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Rio de Janeiro, 25 de abril de 2024


Economia

Mercado de franquias atrai investidores de primeira viagem

Jana Sampaio - aplicativo - Do Portal

25/09/2013

Foto: Renato Bastos

Atraídos pelo sonho do negócio próprio e pelos números sedutores do mercado de franquias no país, jovens mergulham de cabeça num setor que, só em 2012, faturou R$ 103 bilhões e gerou mais de 940 mil postos de trabalhos diretos. Para boa parte da qualidade crescente de empreendedores entre 20 e 35 anos – que saltou 21% nos últimos dois anos –, o negócio representa um ponto de partida rumo à independência financeira. Empresários como o ex-DJ e produtor de eventos Renato Bastos, dono da primeira franquia do restaurante Verdano, têm mudado o perfil do investidor e dinamizado o segmento, observa a gerente de inovação e soluções do Sebrae-RJ, Jaqueline Garcia. 

Enquanto essa efervescência embala as expectativas da Rio Franchise Business, uma das principais feiras do gênero, aberta hoje no Riocentro, zona oeste da capital fluminense, especialistas alertam sobre as armadilhas do casamento entre empolgação, não raramente sinônimo de precipitação, e falta de experiência. Lembram que, para aproveitar a maré favorável do setor, são necessários cuidados como detalhada pesquisa de mercado, qualificação profissional, planejamento ficanceiro, conhecimento da área escolhida e um contato estreito com o franqueador. 

O avanço da área, que se mantém relativamente imune à desaceleração econômica, vem atraindo um investidor mais jovem, menos experiente, no entanto mais "informado e exigente", avalia a diretora da Associação Brasileira de Franchising (ABF-RJ) Ana Cristina von Jess. Os últimos 20 anos, diz ela, foram marcados pela parcipação crescente dos jovens: 

– Antes, o candidato a franqueado era alguém que economizou a vida inteira para ter o seu próprio negócio na aposentadoria. O mercado mudou com a chegada de investidores mais jovens, menos experientes, o que colabora para a renovação e evolução do setor. O jovem empreendedor é mais informado e exigente.

Jaqueline considera esse sangue novo um dos principais motivos da guinada no setor:

– A maior participação de um núcleo mais jovem e exigente no mercado de franquias aliado ao amadurecimento do setor foram os responsáveis pela dinamização do franchising no Brasil.

Uma coisa levou à outra, afirmam analistas de mercado. O crescimento seduz o jovem investidor, de qualificação superior, e este ajuda o mercado de franquias a colecionar números invejáveis. Apesar da instabilidade decorrente da crise deflagrada em 2008 e da atrofia da economia brasileira, cuja projeção de crescimento neste ano beira 1%, o ritmo de franchise manteve-se firme. O Brasil é o terceiro no mercado de franquias, atrás só da China e dos Estados Unidos, e abriu quase 1 milhão de postos de trabalho diretos em 2012, um aumento de 12,3% em relação ao ano anterior, estima a Associação Brasileira de Franchising.

O ex-DJ e produtor de eventos Renato Bastos engorda a lista de jovens empreendedores atraídos pelo faturamento do setor. Ao completar 30 anos, ele decidiu diversificar as fontes de remuneração e, por tabela, a rotina profissional. Hoje, aos 32, inclina-se para a franquia do restaurante Verdano, da rede de produtos naturais Mundo Verde, cuja administração ele divide com o pai, incentivador de sua nova carreira.

– Eu queria mudar a área de trabalho e decidi comprar uma franquia. Hoje não consigo conciliar as duas funções, até por falta de tempo. Demorei dois anos até me decidir pela rede e escolhi o ramo de alimentação por me identificar com comida saudável – justifica.

Segundo Bastos, a identificação com a marca e a disponibilidade do franqueado são alguns dos pontos mais importantes a se considerar na "opção por esse ramo":

– Todo candidato a franqueado deve, antes de qualquer coisa, se identificar com o negócio. Não é porque se trata de uma franquia que você não vai precisar gerenciar de perto, ir diariamente à loja. Muitas vezes, tenho que atender no caixa, por exemplo. Se você não gostar da área que escolheu, vai sentir mais dificuldade.

