-presidente está dentro do jogo de articulações políticas da Casa. Tanto que foi escolhido para representar o seu partido (PTB) na CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Petrobras, que tem como objetivo investigar fraudes em licitações e denúncias de desvio de royalties de petróleo, entre outras supostas irregularidades cometidas pela estatal. Segundo D’Ávila, Collor não tem interesse em voltar à Presidência da República: “Daqui para frente, ele deve concorrer apenas para cargos no Legislativo”, aposta.

A reconstrução da imagem de Collor começou em 2006, quando se candidatou a uma vaga no Senado pelo Estado de Alagoas. Em sua campanha, o ex-presidente tentou convencer o eleitorado de que foi injustiçado em 1992, quando sofreu o processo de impeachment. Seu marketing político deu certo. Com mais de 500 mil votos, derrotou o ex-governador de Alagoas Ronaldo Lessa (PDT) e assumiu a cadeira que pertencia a Heloísa Helena. Durante as comemorações, o ex-presidente disse que retornaria à Brasília com a “consciência tranqüila e a alma lavada”.


Ascensão

“O Collor conseguiu uma proeza, que foi de sair de um estado pequeno, onde ele já era bem sucedido, e ganhar visibilidade nacional. São casos raros na política brasileira”, afirma Ricardo Ismael. Depois de 29 anos sem eleição direta para presidente, os brasileiros foram às urnas em 1989. No total, 22 candidatos disputaram o principal cargo do Executivo Federal, entre eles, figuras como Leonel Brizola (PDT), Ulysses Guimarães (PMDB), Enéas Carneiro (Prona) e Fernando Gabeira (PV). Com 20,6 milhões de votos, Collor venceu o primeiro turno das eleições, seguido de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que somou 11,6 milhões de votos.

Mesmo sendo candidato de um partido sem expressão nacional (PRN), Collor, então governador de Alagoas, virou fenômeno eleitoral com marketing político milionário e grande espaço na mídia. “A TV Globo tinha um candidato e ele se chamava Fernando Collor de Melo”, destaca a professora do Departamento de História da PUC-Rio Graça Salgado. “A aparição de Collor em jornais de grande prestígio nacional é que começou a criar a imagem de ‘caçador de marajás’, a imagem de alguém que quer combater as elites, renovando a política brasileira” - completa o cientista político Ricardo Ismael.

Na batalha final da corrida presidencial de 1989, estavam dois candidatos que surpreenderam muitos analistas políticos na época. Fernando Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva não eram apontados como os favoritos para a disputa. O clima democrático tomou conta do país, que ainda se recuperava de uma traumática e violenta ditadura militar (1964-1985). Ao mesmo tempo, acusações e ofensas eram exploradas pelos candidatos na propaganda eleitoral na televisão. Em 17 de dezembro, mais de 70 milhões de eleitores foram às urnas. Com mais de 35 milhões de votos (42,75%), o alagoano Fernando Collor de Melo derrotou o pernambucano Luiz Inácio Lula da Silva, que conseguiu o apoio de 31 milhões de brasileiros (37,86%).


Queda

Collor assumiu a presidência da República em janeiro de 1990. Dois meses depois, sua política econômica, comandada pela ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Melo, pegou milhões de brasileiros de surpresa. Para tentar estabilizar a inflação, que chegava a 84% ao mês no governo Sarney, Collor determinou o bloqueio de contas da poupança que tinham mais de 50 mil cruzados novos. A medida não surtiu efeito, o país entrou em recessão, o desemprego aumentou e o governo federal entrou em crise.

Em 1992, denúncias de corrupção, tráfico de influência, distribuição de cargos públicos em troca de vantagens e cobrança de propina, entre outras supostas irregularidades, deram origem à Comissão Parlamentar de Inquérito. Em seguida, grande parte da imprensa e do movimento estudantil se juntou aos parlamentares para tentar derrubar o presidente. Estava aberto o processo de impeachment, que resultou na cassação dos direitos políticos de Collor por oito anos.

Segundo o professor do Departamento de Sociologia e Política da PUC-Rio Eduardo Raposo, as denúncias de corrupção nos governos de Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso e Lula “não tiveram um final infeliz para os presidentes por causa da boa situação econômica do país.” “O governo Collor não foi bem sucedido no plano de estabilização da moeda. Então, essa questão fundamental balançou o alicerce da legitimidade do governo dele”, afirma.

Vinte anos depois da disputa de 1989, Collor é aliado de seu antigo adversário. Recentemente,  afirmou que faz parte da base de sustentação do governo Lula e tem simpatia pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, provável candidata do PT na corrida presidencial de 2010. O senador disse que já pediu desculpas ao atual presidente pelos “excessos” cometidos na campanha eleitoral de 1989. Dono de um cargo estratégico no Senado, Collor ainda tenta reconstruir sua imagem junto aos eleitores que se decepcionaram com sua política. Em março, o político alagoano admitiu que o bloqueio das poupanças foi um equívoco. “Hoje, eu não faria isso. Naquela época, na ânsia de fazer com que as coisas se resolvessem de forma rápida, cometi esse erro”, disse.

O cientista político Ricardo Ismael acredita que Collor ainda explore características que o ajudaram a construir uma imagem de político capaz de enfrentar marajás e problemas econômicos. “Tem certas coisas que não mudam nele, como a expressão teatral, personalista. Com o passar do tempo, o eleitor brasileiro ficou mais maduro. Ele não vai mais entrar tão fácil numa propaganda de marketing que diz que fulano é forte, é corajoso. Ele vai olhar mais, vai ter mais confiança para poder dar o seu voto. O Collor faz parte de um momento onde a força do marketing político estava sendo descoberta”, conclui.

* Matéria produzida em sala de aula para a disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso, ministrada pela professoa Carla Rodrigues.