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Rio de Janeiro, 19 de abril de 2024


Cultura

Livro explora nova área do Design

José Augusto Martini - Do Portal

26/01/2009

Trabalhar o design de um produto é muito mais do que alterar a forma física e desenvolver funções mecânicas. Foi justamente pensando nas questões subjetivas ligadas ao emocional que as professoras do Departamento de Artes & Design da PUC-Rio, Vera Damazio e Claudia Mont’Alvão, decidiram lançar Design, Ergonomia, Emoção (MAUAD Editora). Uma obra que apresenta um olhar nacional sobre esse novo campo de estudo chamado Design Emocional.

O livro foi organizado a partir de artigos publicados no exterior por professores brasileiros, que não foram publicados aqui no Brasil. Em entrevista ao Portal PUC-Rio Digital, Vera Damázio, da área de design, e Claudia Mont’Alvão, Ergonomia, explicam o que é e como surgiu esse encontro do Design e da Ergonomia com a Emoção.

Portal: O que é o Design Emocional?

Vera Damázio: : Não apenas convivemos, como acabamos adorando e detestando os objetos que nos cercam. Eles mediam nossas ações cotidianas e podem facilitar e dificultar muito nossas vidas. Entendo o Design Emocional como uma maneira de enxergar o design e principalmente uma maneira de projetar atenta ao fato de que os produtos desencadeiam reações emocionais, atitudes, comportamentos. O Design Emocional tem como foco o uso, o efeito, a ação promovida pelo objeto e não o objeto apenas. Se o designer quer que as pessoas separem seu lixo, por exemplo, então ele deve projetar com foco na ação de separar o lixo. A estratégia pode ser desenvolver uma maneira de conscientizar o usuário sobre a importância de separar o lixo. O objeto não é mais o fim, mas um meio para se atingir um determinado fim. O interessante é que muitas vezes a solução não é física.

Claudia Mont’Alvão: Para mim, o Design Emocional seria uma qualidade no projeto que, além de garantir as questões básicas, também corresponde a uma questão emocional do consumidor. São coisas muito subjetivas e que foram a minha discussão com a Vera para tentar organizar o livro.

Portal: De onde surgiu a idéia da coletânea?

Vera Damázio: Surgiu de uma situação na qual ficou claro para Cláudia e eu que o Design Emocional estava sendo muito mal interpretado. Algumas pessoas acreditam que o designer está querendo projetar emoções, manipular o usuário, criar armadilhas focadas na venda, e isso é absurdo. Apesar de nossas abordagens distintas, reconhecemos a importância e o potencial deste campo recente do Design. Busco meu referencial teórico nas Ciências Sociais. Já Cláudia, é da área de Ergonomia. Então nos perguntamos que outros pesquisadores brasileiros estariam publicando nessa área e localizamos trabalhos inéditos apresentados em congressos internacionais. O livro é uma coletânea de artigos sobre Design Emocional recentemente apresentados em fóruns internacionais.

Claudia Mont’Alvão: Começou numa discussão, pois não concordamos com tudo. O Design Emocional passa por questões muito subjetivas. Conversamos sobre os métodos de se falar sobre o Design Emocional, até que ponto é válido. Decidimos, então, fazer um livro para esclarecer uma série de aspectos e entender o que é essa questão, por onde isso passa. A idéia foi justamente trabalhar a partir de artigos que já foram publicados no exterior por professores brasileiros e que não tivessem sido publicados aqui no Brasil.

Portal: O livro reúne diversos trabalhos de pesquisadores brasileiros apresentados em eventos internacionais. Como são recebidos esses trabalhos no cenário internacional?

Vera Damázio: Congressos internacionais são muito concorridos e costumam receber uma quantidade enorme de trabalhos. O critério de seleção é rigoroso e o aval dos comitês de avaliação é um indicador de que os trabalhos têm qualidade.

Claudia Mont’Alvão: Todos esses eventos internacionais possuem critérios rígidos. A pesquisa que fazemos aqui no Brasil em design é de excelente qualidade. Temos uma situação privilegiada de fazer parte de um grupo de professores que são do curso de pós-graduação em design aqui da PUC, o primeiro desse tipo no Brasil. Atualmente, somos o único Doutorado na América Latina. Isso significa que estamos fazendo algo de bom.

Portal: Qual a importância de entendermos a relação emocional das pessoas com os objetos?

Vera Damázio: Os designers projetam a forma física dos objetos, mas são as pessoas, através do uso, que lhes trazem sentido. Entender a relação emocional das pessoas com os objetos é entender o objeto em uso, é entender a “forma social” e as “funções simbólicas” dos produtos que projetamos, além das físicas e mecânicas. Entender a relação emocional das pessoas com o objeto é o caminho para o projeto de um meio mais humano, mais ajustado às pessoas, mais inclusivo, mais bem-humorado, mais sustentável.

Claudia Mont’Alvão: Quando havia um mercado em que as questões de qualidade não eram muito evidentes, as pessoas preferiam uma marca em função da outra porque tal marca oferecia padrões de conforto melhores do que a outra. Só que agora quase todas as empresas buscam isso. O que vai dar a diferença hoje do meu produto para o seu? Na Ergonomia, vemos a tendência da customização. Essa é uma maneira, a outra é tentar resgatar alguma questão emocional. O grande desafio nesse estudo é como fazer isso.

Portal: O “Design Emocional” afirma a não neutralidade dos objetos, o que justificaria o seu estudo. Quais as formas de contribuição desse campo para um usuário de um produto desenvolvido sobre as premissas do “design emocional”?

Vera Damázio: Um objeto nunca é neutro. Ou melhor, o objeto é neutro, mas o contexto em que ele está inserido e o uso que fazem dele acaba com sua neutralidade. Uma garrafa de Coca-Cola num bar do Rio de Janeiro é uma coisa, jogada de um avião no meio de uma tribo
africana pode virar um presente dos deuses, como conta o filme “Eram os deuses astronautas”. Gosto de pensar que quem dá sentido às coisas são as pessoas, mas que o designer pode contribuir com esse processo, imaginando as ações, as atitudes e o comportamento que seus produtos podem promover. Projetar com foco em ações pode levantar questões novas e originais para o designer e gerar soluções igualmente novas e originais.

Portal: De que forma o design pode contribuir para a melhoria de uma sociedade?

Vera Damázio: O Design é uma atividade de enorme alcance social e instrumentada para materializar soluções de toda ordem e não apenas para criar objetos extravagantes e sofisticados. Seus resultados podem atender necessidades diversas da sociedade, das mais básicas às mais requintadas, das mais mecânicas às mais transcendentais. Um dos aspectos do Design Emocional é a idéia de que os produtos podem promover mudanças de atitudes. Uma imagem pode contribuir para as pessoas vacinarem seus filhos, doarem sangue, dirigirem com mais prudência. Um produto pode contribuir com o consumo de energia mais moderado, pode promover o convívio harmonioso entre as pessoas ou até incorporar códigos éticos. 

Claudia Mont’Alvão: Acredito na mudança de comportamento por meio do produto. Você pode provocar numa pessoa a mudança de atitude. E aí consistem os grandes desafios. Seja pensar numa campanha que as pessoas se engajem por uma determinada causa. É possível fazer um projeto de design que cause mudanças, e não apenas mais um folheto ou cartaz para transmitir informações. Queremos melhorar a sociedade, que as coisas sejam mais eficientes. Caso atinja uma questão emocional, melhor ainda. E mudar a atitude é o primeiro ponto.