Formado em Relações Internacionais, Péricles de Moraes Neto, 31 anos, é outro calouro na área. Estudava para ingressar no Itamaraty quando começou a pesquisar sobre o mercado de franquias. Decidiu abandonar a carreira diplomática para abrir a primeira loja da Quiznos na Região Sudeste. Hoje, somam-se 29 unidades, em oito estados.

– Durante a faculdade, trabalhei com eventos. Quando me formei, fui para São Paulo trabalhar com comércio exterior, numa área mais logística, da qual eu não gostava tanto. Quando voltei para o Rio, comecei a estudar para ser diplomata, mas aí tive a ideia de abrir uma franquia – conta.

A ideia foi acompanhada de uma das principais recomendações de especialistas em administração de franquias: capacitação. Com o objetivo de melhor se preparar para gerir uma loja de, como diz ele, fast food saudável, Péricles fez cursos intensivos de controle financeiro e ponto de venda oferecidos pela ABF. Entre a decisão de abrir uma franquia e a escolha da marca, levou um ano. 

– Quem abrir uma franquia deve pesquisar o mercado, as oportunidades, e se preparar para administrar o negócio. Deve, por exemplo, ir à feira de franquias da ABF. O evento de São Paulo é o maior da América Latina e reúne centenas de expositores. É uma ótima oportunidade para conhecer um pouco mais sobre o ramo.

Embora reconheçam as limitações impostas pelo modelo de franquia, Péricles e Bastos consideram, no fim das contas, que a escolha é proveitosa. Bastos lamenta só a autonomia restrita: 

– Mesmo o restaurante sendo seu, você não pode fazer alterações básicas sem consulta prévia à franqueadora. Apesar disso, o formato, pelo menos para mim, vem dando certo. Há um suporte importante, como um manual de como fazer o negócio funcionar, buscando os melhores fornecedores –avalia Bastos.

Apesar da oxigenação no mercado de franquias promovida pelo ingresso crescente de jovens, o ex-presidente da ABF-RJ e professor de varejo e franquia do MBA da Fundação Getúlio Vargas Daniel Plá ressalva que o perfil predominante do franqueado ainda é "mais maduro", com forte participação de aposentados. Segundo ele, o interesse de jovens não significa investimento efetivo:

– Franqueadoras preferem franqueados mais velhos, pela experiência no mercado de trabalho e melhor adaptação ao modelo – pondera.

Decisões por impulso rondam jovem investidor

A inexperiência é, segundo Jaqueline, a maior inimiga do jovem empreendedor à porta do mercado de franquias. Se, por um lado, ele mostra-se bem informado, exigente e disposto a aprender, por outro, não raramente toma por impulso decisões sobre investimento. 

– Muitas vezes o jovem investidor vê o crescimento da receita de determinado setor e acaba escolhendo o modelo de franquias por gostos pessoais. Por exemplo, uma jovem que investe numa franquia de calçados apenas por gostar de sapatos, mas não entende nada sobre essa área. Isso aumenta as chances de ter dificuldades em manter o negócio. É necessário ter conhecimento de mercado e, para isso, é preciso pesquisar bastante – orienta a gerente de inovação do Sebrae-RJ.

Ainda de acordo com Jaqueline, a disponibilidade dos recursos necessários para a abertura da franquia é insuficiente para uma boa largada. Uma cuidadosa análise de setor é igualmente decisiva:

– Para escolher a franquia ideal, é importante que o recurso necessário para abri-la venha aliado a uma análise concreta sobre o setor em que se pretende investir: calçados, vestuário, alimentos etc. É interessante também considerar os motivos da escolha por franquia, se não foi por modismo, ou seja, por se tratar de um negócio rentável atualmente, como as lojas de cupcakes – exemplifica – É importante avaliar também o perfil do investidor: se é mais empreendedor ou se é mais passivo, para saber se conseguirá lidar com as intempéries de gerenciar uma equipe.

 Divulgação A consultora Ana Cristina, também da ABF-RJ, lembra que a “franquia ideal” não existe, mas há formas de diminuir os riscos dessa escolha:

– É fundamental que o candidato pesquise muito e converse com franqueados jovens, com até duas franquias, e com outros mais experientes, com mais de duas franquias. Ouvir os aspectos positivos e negativos do negócio e pensar sobre a disponibilidade em investir tempo e dinheiro são aspectos preponderantes, que terão consequências diretas no resultado final.

