Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 25 de abril de 2024


Campus

Alexandre Garcia: simplicidade e sorte a serviço do jornalismo

Paula Bastos Araripe - aplicativo - Do Portal

30/04/2015

 Paula Bastos Araripe

Há nove anos à frente do programa Espaço aberto, hoje com o nome GloboNews Alexandre Garcia, o jornalista Alexandre Eggers Garcia foi correspondente em quatro guerras, mediou o polêmico debate entre Fernando Collor e Luiz Inácio Lula da Silva em 1989 e é autor dos livros João presidente (Artenova, 1978) e Nos bastidores da notícia (Ed. Globo, 1990). Encerrando a quinta-feira de Semana de Rádio e TV, ele contou histórias de sorte em suas reportagens, incluindo a de sua primeira cobertura internacional, do fechamento do Congresso uruguaio em 1973, que instituiu a ditadura no país, quando foi escalado por estar na sucursal gaúcha, de onde sairia um voo mais rápido, e conseguiu entrevistar o presidente Juan María Bordaberry porque o colega do Estado de S. Paulo fora detido:

– Não havia como sair do Rio e chegar a Montevidéu no mesmo dia. Eu estava na sucursal do Jornal do Brasil em Porto Alegre, de onde saía um voo às 5 e meia da tarde. Eu estava apenas há dois anos no JB, mas os dois jornalistas mais experientes não podiam ir, então fui eu. No dia seguinte, soube que o correspondente do Estadão Flávio Tavares teria entrevista com o presidente primeiro. O Estadão iria furar o JB, e seria minha culpa. Aí toca o telefone e o assessor do presidente diz que o presidente estava me esperando, porque o Flávio estava numa reunião que foi cercada e acabou preso. Ganhei a entrevista e minha glória com o JB, com a foto de capa do jornal de domingo, de maior tiragem.

Sobre as coberturas de guerra, Garcia lembrou a do Líbano, em 1982 para a Manchete, em que quase levou um tiro de um xiita que o confundiu com um judeu. Usando o que aprendeu quando esteve na infantaria, ele se protegeu até ter cobertura de um tanque israelita. Dias depois, novamente confundido com um judeu, foi preso acusado de deserção. O jornalista contou ainda outro caso de sorte durante a cobertura:

– Havia um posto de gasolina bombardeado, onde um menino libanês juntava água de um cano arrebentado com um galão plástico. Pedi ao menino que sentasse num carro todo perfurado a bala, para eu tirar uma foto. Depois de uma conversa ele aceitou e, quando eu o estava ajudando a subir no carro, houve uma explosão, a 20 metros de distância. Subiu uma fumaça preta da explosão, e no meio dela se lia “Alexandre”. Achei estranho e fotografei. Então o coronel do exército de Israel gritou “Vamos embora, começou a artilharia”. Subi no carro e fomos almoçar ao norte de Beirute. Mais tarde, o coronel foi ver as notícias do dia e voltou com lágrimas nos olhos, me abraçando: “Você nos salvou a vida, você nos salvou a vida!”, e eu sem entender. “Eu ia te levar para um almoço num hotel que tem o seu nome, mas entrou um carro bomba lá e teve 52 mortos. Você nos atrasou fotografando aquele menino”. Em questão de minutos, nós estaríamos naquele hotel.

Garcia também criticou o uso indevido de números no jornalismo, principalmente na contagem de pessoas em grandes aglomerações, contando que costuma fazer suas próprias contas de pessoas por metro quadrado:

– É absurdo o número que a organização das manifestações dá, e a imprensa usa. “Parada gay na Avenida Paulista, 3 milhões de pessoas”. Peraí! A Paulista tem 2.500 metros de comprimento, 55 metros de largura. Põe três pessoas por metro quadro, e aí dá 450 mil pessoas. Devemos nos acostumar a ler as coisas com quatro pés atrás.

O jornalista alertou sobre o cuidado com a linguagem, a ferramenta de todo jornalista. Cintando uma frase atribuída a Winston Churchill, sobre o segredo da comunicação – “Das palavras, as mais simples; e das mais simples, as menores” –, afirmou que o jornalista hoje está usando palavras mais longas do que deveriam:

– Avião não é mais avião, é “aeronave”. Vender agora é “comercializar”. Ninguém mais tem posição; tem “posicionamento”. O crime é “criminalidade”. Usar virou “utilizar”. Há uma diferença. Eu uso uma caneta para escrever, agora se eu estiver em um avião sequestrado e eu pegar a caneta e enfiá-la na barriga do sequestrador eu estarei a utilizando. O que eu acho mais chato é o “disponibilizar”, em vez de oferecer. As palavras têm valor. Se não há uma linguagem simples, não há uma linguagem clara.

