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Rio de Janeiro, 20 de abril de 2024


País

Privacidade agoniza, mas cidadão quer se resguardar?

Júlia Cople e Luis Edmundo Sauma - Do Portal

14/11/2013

 Danilo Azevedo

Ao polarizar os direitos à liberdade de expressão e à privacidade, a polêmica das biografias reacendeu o debate sobre os mecanismos de preservação da intimidade nesses tempos de exposição maciça impulsionada pelas novas tecnologias. Enquanto o grupo Procure Saber defende a permissão prévia para assegurar "a honra do biografado" e a Associação Brasileira de Editores de Livros pretende derrubar essa obrigatoriedade com o pedido de mudança dos artigos 20 e 21 do Código Civil, que será apreciado neste mês pelo Supremo Tribunal Federal (STF), uma corrente de cronistas, jornalistas e acadêmicos alerta: a principal ameaça à privacidade não está em publicações não autorizadas, e sim na devassa na rede mundial. Referem-se menos à espionagem que fez a presidente Dila Rousseff e a chanceler alemã Angela Merkel se unirem, na ONU, para puxar a orelha do presidente americano Barack Obama do que à multiplicação de particularidades (fotos, vídeos, dados) escancaradas na internet à revelia ou sem o conhecimento dos personagens — em grande parte dos casos, como vingança associada a, digamos, desilusões amorosas. Por menos tempo que fiquem no ar, ganham as mídias sociais e não raramente destroem reputações ou, na melhor das hipóteses, prejudicam rotinas, carreiras, relacionamentos.

Batizado de pornografia da vingança (revenge porn, em inglês), o fenônemo lubrificado pela cultura da exposição — em que a publicidade individual faz parte do processo de afirmação na sociedade — desperta estudos e indica a urgência de aperfeiçoamentos de uma ética ainda incipiente acerca de direitos, responsabilidades e comportamentos no território livre da internet. Analistas até reconheçam avanços como a Lei 17.737, de 2012 (Lei Carolina Dieckman), que pune invasões de computadores pessoais, e o estabelecimento do Marco Civil da Internet, em discussão no Congresso, no qual ambições econômicas e governamentais misturam-se a interesses propriamente civis. Sugerem, no entanto, reflexões mais profundas e abrangentes.

A preocupação vai ao encontro do número crescente não só do volume de internautas no Brasil — que somou 83,4 milhões no ano passado, um avanço de 16% nos últimos 12 meses, segundo levantamentos do Ibope e da Nielsen Online — mas também do tempo conectado. O brasileiro gasta, em média, 48 minutos por acesso. Se o ciberespaço potencializou o intercâmbio de informações, propapou a interatividade, derrubou as fronteiras e disseminou as relações pessoais, profissionais, políticas e comerciais, trouxe efeitos colaterais indesejados: concorrência desleal, violação da propriedade intelectual, desrespeito à intimidade. O cruzamento e o tráfico de dados é facilitado por mecanismos como cookies, que grava no disco rígido as últimas páginas virtuais acessadas, para identificar os hábitos de consumo do usuário.

A publicação anônima, praxe em alguns sites de relacionamento, ilustra a complexidade relativa à regulação da internet. Embora traga segurança, por exemplo, para críticas ao governo, cria um escudo aos que divulgam boatos ou disseminam ideais de intolerância e radicalismo. Para o professor do Departamento de Filosofia da PUC-Rio Edgar Lyra, esse cenário exige reflexões cuidadosas e plurais:

— Tem que se estabelecer uma linha entre o que é privado e o que é tolerável ser transparente. Isso exige um trabalho conceitual pesado para separar as esferas. Mas a questão transcende a privacidade. Como pensou Hannah Arendt, as categorias de pensamento político não dão mais conta da modernidade: recorrem ao relativismo exacerbado — observa.

Lyra percebe uma angústia em relação à velocidade com a qual os dados se espalham, motivo pelo qual não acredita ser possível blindar a informação e assegurar a privacidade de maneira absoluta. Para ele, o Fla-Flu em torno da biografia não autorizada, erguida aos holofotes da mídia pela entrada de craques na nossa música e pela iminência de votação no Supremo, é "signo de um problema maior": 

— Não nos demos conta da complexidade da discussão. Cartão de crédito e pedágio, por exemplo, geram informações. Será que a maioria sabe disso ou tem informações sobre o gerenciamento e armazenamento desses dados? Isso deveria ganhar a cena pública — propõe. 