Um equívoco recorrente de jovens empreendedores é supor que o modelo de franquia dispensa envolvimento. Ou está imune a "maiores dificuldades", aponta Ana Cristina. Como em qualquer negócio, o êxito depende, entre outros fatores, de dedicação, qualificação e uma dose de paciência até conquistar o retorno desajado:

– Muitos franqueados iniciam o negócio achando que, por se tratar de um modelo “pronto”, não terão trabalho e obterão retorno rápido e sem esforço. Isso não é verdade. É importantíssimo que o franqueado escolha uma área que o agrade e na qual esteja disposto a trabalhar na linha de frente.

Planejamento financeiro e conhecimento da área escolhida reduzem risco de fracasso

Apesar da expansão do setor, indicada no volume crescente de novos investidores, os riscos se equivalem aos de um negócio iniciado do zero, alertam analistas. O índice de fracasso, no entanto, vem caindo: em 2003, metade das empresas do gênero fechavam depois dos dois primeiros anos; hoje, esse número recuou para 20%. Recuariam mais se os franqueados de primeira viagem conhcessem a fundo a área escolhida, afirma Ana Cristina:

– Para aumentar as chances de se ter um negócio bem-sucedido, não basta investir bem.É preciso que o franqueado entenda a área escolhida e participe do negócio – reforça.

Jaqueline acrescenta que o planejamento financeiro também se revela imprescindível ao sucesso da franquia:

– Um dos erros do jovem empreendedor é não fazer as contas antes de abrir a franquia e investir todo o recurso na abertura da unidade. É necessário que haja um fundo extra no capital de giro, de 10% a 15%, até que o negócio comece a se pagar – ensina – Nesse fundo, deverão constar os gastos com a abertura e o aluguel da loja, o pagamento dos funcionários e os custos com o fornecedor. Também é preciso considerar a rentabilidade e lucratividade do negócio. Rentabilidade é o que entra no bolso do investidor e lucratividade é o valor total que a empresa fatura, sem calcular o reinvestimento no negócio.

“Setor de serviços é uma opção de menor investimento”, observa consultora

Uma parcela expressiva dos jovens empreendedores no ramo concentra-se nas microfranquias, um dos segmentos que mais crescem. Com investimentos de até R$ 25 mil, atraem quem dispõem de menos recursos, nem pretende contrair empréstimos para abrir o próprio negócio. No ano passado, o nicho das microfranquias avançou 22% e faturou R$ 4,5 bilhões. Daniel Plá (foto) observa, contudo, que negócios de baixo custo correm mais risco "na roda-gigante da competitividade":

 Divulgação – Quanto mais barata é a franquia, mais flexível é a barreira de entrada de novos investidores no setor. Ou seja, quanto menor o custo de investimento inicial, maior o numero de investidores interessados no segmento. Essa competitividade pode comprometer o retorno do investimento do franqueado – argumenta.

As recomendações para quem deseja investir nesse tipo de franquia são as mesmas para as que requerem maior investimento, como pesquisar sobre o setor de interesse. A internet pode ser uma boa aliada, indica Ana Cristina:

– O jovem possui uma ferramenta fundamental: a internet facilita o acesso à informação e ajuda na escolha da franquia. Hoje, o franqueado não precisa de um alto capital de giro para investir. O setor de serviços, por exemplo, requer investimento muito baixo se comparado a outras áreas.

“Relação franqueado-franqueadora é como um casamento”, compara especialista

A felicidade do negócio também depende da relação com a franqueadora. Segundo Bastos, trata-se de um aspecto fundamental para "a sociedade dar certo":

– É muito importante que a franqueadora ofereça suporte ao franqueado, especialmente na escolha do ponto comercial, que deve combinar preço e proximidade ao público-alvo. Conversar com outros franqueados da marca é um passo essencial para saber se estão satisfeitos e se a franqueadora cumpre o combinado. 

Ana Cristina compara essa relação a um casamento: “É necessário que os dois se comprometam a fazer o negócio dar certo”. Capaz, como dizem, até de sobreviver à distância. Péricles aponta o treinamento oferecido pela franqueadora e as visitas periódicas à loja como soluções para "manter a relação benéfica aos dois lados":

– A franqueadora ofereceu treinamento de três semanas à equipe, o que nos ajudou a compreender a logística da loja. Claro que, se estivessem alocados no Rio, seria melhor, mas isso não chega a ser um problema.