Marco Aurélio: o rádio como a base do jornalismo

Na segunda palestra da tarde, o jornalista Marcus Aurélio Carvalho contou sua experiência como o primeiro repórter esportivo com deficiência visual em uma rádio. Com apenas 10% de visão, Marco Aurélio falou de sua experiência no Sistema Globo de Rádio e afirmou que um jornalista não deve misturar ideologia com experiência pessoal:

Paula Bastos Araripe  – Saber transitar entre as diferenças é um dos maiores dons que um ser humano pode ter e um jornalista deve ter. Saí da Rádio Globo por conflito de ideias, não de pessoas.

Usando um “powerpoint auditivo”, como definiu, Marco Aurélio mostrou áudios de transmissões dos jornalistas William Bonner, na Rádio USP em 1989, falando de rock alternativo, e Galvão Bueno cobrindo Fórmula 1 com 24 anos na Rádio Gazeta, e elogiou Mariana Gross, hoje apresentadora do RJ TV, sua estagiária na CBN:

– Sou muito fã da Mariana desde que era estagiária. No caso do ônibus 174, com um telefone enorme, como era na época, segurou quatro horas de cobertura. Com 22 anos, ela já dava um show na rádio.

Marco Aurélio enalteceu o rádio, na sua opinião o meio de comunicação que, por apenas um sentido, o da audição, é capaz de produzir todos os outros, e o mais completo na formação de jornalistas de todos os meios de comunicação:

– Que outro meio de comunicação tem tantas destrezas juntas quanto o rádio? Você tem que escrever bem e saber falar tão bem quanto, mas sem ter um texto. Radio é ao vivo, é imprevisível.

Sempre com bom humor, o jornalista falou sobre sua infância no Complexo do Alemão, onde acordava todos os dias com o cheiro de pães e bolos de uma fábrica atrás de sua casa, e sobre a origem do seu amor pelo rádio:

– Meu pai foi uma referência de trabalhador para mim. Ele consertava rádios e TVs e carregava todo o peso dos aparelhos na subida do morro. Foi com ele que ouvi rádio pela primeira vez, e um dos motivos para eu ter escolhido essa carreira.

Marco Aurélio é professor de locução há 20 anos na Unirr (União e Inclusão em Redes e Rádio), onde leciona para alunos com deficiência visual e sem deficiência juntos, a pedido dele, já que é contra a segregação no ensino. Ele também é professor de comunicação da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), além de ser diretor da Unirr e âncora da Rádio MEC AM da EBC.

Rodrigo Thomé: um caminho turbulento no audiovisual

O dia de palestras começou com Rodrigo Thomé, co-criador do Peixe Voador Produções, contando de sua trajetória junto com seu colega Rodrigo Figueiredo, na área do audiovisual, do mundo submerso aos voos de drones. A produtora hoje é responsável pelo programa Uma aventura no Alasca, que estreou no dia 20 de abril no canal OFF, com novos episódios segundas às 22h30. Mas a trajetória dos sócios não foi fácil, e Rodrigo ressaltou a importância de se fazer o que gosta:

Paula Bastos Araripe  – Filmagem submarina é o que nós gostamos de fazer, eu trabalho com isso há 22 anos. Se gosta, não importa se está frio, se está chovendo. No Alasca, ficamos 40 minutos debaixo d’água, mas encontramos leões marinhos tão animados que nem sentimos frio. Passei um bom tempo dando aulas de mergulho, coisa que a vida acabou me levando, mas não era bem o que eu queria, então soube parar de fazer aquilo e mudar.

A primeira experiência no canal OFF foi o convite para a filmagem do programa Submerso, em 2012, quando ainda não tinham a produtora. Os cinegrafistas ficaram uma semana gravando no Recife. O canal aprovou o programa, mas não os cinegrafistas. Eles não desistiram do mercado de filmagem de aventura, e encontraram uma brecha com os drones. No lançamento do Phantom, tipo menor de drone e com espaço para uma câmera GoPro, os cinegrafistas compraram um e foram praticar o voo do drone no campo de beisebol da Lagoa:

– Eu nunca fui bom com videogames ou carrinhos de controle remoto. Decolei o drone e fiquei animado. Mas, ao ganhar distância, eu tentava fazê-lo ir para a frente, ele ia para trás; eu ia para um lado, ele ia para o outro. Foram os minutos mais tensos da minha vida. Depois começamos a treinar em lugares mais seguros. As pessoas viam, achavam legal e perguntavam o que era, e então começamos a ver que aquele negócio poderia dar certo.

Logo depois, mesmo sem muito dinheiro ou experiência, compraram um drone maior e mais sofisticado. A partir daí, foram chamados para fazer imagens aéreas para propagandas e para um episódio no Canadá no programa Quatro Remos, do OFF. Exibiram no Fantástico um programa sobre Galápagos, e no ano passado o Grutas e Cavernas, que foi ao ar de abril a julho de 2014. Hoje, têm a maior frota de drones do Rio de Janeiro.