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Rio de Janeiro, 25 de abril de 2024


País

Fim da exigência do diploma de jornalismo gera polêmica

Bruna Santamarina, Carolina Barbosa, Suzane Lima e Tatiana Carvalho - Do Portal

18/06/2009

 Reprodução

O diploma de jornalismo deixa de ser obrigatório para o exercício da profissão, determinou o Supremo Tribunal Federal nesta quarta-feira, 17 de junho. Por oito votos a um, os ministros do STF revogaram a obrigatoriedade do documento, não a polêmica que acompanha o assunto há décadas. Aprovada pela Associação Nacional de Jornais, a decisão é criticada por entidades como a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj). Consideram inconsistente o argumento do presidente do Supremo, Gilmar Mendes, de que a necessidade do diploma é inconstitucional, pois “contraria a liberdade de expressão e do livre pensamento” consagrada na Carta de 1988.

As implicações da revogação da obrigatoriedade do diploma de jornalismo serão debatidas nas próximas segunda e terça-feiras, 22 e 23, às 13h, na sala 102K, com transmissão ao vivo do Portal PUC-Rio Digital. Professores da Universidade, profissionais e representantes da categoria discutirão, por exemplo, os rumos da formação acadêmica e do mercado de trabalho com o fim da exigência.

Para o presidente da ABI, Mauricio Azêdo, inconstitucional é a determinação do Supremo, que “sonega” o direito a um jornalismo de alto nível técnico, cultural e ético. Em meio a controvérsias, estudantes, profissionais e professores renovam as discussões e perspectivas sobre o futuro da profissão.

– Sou a favor da manutenção do diploma, um instrumento de aperfeiçoamento das questões democráticas, porque sustenta a produção de um jornalismo de melhor qualidade. O grande diferencial do graduando é que ele aprende a ter uma visão crítica sobre a sociedade brasileira e a sociedade contemporânea – afirma Leonel Aguiar, coordenador do curso de Jornalismo da PUC-Rio. (Ouça a entrevista completa de Leonel na reportagem de rádio do Portal

Ao justificar o voto favorável ao recurso interposto pelo Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo e pelo Ministério Público Federal contra a obrigatoriedade do diploma, o relator Gilmar Mendes alegou que o exercício da profissão “dispensa a formação especializada”. O voto de Gilmar foi acompanhado por sete ministros do STF (Carmen Lucia, Eros Grau, Ricardo Lewandowski, Ayres Britto, Cezar Peluso, Ellen Gracie e Celso Mello), à exceção de Marco Aurélio Mello. Marco Aurélio acredita que a preparação técnica seja essencial à produção de um jornalismo de alta qualidade, voltado ao interesse público. Representantes da categoria adotam argumentos semelhantes para evocar a necessidade do diploma.

"Sem a exigência do diploma, cai a nossa regulamentação profissional, caem inclusive aspectos da liberdade de imprensa. E um jornalista com medo é tudo, menos jornalista", ressaltou Beth Costa, diretora da Fenaj, em debate na PUC-Rio organizado pelos professores Leonel Aguiar e Leise Taveira, ambos do Departamento de Comunicação. Para Beth, a revogação é "um retrocesso":

– Voltaremos ao cenário de 1950, quando os jornalistas eram apadrinhados políticos e defendiam interesses particulares. Quem perde é a sociedade. 

Leise Taveira argumenta que a falta de preparação adequada tornará a informação – “um bem público social” – mais sujeita a distorções que podem gerar danos morais. “Na universidade, aprende-se não só a escrever no formato jornalístico, por exemplo, mas a ver o mundo com outros olhos. E a lidar com os aspectos éticos da profissão. Agora está na hora de a sociedade dizer qual a imprensa que se quer”, alerta. A professora organiza um debate sobre o tema marcado para o dia 24 de junho, às 18h30, na sede da OAB do Rio (Rua Marechal Câmara, 150, Centro).

Já o jornalista Arthur Dapieve, professor de jornalismo impresso da PUC-Rio, considera a decisão do STF sensata, pois “não é a mera posse de um diploma que qualifica alguém para ser jornalista”. Ele acredita, no entanto, que o mercado dará preferência aos profissionais com formação especializada. “Como editor, vou sempre preferir aqueles formados”, diz ele.

Para o jornalista Luis Nachbin, professor de telejornalismo da universidade, não há uma relação obrigatória entre formação técnica e rendimento profissional. “Sou a favor é da qualificação universitária”, esclarece.

Favorável ao diploma, André Trigueiro, apresentador da Globo News e professor da PUC-Rio, observa que, “do ponto de vista corporativo, a decisão do STF foi ruim”. Mas ressalva:

– A decisão confirma o que é visto no mercado: colunistas, comentaristas já trabalham como jornalistas. Mas é importante que, mesmo sem diploma, aqueles que quiserem ser jornalistas cultivem uma formação humanista. É muita responsabilidade transmitir informações para a sociedade.

Jornalista do Globo e também professor da PUC-Rio, Chico Otávio admite que nunca teve opinião formada sobre o assunto, mas se diz preocupado com o que vai acontecer nas redações pequenas:

– Agora não será difícil encontrar o sobrinho do prefeito de uma cidade pequena, que também é dono do jornal, trabalhando como jornalista . E isso é muito perigoso – alerta.

Débora Castro, estudante do 7º período de Jornalismo, é contra a revogação do diploma. Ela justifica:

– Não é qualquer um que pode exercer a nossa profissão. O diploma é necessário porque este profissional mexe com opinião pública. Para isso, é importante ter o mínimo de percepção e preparação, competências que se adquire na universidade.

Para o também estudante Marcos Cavalcanti, a decisão do Supremo implicará queda da qualidade da informação veiculada em jornais, revistas, emissoras:

– A briga por um lugar no mercado aumentará. A oferta de profissionais ficará muito grande e os salários, menores – prevê o futuro jornhalista. 

Já o estudante de Publicidade Thiago Santos não enxerga  mudanças no mercado:

– As grandes empresas de comunicação continuarão contratando jornalistas, para manter o padrão de qualidade e não perder a credibilidade. Talvez, as grandes prejudicadas com essa decisão sejam as universidades, que podem perder alunos.

O Brasil reúne 79.923 jornalistas registrados, de acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego. Aproximadamente 8.500 não têm diploma.