Analistas: nova Lei de Franquias tende a deixar setor mais seguro 

A atual Lei de Franquias, que completa 20 anos em 2014, pode sofrer alterações, caso o Projeto de Lei n° 4319/98 seja aprovado. O texto, em análise na Câmara dos Deputados, prevê que a franqueadora tenha, no mínimo, um ano de funcionamento antes de iniciar o sistema de franquia. Para Jaqueline, a medida tornará o setor mais seguro, pois diminui o risco de golpes feitos por franqueadoras inexistentes ou negligentes às obrigações estabelecidas em contrato:

– O projeto também protege a franqueadora, pois há casos em que o franqueado instala uma franquia e depois abre outra no mesmo setor, utilizando o que foi aprendido e prejudicando a franqueadora.

Ana Cristina considera que a nova lei tende a acelerar os processos movidos por uma das partes da sociedade. Hoje, sem uma regulação mais abrangente do setor, é preciso recorrer à legislação civil para suprir as lacunas não contempladas pela lei especial.

– A lei em vigor é bastante sucinta e prevê uma série de obrigações para os franqueadores, especialmente no processo inicial da aquisição da franquia, quanto à transparência das informações fornecidas ao candidato. No entanto, existem nuances da relação franqueador-franqueado que são características deste tipo de relação e que podem ter uma melhor abordagem do ponto de vista legal – argumenta.

O mercado de franquia em números

O faturamento das 2.426 marcas de franquias brasileiras atingiu R$ 103,3 bilhões no ano passado. Setor gerou cerca de 940 mil postos de trabalho diretos e projeta crescimento de 16% em 2013. 

- R$ 103 bilhões de faturamento (16,2% de crescimento). 
- 2.416 redes (19,4% de aumento). 
- Mais 104.543 mil unidades franqueadas (12,29% de aumento). 
- Mais 941 mil postos de trabalho diretos (aumento de 12,3%). 
- O franchising representou, em 2012, a 2,34% do PIB brasileiro.
- Setores que mais cresceram: 
Hotelaria e turismo: 97,8%;
Limpeza e conservação: 44,5%;
Informática e eletrônicos - 32,5%.

- Setores com pior desempenho:
Fotos, gráficas e sinalização: 1,6%;
Negócios, serviços e outros varejos: 2,6%;
Educação e treinamento: 10,3%.

Microfranquias:

- R$ 4,5 bilhões de faturamento (22% de crescimento). 
Redes: 368 (10% de crescimento). 
Unidades: 13.352 (6% de crescimento). 

Projeções de crescimento para 2013:

- Faturamento do setor: 16%.
- Novas redes: 9%.
- Abertura de unidades: 11%.
- Postos de trabalho: 11% 

Fonte: ABF

Dez passos para o jovem investidor

O risco de um novo empreendimento no modelo de franchising é até cinco vezes menor quando comparado a outros tipos de negócios que se iniciam no Brasil, estima a ABF. Ainda assim, é necessário que o candidato a franqueado esteja atento às dificuldades do negócio. O Portal reúne recomendações de especialistas para aumentar as chances de sucesso:

• Pesquise o mercado de franquias e converse com especialistas.

• Escolha o setor que deseja investir (não basta escolher o setor de calçados só porque gosta de sapatos, é preciso entender como aquele negócio funciona).

• Escolha uma marca com a qual se identifique.

• Converse com outros franqueados da rede e procure saber como é a relação com a franqueadora

• Tenha consciência de que o modelo de franquia é estabelecido pela franqueadora. Ou seja, é preciso seguir as regras que determinam um padrão. Não se pode modificá-lo sem aprovação prévia.

• Envolva-se com o negócio: é fundamental que o franqueado esteja disposto a atuar em todas as funções, desde a parte administrativa ao atendimento aos clientes, inclusive, para identificar falhas de gestão.  Quanto maiores a habilidade e a disponibilidade comercial do franqueado, maiores as chances de sucesso.

• Conheça e avalie os riscos. Mesmo tratando-se de um modelo previamente testado, é preciso estar sempre atento e qualificado para resolver os obstáculos no caminho.

• Conheça os direitos e os deveres estabelecidos pela sua franqueadora. Antes da assinatura do contrato, é importante que não reste dúvida.

• Consulte um advogado e conheça a lei de franquias n° 8955/94, que regula o setor.