Isabella Rocha e Lara Aleixo - aplicativo - Do Portal
28/02/2014Os cinco milhões de foliões esperados para o carnaval do Rio têm um refrão comum: “Bom folião não joga lixo no chão”, slogan do programa Lixo Zero, da prefeitura. Receberão o reforço de 235 duplas formadas por um guarda municipal e um gari. As equipes fiscalizarão, duas horas antes do início de cada batucada e na dispersão, a maior parte dos quase 500 blocos que ganham a cidade de hoje até 9 de março. Esperam, nesse primeiro carnaval da campanha, reduzir a montanha de sujeira historicamente recolhida no período (ano passado, foram contabilizadas pouco mais de 700 toneladas).
A Comlurb instalou 2.100 contêineres e lixeiras nas áreas pelas quais desfilarão os blocos e escalou 1.080 garis. Responsável pela implantação, há seis meses, do programa Lixo Zero, Fernando Alves explica que o principal objetivo não é propriamente tornar a cidade mais limpa neste carnaval, e sim mudar o comportamento do carioca: “Se você não joga lixo na sua casa, não deve jogar lixo na rua”, argumenta. (Leia a entrevista no box no fim deste texto).
A campanha ganha reforço visual no período. Nos pontos turísticos e nos sinais de trânsito mais movimentado, faixas lembram a moradores e visitantes: “Lixo é no lugar certo”, “Sujou pagou”, “Agora é pra valer”. Para chegar à mudança de comportamento desejada, a prefeitura não joga confete no bolso do folião. Garante que manterá, nos dias de festa, o rigor que já soma, desde agosto do ano passado, quase três mil multas aplicadas naqueles flagrados sujando as ruas. No fim de semana passado, quando cerca de um milhão de foliões espalharam-se por blocos como Simpatia é Quase Amor, em Ipanema, e Bloco da Preta, no Centro, foram registradas 313 multas.
A presidente da Sebastiana, Associação Independentes dos Blocos, Rita Fernandes, acredita os foliões estão “mais conscientes” graças às campanhas de educação. Ela percebe uma evolução:
Já a universitária Juliana Pollilo, de 21 anos, carnavalesca “desde pequena”, nota uma mudança menos na quantidade do que no tipo de sujeira legada pelo carnaval de rua:
– Quando era criança, me lembro das ruas sujas, mas sujas de confetes e serpentinas. Hoje são latinhas jogadas no chão, além do cheiro insuportável de urina nas ruas, um desrespeito – desabafa – Mas os banheiros químicos são muito ruins e insuficientes – ressalva a estudante de Relações Internacionais.
O professor Roosevelt Fideles, do Departamento de Serviço Social, um dos que ajudaram na criar o Núcleo Interdisciplinar do Meio Ambiente da PUC-Rio (Nima), critica a forma com a qual foi implantada a nova lei para coibir o despejo de lixo nas ruas. Ele explica por quê:
— Não houve um programa prévio de reeducação com a sociedade carioca. Deveríamos formar cidadãos com uma nova postura em relação ao meio ambiente. Se houver essa mudança, não haverá mais necessidade de multa. Parece que o interesse do poder público é simplesmente arrecadar dinheiro.
Roosevelt reconhece, no entanto, um avanço desde que o programa Lixo Zero foi implantado, em meados do ano passado:
– Outro dia fui à praia e reparei que a quantidade de lixo nas areias estava menor. Aos poucos, os cariocas estão mudando de comportamento. Afinal, quando mexe no bolso, dói muito mais – admite o professor.
Rita pondera que a busca do "lixo zero" adquire um desafio extra no carnaval, quando "a cidade da normalidade". Ela conta, assim, que montou uma logística específica para esta força-tarefa:
"O cidadão precisa entender que a rua é uma extensão da casa" Fernando Alves, um dos artífices do programa Lixo Zero, já vê bons resultados nesses seis meses. Em rápida entrevista ao Portal, diz que a campanha repercutiu não só "em âmbito nacional", mas em outros países, como o Uruguai. Segundo ele, 18 cidades brasileiras estudam a possibilidade de implantar o projeto, cujo objetivo principal, reitera, é a "mudança de comportamento do cidadão". Portal: Qual o principal legado que o Lixo Zero pretende deve deixar para a cidade? Alves: A mudança da cultura do carioca em relação aos locais públicos. Pretendemos mudar o comportamento do cidadão. Queremos que entenda que cada lugar público é uma extensão da casa dele, para que preserve da mesma forma. Portal: O carnaval ajuda ou atrapalha essa conscientização? Alves: Tenho percebido um avanço. Eu mesmo estava acompanhando o Bloco da Preta, no sábado passado, e vi que as pessoas procuravam com mais frequência as nossas papeleiras e os contêineres que espalhados ao longo da avenida para descartar o lixo. Até o ano passado, a gente não via isso. O pessoal largava em qualquer lugar. Ainda existem muitas pessoas com esse comportamento, até porque nós recebemos um público de todo o país. Portal: Há um divulgação especial da campanha para o visitante? Alves: Quem chega ao Rio tem notícia do programa em vários pontos. Para os estrangeiros, temos um folheto com o qual os fiscais explicam aos turistas os princípios do porgrama e até os procedimentos para pagar a multa. No caso do cidadão brasileiro, a multa é emitida pelo CPF. No caso do turista, utilizamos o passaporte. Então, se ele não pagar a multa, terá dificuldade para sair do país. Para o visitante do Cone Sul, há um convênio com a Serasa que cobra a multa no país de origem. Com isso, cercamos o infrator por toda a parte. Portal: No dia 25, em protesto na Presidente Vargas, garis disseram que não trabalhariam no carnaval. O risco de greve permanece? Caso se consuma, quais os impactos para o "Lixo Zero" no carnaval? Alves: Isso é pontual. Temos um quadro com cerca de 20 mil garis, e essa é a época de negociação salarial com o sindicato. Não acredito que aconteça a greve. Nossos profissionais estão bem remunerados. Claro que é importante sempre melhorar a condição salarial, os direitos garantidos. Portal: Como o dinheiro arrecadado com o Lixo Zero é aplicado? Alves: A arrecadação com as multas é usada para a divulgação do programa e para pagar o próprio investimento. Temos cerca de 600 pessoas trabalhando, e os PMs com que trabalhamos são contratados no dias de folga. Temos um efetivo de 200 policiais no total. |