 Arquivo Portal Ainda de acordo com o professor, fala-se muito sobre a elaboração de programas para segurança e preservação do anonimato, mas a concepção física da web continua "nas sombras dos acontecimentos": 

— Sempre me dizem que há razões estratégicas para isso. E se alguém pudesse cortar os cabos de fibra ótica que liga o leste dos Estados Unidos à Europa? É por onde é transmitido o maior fluxo de informações entre esses aliados. É caro, é privado e diz respeito à segurança nacional. 

"A pessoa que não é olhada, que não desperta interesse, é como se fosse um pária do ciberespaço"

Mas o ponto central referente às possíveis blindagens da privacidade na internet talvez esteja na reflexão sobre o real interesse em fazê-lo. "Quanto a nós mesmos, devemos guardar silêncio": Lyra recorre a esta paráfrase feita pelo filósofo alemão Immanuel Kant, alusiva ao pensador britânico Francis Bacon, como contraponto à cultura da exposição contemporânea, na qual o espetáculo, exacerbado pela internet, ganha contornos de afirmação social: 

— O cidadão quer mesmo se resguardar? É uma questão a se colocar. A pessoa que não é olhada, que não desperta interesse, é como se fosse um pária do ciberespaço. Ela não tem identidade. Nessa perspectiva, talvez a palavra "vigilância" devesse assumir um novo significado com a ascensão das novas tecnologias. 

A estudante de Educação Física Viviane Rodrigues orgulha-se em publicar "tudo sobre sua vida" no Facebook e no Twitter. Conta que já fizeram montagens e brincadeiras com algumas fotos publicadas, mas mas não se importa: "Rede social é para isso mesmo. Não vejo finalidade de ter um perfil na internet sem querer se expor", justifica.

Até setembro deste ano, o Facebook somava 250 bilhões de fotos, média de 217 imagens para cada um de seus 1,15 bilhão de usuários. Um arquivo que não para de crescer: são publicadas diariamente 350 milhões de fotos, 4 mil por segundo, aponta pesquisa feita pela rede social, em parceria com Ericsson e Qualcomm. Segundo o levantamento, são enviados cerca de 4,75 bilhões de "conteúdos" por dia, entre links, comentários, vídeos, fotos. 

Na rotina da exposição virtual, Viviane tem muita companhia. Pesquisa da consultoria eMarketer que, até o fim do ano, um terço dos usuários de latino-americanos do Facebook já será de brasileiros. A quantidade corresponde a 79% dos internautas do país — 78,3 milhões de pessoas. Um número ascendente: em 2014, saltará ára 88,3 milhões, com 82% detentores de perfis digitais, e, em 2017, para 110 milhões, com 89,2% de cadastros nas plataformas de interação.

Exposição infantil merece atenção especial

Lyra ressalva que a superexposição, embora seja considera uma estratégia marketing para muitos, não é uma regra. O estudante de Engenharia Lucas Werneck se diz resistente às novas mídias, com a rede social de fotografias Instagram. "As pessoas põem fotos de família, da sua rotina, onde estudam, o que comem e quem amam: fatos muitos particulares, que não interessam ao público", argumenta. Ele teme, principalmente, a devassa sobre menores de idade:

— As crianças acabam se expondo e sendo expostas na rede, o que é um grande problema, porque ainda não têm discernimento para se resguardarem dos males da internet.

Embora a exposição dos pequenos implique uma atenção especial de pais, professores, autoridades, outro grupo cuja devassa na rede demanda uma reflexão mais acurada é o dos famosos. Especialmente quanto à publicação quase compulsória de imagens e informações sem autorização. na opinião de Edgar Lyra, o argumento de que a história das celebridades ou dos artistas mais conhecidos seja patrimônio público escapa para a retórica. "A vida de Roberto Carlos, por exemplo, é importante para entendermos os anos 1960 no Brasil, mas as suas aventuras amorosas, cabe a discussão", exemplifica. 

— Ainda há o argumento menos nobre, que classifica a devassa das celebridades como o preço a se pagar por ter sucesso. Os paparazzi, da mesma forma, utilizaram lentes potentes para capturar, por exemplo, o abraço da Princesa Diana e Dodi Al Fayed, seu possível amante — lembra o professor.

Nem só as celebridades, claro, sofrem com o assédio e a divulgação, à revelia, de intimidades no mundo virtual. Da publicação de vídeos à criação de perfis falsos em redes sociais, plantados com boas e más intenções, a invasão à privacidade ganha novas formas. A estudante Patrícia Moreira, de 19 anos, lamenta a burocracia para exclusão dos fakes, como são chamados os perfis falsos.

