Luciana Brafman* - aplicativo - Do Portal
04/12/2013Eram os anos 1990 quando ouvi e me assustei com a metáfora “trocar o pneu com o carro em movimento”, ou algo parecido. Eu trabalhava numa grande empresa, e os tempos eram de reestruturação, uma das tantas por que o mundo corporativo passa de tempos em tempos. A expressão virou uma espécie de mantra dos gurus da administração da época. Era preciso se adaptar aos novos cenários.
A imagem do supermecânico trocando o pneu da máquina veloz em plena autoestrada me volta agora à mente, a partir da encruzilhada em que se encontra o setor de comunicação. Nos últimos 20 anos, o avanço da internet e de seus filhotes permitiu o acesso a uma quantidade boçal de informações em tempo real e de graça. Tradicionais jornais, revistas, TVs e rádios do mundo todo iniciaram processos de adequação à realidade, munidos da credibilidade e da qualidade outrora alcançadas.
No jornalismo, credibilidade e qualidade são os ingredientes mágicos, que sempre caminharam ao lado da publicidade. Os anunciantes buscam o olhar do público de determinado veículo de comunicação. As pessoas, por sua vez, estão interessadas em notícias isentas ou em opiniões de especialistas. Em troca, aceitam de bom grado a intervenção comercial. Fechada a equação, o modelo é financeiramente sustentável pelo tripé empresa de comunicação-publicidade-público.
Desde Gutenberg, ao longo dos séculos, os meios de comunicação enfrentam desafios dos mais variados. Um deles diz respeito ao advento de novas tecnologias. No século passado, por exemplo, a televisão pôs em xeque o rádio. Controle remoto e TV fechada ameaçaram a TV aberta, num momento posterior. Na essência, a questão é sempre como atrair o público (ou não deixá-lo ir embora) e a consequente publicidade.
A internet oferece de tudo, e é um vasto terreno onde se compete por verba publicitária. Esta, no entanto, é restrita, infelizmente. O anunciante só tem interesse em por suas fichas onde há audiência, como sempre. Se quiserem sobreviver, as empresas jornalísticas devem apostar na internet, com a certeza de que o fiel e velho público irá atrás. Mas a migração é dolorosa.
No caso do jornal, por exemplo, a receita com anúncios lucrativos ainda vem do papel, não da extensão pontocom. Ou seja, a publicidade, por ora, está impressa, preto no branco. Na rede, os preços são mais baratos (os anunciantes ainda não estão dispostos a pagar mais). Assim, apenas com a fonte de recursos on-line, as empresas de comunicação não conseguem bancar todo um aparato tecnológico e humano para produzir notícias rápidas, abrangentes e de qualidade.
É preciso, então, manter uma cara estrutura do "velho jornalismo" funcionando azeitadamente, a pleno vapor, porque é esta que financia o hoje e que será o “mecenas” da empreitada do amanhã. Mas é preciso, em paralelo, investir pesado em uma nova estrutura, não menos custosa, para marcar o território da web com a credibilidade de sempre – e, consequentemente, público e anúncios... É chegada a hora de trocar o pneu.
*Jornalista e bacharel em economia, é professora do departamento de Comunicação Social da PUC-RJ e editora assistente de Economia do Globo
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