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Rio de Janeiro, 30 de novembro de 2024


Cidade

A falta que faz a movimentação das aulas

Bruna Smith e Lucas Landau - Do Portal

15/07/2009

 Lucas Landau

O clichê das férias como sinônimo de descontração é revisto pela rotina de comerciantes da Gávea e funcionários da universidade. Para eles, as férias (dos outros) representam dias menos empolgantes. Os repórteres Bruna Smith e Lucas Landau mostram a falta que faz o vaivém de estudantes. No bolso e na alma.  

 

Lucas Landau

Todo dia ele faz tudo sempre igual. Levanta às quatro da manhã em Bangu, se arruma em meia hora e às 6h50 chega à PUC-Rio. José Carlos de Oliveira, o ascensorista Zé, comanda o elevador do prédio Kennedy até 13h. As seis horas que passa na sua toca, 170 centímetros de comprimento por 150 largura, correm de acordo com o entra-e-sai, o movimento constante, as conversas de bolso. Zé gosta de fila. À porta do elevador, a procissão significa mais assunto. Nas férias, a fila some e sua rotina aproxima-se de uma função quase solitária:

 

- Sinto falta das pessoas, de conversar, e o tempo passa mais devagar.

 

Julia Danon, 19 anos, também sente o peso das férias alheias. Embora ordem e tranquilidade sejam uma obrigação do dia a dia de atendente da biblioteca, Julia identifica um "silêncio exagerado" nesta época. Na semana de provas, a anterior às férias, a biblioteca fica lotada, o barulho incomoda e as bibliotecárias precisam pedir silêncio, lembra ela. Um contraste em relação ao recesso: "Isso aumenta o sentimento de solidão", observa. Entre o agito das provas e a calmaria das férias, Julia fica com o primeiro.

 

 Lucas Landau O bandejão também acusa o golpe. A caixa Rosemari Osório, 38 anos, diz que adora movimento, inclusive “para garantir o salário”. Com a carga horária menor nas férias, ela sente falta de um molho especial na ciranda de pratos e talheres: o papo (rápido) com alunos e funcionários, uma "troca positiva" que faz a "hora passar rápido".

 

- Na semana passada, um professor veio me contar que a filha tinha passado em um concurso. Fiquei muito feliz de ele ter vindo compartilhar comigo, me senti uma amiga da família. Durante as aulas, isso é mais comum.

  

Professora do Departamento de Psicologia da PUC-Rio, Maria Inês Bittencourt explica que é natural o conflito entre o tempo de trabalho e o ócio das férias. Um conflito que "dá a sensação de lazer no lugar errado":

 

- Se fosse lazer, eles optariam por ficar em casa, mas como é trabalho acontece uma relação paradoxal entre gostar de não fazer nada e não gostar do ócio.

 

 

 

Bruna Smith

  Lucas Landau  Cerca de 16 mil estudantes da rede particular de ensino circulam pela Gávea todos os dias durante o período letivo. Para a maioria deles, férias é sinônimo de descanso e diversão. Já para boa parte do comércio, principalmente em torno da PUC-Rio, adquire outro sentido: queda no lucro. Embora alguns comerciantes prevejam queda de até 80% da circulação de clientes neste período, o presidente da Associação de Comércio da Gávea, Nilson Samÿn, acredita que o movimento comercial do bairro se mantenha estável e até aumente nos bares do Baixo Gávea e nos cinemas e teatros do shopping. 

 

- A Gávea oferece diversidade de lazer. Temos bares, cinema, teatro. Não acredito que as férias prejudiquem o comércio daqui.

 

O otimismo de Samÿn não coincide com o prognóstico de comerciantes da área. Vicente Falcão, um dos sócios do bar e restaurante Seu Pires, um dos mais frequentados por estudantes da PUC, prevê queda de 40% do movimento nas férias.

 

- Sem os alunos da universidade por perto, fica difícil conseguirmos clientes. O burburinho em torno do local, principalmente às quintas-feiras, o dia mais movimentado, afasta moradores do bairro - conta Falcão.

 

Para atrair os moradores, os sócios do Seu Pires reformaram a cozinha e pretendem introduzir rodízio de pizza nos fins de semana. "Queremos ser um pé-sujo de unhas feitas", diz Falcão.

 

Para adaptar-se ao movimento menor, o restaurante Couve Flor, no campus da PUC-Rio, restringiu o horário de funcionamento para três horas, do meio-dia às 15h, até a volta das aulas, em agosto. O gerente Apolônio Neto acredita que o movimento caia pela metade nas férias.

 

- É muito diferente. No período letivo, levamos uma surra para atender à demanda do dia a dia - compara Neto.

 

A jornaleira Heloísa Soares, da Banca Cardeal Leme, também no campus da PUC, prevê prejuízo no fim do mês. Para ajustar à queda brusca de clientes, o horário de fechamento da banca foi antecipado das 22h para as 19.

 

- O rendimento de uma banca de jornal já é relativamente baixo, por isso precisamos vender muito para obter lucro. Nas férias, temos prejuízo, porque os gastos com luz e salário de funcionários continuam.

 

Em frente ao portão da universidade, na “passarela Gourmet”, assim chamada pelos alunos, os donos das barraquinhas e quiosques de salgados vivem dias de apreensão. Marlo do Nascimento, funcionário do Quiosque da Eliane, admite que, mesmo com a tradicional receita de  bom atendimento e comida de qualidade, "é impossível manter o volume de clientes":

 

- O movimento do quiosque diminui muito, acho que uns 80%. - estima. 

 

Taxistas também sonham com a volta das aulas. Gilvan da Silva, filiado à cooperativa Unigávea há 8 anos, diz que "a situação vem piorando ano a ano".

 

- Fazemos poucas corridas nas férias. Só que, de uns cinco anos para cá, a coisa está pior, porque a concorrência aumentou.

 

Já os comerciantes do Shopping da Gávea enxergam nas férias perspectiva de aumento dos lucros. Segundo a gerente de marketing Renata Alves, o cinema e os teatros levantam o movimento nas férias.

 

- Talvez a única mudança seja no setor gastronômico durante a semana. O movimento nos restaurantes cai porque muitos estudantes almoçam no shopping. Mas isso é compensado nos fins de semana.