— Chega uma hora em que não há mais o que fazer. Para apagar o fake, precisa de certo números de denúncias. Acaba sendo mais fácil criar uma página do que excluir alguém que se passa por você. Torna-se um ciclo — diz a jovem, que, ironicamente, teve sua conta verdadeira no Facebook bloqueada por engano.

Neutralidade: entrave nas discussões do Marco Civil 

Uma das esperanças brasileiras contra a invasão de privacidade na rede é o Marco Civil da Internet, próximo de ser apreciado pelos parlamentares. Apresentado em 2011, com o objetivo de criar uma “Constituição” para a internet, o projeto ganhou força graças ao episódio de espionagem americana a sistemas brasileiros. O relator, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), explica que a iniciativa determina direitos, deveres, responsabilidades no uso a internet. Busca delinear alguns aspectos cibernéticos não abordados pela Carta Magna brasileira, como a privacidade dos internautas e o armazenamento de seus dados, o princípio da neutralidade — que esbarra na pretensão de negócios das operadores de teloefonia — e o fim do marketing dirigido. 

Um dos pontos polêmicos do Marco Civil, a neutralidade representa a igualdade de direitos de acesso à informação. Resguardá-la, argumentam os defensores do projeto, é essencial para evitar que a internet adquira um modelo de consumo próximo ao da TV paga, em que o contratante tem disponível só os canais assinalados para o seu plano.

— Sem a neutraliadde, a internet pode ser fatiada e, além de pagarmos pela velocidade de conexão, pagaríamos também pelos tipos de conteúdo a serem acessados na rede. Seriam oferecidos planos apenas com correio eletrônico e outros com a opção de ver vídeos, por exemplo. A internet deixaria de ser livre e se tornaria uma grande TV a cabo, criando uma apartheid social, ao criar internautas de primeira e segunda classe — alerta Pedro Ekman, coordenador do projeto Intervozes, que apóia o Marco Civil – O que está em jogo é o futuro de um meio de comunicação democrático ou controlado por oligopólios mundiais.

Ekman: "Vamos garantir direitos civis ou negócios?"

A inclusão do Marco Civil na legislação brasileira consolida normas específicas para o mundo virtual. Para Ekman, a oportunidade de avançar em relação aos direitos civis não deve ser desperdiçada em função de interesses econômicos e governamentais:

 — Não há legislação específica para a internet. O projeto é uma lei pioneira, e o mundo inteiro está de olho para o modo como vamos tratar o assunto. Estão atentos para saber se vamos garantir direitos civis ou desenhar regras que atendam os modelos de negócio das corporações.

O conselheiro do Comitê Gestor da Internet (CGI) Demi Getschko reconhece que pressões econômicas estejam atrasando a votação do Marco Civil e mas considera difusa a oposição ao projeto: 

— Quando se discute o assunto Marco Civil, todos são, teoricamente, a favor da causa, com algumas pequenas discordâncias. Eu diria que a oposição ao projeto é difusa, nunca está claramente consolidada.

Ainda em relação ao Marco Civil, uma das principais preocupações remete ao armazenamento de dados. O texto inicial foi alterado para assegurar que tais informações ficassem guardadas dentro do Brasil. Apesar disso, o especialista em investigação de crimes cibernéticos Higor Jorge receia que a norma tenha brechas:

— Um artigo trata da obrigação do provedor (OiGVTNET) de armazenar informações, mas, para os provedores de acesso a serviços (FacebookHotmailTwitter etc.), esse compromisso não existe — compara.

Leis devem ser ajustadas, propõe especialista em segurança cibernética

Por outro lado, Higor Jorge acredita que as atuais leis cobrem o universo digital. Deveriam, contudo, ser adaptadas:

— Se avaliarmos a existência de normas que descrevem condutas criminosas praticadas via computador, posso dizer que boa dos comportamentos que causam prejuízos e transtornos já é considerada crime. Essas normas, porém, devem ser adaptadas. Por exemplo: nem se comparam os efeitos de uma ofensa moral proferida verbalmente para um grupo de cinco pessoas e da mesma ofensa divulgada em uma rede social, com centenas de “curtidas” e “compartilhamentos”. Com certeza, os efeitos seriam ainda maiores. Por isso, é necessária uma legislação que aumente a pena para tais delitos — propõe o especialista em crimes cibernéticos.

