Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 23 de abril de 2024


Cultura

Um olhar multidisciplinar sobre a melancolia

Paula Araujo - Do Portal

13/04/2009

À primeira vista, medicina e filosofia parecem não ter nenhum tipo de ligação. Mas, ao contrário do que se pensa, a relação entre elas é antiga. Desde o século V a.C., os textos médicos aristocráticos foram responsáveis por desenvolver essa discussão. Hoje, a interdisciplinaridade é ainda maior, unindo-se também literatura e até belas-artes. Assim é o livro Metáfora e Melancolia: ensaios médico-filosóficos, recém-lançado pela editora PUC-Rio. A questão central é a abordagem da melancolia a partir dessas diferentes áreas do conhecimento. São pontos de partida os temas da metáfora, do dualismo corpo-alma e da visceralidade.

A obra é resultado de um trabalho co-autoral. O médico e filósofo Ivan Frias foi responsável pela seleção e tradução de textos do filólogo Jackie Pigeaud. O livro é a concretização de um interesse antigo.

- Eu estudava a relação da medicina com a filosofia a partir de uma tradição de estudos sobre Hipócrates. Em 1970, aconteceu o Primeiro Colóquio Hipocrático, do qual participaram alguns professores de Jackie Pigeaud. Logo depois, ele também participou como autor de textos. Foi a partir deles que eu o conheci - conta Frias.

Os ensaios que integram o livro referem-se à melancolia na Antiguidade, considerando a obra de Aristóteles. O autor aproxima os discursos sobre as doenças da alma dos discursos sobre a literatura e a poesia. Frias ensina que a análise do conceito é interdisciplinar em sua essência.

- Começa na filosofia, com Aristóteles. É ele que introduz uma fundamentação teórica à melancolia, fornecendo a base de toda a sua história no Ocidente, até o início do século XIX, quando surge a psiquiatria, com Pinel.

Segundo o médico, seu significado passou por mudanças.

- Hoje, ela é sinônimo de depressão, mas não foi sempre assim. O quadro das doenças ao longo da história do pensamento médico é dinâmico. À medida que o conhecimento vai evoluindo, este quadro também muda.

No entanto, Frias explica que existe até hoje um conceito que vai além da doença. De acordo com a tradição médico-filosófico-literária, o melancólico é o artista, aquele capaz de pintar um quadro, escrever um livro. Ou seja, a melancolia é um estado de inspiração.

Não é a primeira vez que Frias se envolve com o mundo literário. O filósofo pertence à Sociedade Brasileira de Médicos Escritores e é autor de livros como Platão leitor de Hipócrates e Doença do corpo, doença da alma: Medicina e Filosofia na Grécia Clássica. Nas obras, os dois campos estão entrelaçados. Segundo ele, a ligação da ciência com a literatura também é forte.

- A história apresenta vários escritores que são ou foram médicos, como João Guimarães Rosa, Pedro Nava e muitos outros. Este profissional lida com a vida e a morte e existe um tipo de literatura que trata destes temas. Ela é uma transcrição artística da vida dos homens, o que fazem e pensam. O médico está muito próximo de tudo isso também. 

Ele não pretende deixar o mundo da literatura para trás. Seus próximos projetos são escrever um livro sobre a melancolia e realizar obras que abordem os trabalhos de Assis Chateaubriand, Machado de Assis e Fernando Pessoa.

- Gostaria de escrever sobre artistas que manifestaram nas suas obras e nos seus personagens essa condição da inspiração, do homem de gênio.