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Rio de Janeiro, 7 de maio de 2024


País

O aumento da pobreza

Catharina Wrede - Da sala de aula

02/09/2009

Antonio Cruz/ABr

Eleito com mais de 35 milhões de votos na primeira eleição direta para presidência da República, em 1989, Fernando Collor de Mello anunciou seu plano econômico no dia seguinte à posse: retorno do cruzeiro como moeda, o confisco dos depósitos bancários superiores a Cr$ 50 mil e a alteração no cálculo da correção monetária. Medidas com impacto direto nas classes A e B. Contudo, as consequências da sua política econômica, conhecida como Plano Collor, estenderam-se também às classes mais baixas, fazendo com que a renda do brasileiro diminuísse.

Segundo o economista e pesquisador André Urani, de 58 anos, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (IETS), o governo de Fernando Collor foi responsável por um dado curioso: ele diminuiu o índice de desigualdade social. O ex-presidente, de acordo com Urani, conseguiu reduzir a diferença entre ricos e pobres em números significativos para o período.

Em seu artigo Mercado de Trabalho e Distribuição de Renda Durante o Governo Collor, publicado no livro do IPEA intitulado Perspectivas da Economia Brasileira, o economista demonstra que a queda mais forte da desigualdade se deu no Rio de Janeiro, onde este índice passou de 0,60, em março de 1990, para 0,54, em média, no trimestre julho/setembro de 1992. Segundo índices da pesquisa, a mais fraca foi em São Paulo, onde passou, neste mesmo período, de 0,53 para 0,52. Entretanto, Urani alerta para um fato importante:

- O grande problema é que Collor conseguiu esta proeza de uma maneira torta: ele não deu às classes C, D e E oportunidade para gerar uma renda maior e se aproximar das classes A e B. Pelo contrário, ele tirou dinheiro de ricos e pobres, sendo que a fatia maior foi retirada das classes A e B, o que fez com que a desigualdade social diminuísse.

No artigo, o economista resume o fenômeno da seguinte forma: “trata-se, em suma, de uma situação oposta à do ‘milagre econômico’. A participação na renda dos mais pobres aumentou, mas o bolo encolheu.”

Em 1990, a empregada doméstica Cremilda Souza, 45 anos, não era empregada doméstica. Trabalhava ajudando o marido, o espanhol Paquito Fernandez, a montar seu próprio negócio: uma empresa de “sacolão”, que venderia legumes e verduras no atacado e no varejo. Com o Governo Collor, o negócio não sobreviveu e ela teve que ajudar na renda familiar, trabalhando em uma casa na Barra da Tijuca.

Até hoje, Cremilda não sabe ao certo o que aconteceu e diz não entender “desse negócio de política”. Quando perguntada sobre o que acha da época em que Collor era presidente, é sincera:

- Eu não tenho opinião, não, só sei que foi uma fase muito triste da minha vida. Não sei se teve a ver com o governo ou não, só sei que a gente perdeu o pouco de dinheiro que tinha, assim, do nada. Mas a vida muda muito e a gente tem que se adaptar, sabe?

A história de Cremilda, mesmo que ela não tenha consciência, é, para Urani, um grande exemplo do que aconteceu com uma parcela da sociedade. Segundo ele, uma das consequências da política econômica do Governo Collor foi a falência de micro e pequenas empresas e a diminuição de empregos com carteira assinada.

- O sub-emprego aumentou muito, assim como a terceirização dos serviços. É possível que parte do fenômeno da redução da desigualdade de renda seja explicado pela redução da participação dos trabalhadores mais qualificados - analisa.

O pedreiro Tenório Firmino, 58 anos, tinha um sonho em 1989: construir a casa própria. Ele conseguiu juntar dinheiro suficiente para concretizar o plano, resultado de vinte anos de trabalho, mas a posse de Fernando Collor obrigou Tenório a adiar o projeto.

- Ele chegou ao governo, mudou a moeda e quebrou todo mundo. Tudo ficou caro, a quantia que eu tinha não dava para mais nada -  conta, sem esconder a revolta.

Até hoje, o pedreiro vive de aluguel em uma casa em Duque de Caxias, interior do estado do Rio. O impacto da era Collor nas classes C, D e E faz com que Urani reflita sobre o desenrolar da história:

- Collor cometeu um grande erro: desagradou a todos. Talvez, se ele tivesse tirado apenas o dinheiro dos ricos e, a la Robbin Hood, distribuído para o povo, não tivesse sofrido o impeachment - arrisca.

* Matéria produzida em sala de aula para a disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso, ministrada pela professora Carla Rodrigues.