Instalado na rotina contemporânea como instrumento de afirmação social, o compartilhamento contumaz de imagens pessoais na rede desvirtuou-se no fenômeno conhecido como pornografia da vingança (revenge porn, em inglês). Assim são chamados os casos em que, graças à velocidade e à viralidade da internet, disseminam-se fotos ou vídeos íntimos plantados para prejudicar a reputação do desafeto amoroso. Perversidades assim multiplicam-se no Brasil e no mundo. Para coibi-los, avaliam os especialistas, são necessários aprimoramentos legais e éticos.

Criada no ano passado, a Lei 12.737/2012, mais conhecida como Lei Carolina Dieckmann, é considerada um avanço ainda insuficiente para conter os assaltos à privacidade. A iniciativa a pune falsificação de documentos (pena de um a cinco anos); a interrupção ou perturbação de serviço de utilidade pública (um a três anos) e a invasão "de dispositivo informático alheio, mediante a violação indevida de mecanismo se segurança" (três meses a um ano).

A lei remonta à invasão do computador pessoal de Carolina. Os hackers apropriaram-se de fotos íntimas, divulgadas na rede. A atriz, que chegou a extorquida, prestou queixa na Delegacia de Repressão Contra Crimes de Internet e a quadrilha acabou presa. 

Com a maior parte das vítimas nesses casos é mulher (veja o box, no fim do texto, sobre outros episódios de invasão à privacidade), o deputado João Arruda (PMDB/PR) encaminhou uma proposta ao Congresso Nacional que estende a aplicação da Maria da Penha (11340/06) a cibernéticos. Até o momento, a projeto ainda não foi votado.

Vigilância do Estado também ameaça privacidade, observam analistas 

A discussão não se limita à sociedade civil. Programas de espionagem como os revelados pelo ex-analista da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA) Edward Snowden trazem à tona o monitoramento "estratégico" pelo Estado das forças políticas e até de cidadãos. A privacidade estaria, portanto, ameaçada em nome da segurança nacional.

Segundo reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, a própria Agência Brasileira de Inteligência (Abin) monta uma rede para monitorar a internet. O documento de resposta do Gabinete de Segurança Institucional a Presidência da República (GSI) esclarece que a Abin faz pesquisas em fontes abertas, incluindo mídias sociais, para "eventuais subsídios" aos seus trabalhos.

Desde que Julian Assange criou o Wikileaks, em 2006, as preocupações de governantes e reguladores com a disseminação de material sigiloso tornou-se evidente. Por outro lado, como vazou o ex-analista da NSA, os princípios de preservação de dados eram deturpados com a vigilância de reuniões, telefones celulares e documentos até de aliados. O professor Luiz Fernando Pereira, do Departamento de Ciências Sociais da PUC-Rio, considera legítimos os esforços para a segurança nacional, que fazem parte dos valores "importantíssimos" da alçada estatal, mas pondera: ainda assim, o público é parte dessa construção: 

— É uma questão complexa. O Estado é um artefato construído pelo homem. Com o aprofundamento da democracia, melhor que essas informações fossem tornadas públicas, mas no limite da segurança nacional. O repertório não pode ser muito fechado, porque deixa o cidadão instável, inseguro

Lyra cita o filósofo Michel Foucault para sintetizar a contraposição entre a sociedade de controle — que quer ser vigiada em troca de estabilidade — e a sociedade disciplinar — monitorada sem conhecimento. Uma dualidade que também se reflete no tratamento atribuído aos vazadores de informação: 

— É a velha máxima do Nordeste brasileiro: pau que dá em Chico, dá em Francisco. Mas não é bem assim. Há incoerência quando se declara caça a Bradley Manning, Edward Snowden, Glenn Greenwald, Julian Assange, e, ao mesmo tempo, espionam-se empresas e chefes de Estado do mundo. Quando são eles que praticam, é “realpolitik”. Quando são os outros, é terrorismo. 

O termo "realpolitik" (política realista, numa tradução simples) foi aplicado pela primeira vez por Otto von Bismarck, na busca por um equilíbrio diplomático e pacífico entre os impérios europeus. Designa a política externa fundada no cálculo de forças e de interesse nacional. Uma iniciativa, para Lyra, "muito ruim no efeito de formação da opinião do público". 

— Tenho ouvido muito o argumento da realpolitik, de que o mundo é assim mesmo, nada adiantaria, um conformismo nesse sentido. Mas, se é normal, se é comum invadir, acaba valendo a lei do mais técnico. Vale o mais capaz de achar falha no sistema. O Brasil tem que se proteger, porque eles não pararão de espionar.

