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Rio de Janeiro, 19 de abril de 2024


Cultura

Obra de Ana Cristina César permanece viva

Carolina Heringer - Do Portal

10/03/2009

Já se foram 25 anos desde que a poetisa Ana Cristina César se jogou da janela do apartamento de seus pais, em Copacabana. Tomada por uma forte crise de depressão, Ana colocou um fim em sua própria vida, aos 31 anos, em outubro de 1983. Mas a tragédia não interrompeu a publicação de novas obras. Desde a morte da poetisa, foram lançados quatro livros de textos inéditos. A imensa variedade de escritos deixados por Ana – poemas, trechos de diário, relatos de viagem, bilhetes e cartas nunca enviadas – manteve viva a sua obra.

Parte desse material deu origem a “Antigos e Soltos”, quarto e mais recente livro lançado, organizado pela professora Viviana Bosi. Ao ler os poemas de Ana Cristina, Viviana encantou-se e resolveu pesquisar a obra da poetisa. Descobriu a existência de diversos textos que não haviam sido publicados, e achou um desperdício todo o material ficar “debaixo de poeira”. No livro, a professora fez questão de colocar os fac-símiles dos rascunhos, textos e desenhos inacabados – todo o processo produtivo de Ana está exposto ao leitor. Tudo para ser verdadeira e mostrar como os escritos foram encontrados, já que a poetisa não os deixou prontos para serem publicados.

O lançamento de “Antigos e Soltos", no final do ano passado, marcou os 25 anos da morte de Ana. Reunidos no Instituto Moreira Salles, parentes, amigos e admiradores participaram da homenagem à poetisa. Segundo Armando Freitas Filho, grande amigo de Ana, este livro dá uma nova vida à obra da escritora. “Quanto mais o tempo passa, mais ficamos longe da morte dela, e ao mesmo tempo nos aproximamos mais de sua obra”, afirma. Armando organizou a publicação dos três primeiros livros póstumos de Ana, “Inéditos e Dispersos” (1985), “Escritos na Inglaterra” (1988), e “Escritos no Rio” (1993).

Ana Cristina César é definida por Armando como uma “inglesa carioca”: alegre, encantadora e ágil, como aquilo que escrevia. Sua carreira teve início precoce: em 1959, com apenas sete anos. Mesmo sem saber escrever, já publicava na “Tribuna da Imprensa” os poemas que ditava. Ana escreveu também para diversos jornais e revistas alternativos. Além disso, trabalhou na tradução da obra de poetas estrangeiros, entre eles, Silvia Plath.

O primeiro livro lançado com textos da poetisa foi “26 poetas hoje” (1976), organizado por Heloisa Buarque de Hollanda, que trazia um retrato da geração de poetas da chamada literatura marginal dos anos 1970, como Chacal, Torquato Neto, Waly Salomão, e a própria Ana. A censura e a intensa repressão do governo militar faziam com que os jovens buscassem uma alternativa para expor suas idéias. Os autores burlavam o esquema editorial para publicar suas obras, que eram vendidas por eles mesmos em bares, na porta de cinemas e teatros, e em faculdades.

Foi através dessa forma ágil e barata de levar seus livros ao público que Ana Cristina lançou “Cenas de abril” (1979), “Correspondência completa” (1979) e “Luvas de pelica” (1980). As três obras foram financiadas e confeccionadas pela própria autora. Pela Editora Brasiliense, em 1982, publicou “A teus pés”, seu quarto livro de poesia, que também reunia os três primeiros.

Depois da trágica morte, em 1983, sua obra continuou sendo publicada, graças aos esforços de parentes, amigos e fãs. Para Viviana Bosi, é a originalidade que faz com que Ana Cristina seja ainda tão lida e estudada. “A Ana te aproxima da obra dela, parece que está falando com você, porque seus textos se baseiam em confissões, escritos de diário. Isso dá a impressão de que o texto dela é escrito num impulso, mas isso não é verdade, porque há muita reflexão e trabalho literário", conclui a professora.

 Amigo fiel e eterno admirador

O poeta Armando Freitas Filho era um dos amigos mais próximos de Ana Cristina César. Grande fã das suas obras, ele é o curador do acervo pessoal da amiga. Além disso, foi o responsável pelo lançamento de três livros póstumos da poetisa.

Qual foi a influência de Ana na sua obra?
Considero que a influência maior foi na minha vida. Vivi perto dela durante dez anos, éramos muito amigos. E o mais curioso é que eu era bem mais velho do que ela, e aquela mocinha, assim mesmo, tinha uma influência muito forte na minha vida. Ela era especial, tão madura para certas coisas. De qualquer forma, foi também um grande legado para minha obra.

O que há de peculiar na obra de Ana?
A matriz da obra de Ana é seu diário e também cartas pessoais. O resultado é uma inflexão para o texto dela, cria-se essa interlocução que aproxima os leitores e gera grande empatia com cada um.

Como é a influência da obra de Ana nas gerações mais jovens?
A obra de Ana ilumina novos rostos e corações. Recebo muitos pedidos de entrevistas de jovens que querem saber quem foi Ana Cristina. Nesses 25 anos, a importância da sua obra cresceu muito, e a prova é essa proximidade com os jovens, e esse interesse das novas gerações.


Há material para novos lançamentos?
Sempre tem. Na verdade, sempre há esperança de que tenha.