Amorim: "A cibernética é uma nova dimensão da guerra"

 Júlia Cople Em Aula Magna na PUC-Rio, o ministro da Defesa, Celso Amorim (foto), discursou sobre a linha tênue entre monitoramento de dados e guerra cibernética. A cibernética, inclusive, é uma das três áreas prioritárias da agenda internacional brasileira (junto da espacial e da nuclear), embora o governo destine apenas um quarto do que a Inglaterra investe no setor. No ano passado, dos R$ 111 milhões disponíveis para a pasta, apenas R$ 34,4 milhões foram gastos. Dos R$ 90 milhões dispostos para 2013, só R$ 11,3 milhões foram usados até o meio do ano. 

— Nesse vasto espaço sem fronteiras, o ciberespaço, temos uma nova tendência de desestabilização presente no contexto internacional. A cibernética é uma nova dimensão da guerra, que tem como arma a informação. O argumento para monitoramento de dados, a luta contra o terrorismo, é descabido A segurança, portanto, não depende só de tanques e canhões. É uma guerra que emprega equipamentos de alta geração e o Brasil só será seguro quando produzir tecnologia nacional — afirmou Amorim. 

Apesar das iniciativas do governo brasileiro, Lyra observa o declínio da fórmula de Estado-nação. Para sustentar a tese, ele compara o Produto Interno Bruto (soma de todas as riquezas produzidas) da Bélgica com a receita da Walmart e da Shell e reforça o grande papel vigente do privado no público: 

— Há grande poder de corporação: as pessoas não se elegem sem benção delas e são pressionadas durante o mandato. Há Estado purinho? É uma abstração hoje. Ao Estado, se legítimo, talvez coubesse a regulação da internet, das redes sociais e da informação de uma maneira geral. Hoje a instituição está sob forte suspeita. O caso Amarildo é uma fratura exposta. Gera desconfiança.

 

Quando a privacidade se torna efêmera

Brasil-EUA: Em julho deste ano, o jornal O Globo denunciou um esquema de espionagem da  da Agência Nacional de Seguerança dos Estados Unidos (NSA), que envolvia diversos países, como Brasil China, Rússia, Irã e Paquistão. Segundo dados vazados pelo ex-técnico da NSA Edward Snowden, o governo americana coletava hábitos de navegação na internet. O fato desencadeou uma crise diplomática entre os países.

Alemanha-EUA: No mês seguinte, a revista alemã Der Spiegel denunciou que a União Européia tinha sido alvo de espionagem pela mesma NSA. Até o telefone da chanceler Angela Merkel teria sido grampeado, segundo documentos fornecidos por Snowden. No início do mês, Brasil e Alemanha apresentaram uma proposta à Organização das Nações Unidas (ONU) para garantir o “direito à privacidade” nos meios digitais.

Papa-EUA: Nem o papa escapou. Segundo a revista Panorama, o Vaticana foi vigiado pelos Estados Unidos, possivelmente até durante o conclave que escoheu o Papa Francisco. De acordo com a publicação, o nome do cardeal Jorge Mario Bergoglio já havia aparecido em documentos vazados no Wikileaks. A NSA negou as acusações. O porta-voz do Vaticano afirmou desconhecer a possível espionagem. 

Caso Fran: Pela rede de mensagens instantâneas Whatsapp, circulou no mês passado um vídeo de Francyelle Pires, de 19 anos, em cenas íntimas com o ex-namorado. Em princípio, seria um típico caso do fenômeno conhecido como pornografia da vingança. Acusado do vazamento, Sérgio Alves negou a autoria e a divulgação do material. O abuso está sendo investigado pela Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (Deam) de Goiânia, por falta de uma delegacia própria para em crimes cibernéticos.

Daniella Cicarelli: Em 2006, circulou um vídeo na rede da modelo tendo relações sexuais com seu namorado, Renato Malzoni, numa praia na Espanha. Cicarelli perdeu as ações movidas na Justiça, sob alegação de que a praia é um lugar público e que os envolvidos não demonstraram nenhum constrangimento durante o ato.

Scarlett Johansson: A atriz americana teve fotos nuas divulgadas na rede, em setembro de 2011. Um mês depois, Christopher Chaney foi preso, acusado de ser o divulgador das imagens, que estavam no telefone da atriz. Além de Johansson, Chaney também havia disseminado fotos da também atriz Mila Kunis e da cantora Christina Aguilera, entre outros. No ano passado, ele foi condenado a dez anos de prisão.