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Rio de Janeiro, 24 de abril de 2024


Cidade

Caminhos para eleições limpas e transparentes

Tatiana Carvalho - Do Portal

01/10/2008

 Tatiana Carvalho

A controversa liberação de candidatos com “ficha suja” pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em agosto, impõe, entre outros desdobramentos, desafios à abordagem eleitoral nos veículos de comunicação. "O maior deles é mostrar a relação lamentável que existe entre o crime organizado e o processo eleitoral, pois não esperávamos por isso. Falta de estrutura e pedidos de direito de resposta também atrapalham", observou o jornalísta e professor Chico Otávio, em palestra sobre a cobertura jornalística da campanha política, em setembro, no auditório 102K da PUC-Rio.

Organizado por Chico Otávio e pela professora Carla Siqueira, ambos do Departamento de Comunicação, o debate reuniu os cientistas políticos Alessandra Aldé e Paulo D’Ávila e o procurador eleitoral do Rio de Janeiro Rogério Nascimento. Responsável pelo caso Carminha Jerominho, vereadora presa por suspeita de integrar organização paramilitar no Rio, Rogério argumentou que o alvo das análises deve ser o comportamento do candidato, e não propriamente a "ficha":

– Não se deve julgar o político por sua ficha, mas pelo seu comportamento. A Justiça Eleitoral deve examinar o passado dos políticos para dizer se a pessoa pode ou não se candidatar. Cabe também a ela resolver outra situação: a dos candidatos que quebram as regras no meio do jogo. O problema é decidir de forma rápida e exemplar, pois a Justiça tem seu próprio tempo – lembrou o procurador, ao ser indagado por estudantes sobre as ações jurídicas em casos do gênero.

Acusada de ter a campanha financiada por uma das principais milícias do estado, Carmen Glória Ginâncio Guimarães, a Carminha Jerominho, está presa na penitenciária federal de Catanduvas, no Paraná, desde agosto. Na segunda-feira, 29 de setembro, o Tribunal Regional Eleitoral do Rio anulou filiação ao PTdoB, revogando assim o direito de Carminha a concorrer nas eleições. No entanto, ela ainda pode recorrer e disputar as urnas enquanto não sair a sentença definitiva.

Para coibir interferências de traficantes e de milícias no processo eleitoral nas favelas cariocas, cerca de 3,5 mil agentes da Marinha e do Exército se revezarão entre 28 comunidades do Rio de Janeiro até o próximo dia 5 de outubro, em princípio. O procurador vê a iniciativa com reservas:

– Uma política de confronto pode trazer conseqüências piores do que a ausência desse tipo de intervenção. Táticas de inteligência seriam melhor, com trabalho policial propriamente dito. Mas a decisão está tomada. Agora, o importante é que essa tropa seja conduzida com responsabilidade e eficiência.

Igualmente importante no processo democrático, a cobertura das eleições pelos jornais foi debatida pelos palestrantes. Segundo Alessandra Aldé, que há 12 anos estuda a participação da imprensa nesta área, por meio do Doxa, Laboratório de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública, houve amadurecimento e valorização da mídia impressa:

– Os cidadãos se baseiam no jornal impresso para escolher em quem vão votar. Eles acreditam que ali é um espaço imparcial, ao contrário do horário eleitoral gratuito. Os candidatos também notaram isso e passaram a valorizar a mídia externa.

Para Chico Otávio, a cobertura eleitoral ainda precisa melhorar. Ele ressaltou, na palestra, a necessidade de focar mais as eleições proporcionais (vereadores e deputados); no desempenho desses políticos e nos interesses por eles contemplados. Sobre a abordagem de escândalos políticos, o repórter do Globo ponderou:

– É preciso ser razoável. Na redação, brincamos: se o candidato passou um cheque sem fundos porque seu pagamento atrasou, tudo bem. Mas se ele passou 140 cheques, isso é informação pública. A gente deve servir de ponte entre o Poder Judiciário e o leitor, mostrar quem esse cara é, para que o eleitor decida se o candidato ainda merece seu voto.

Parte dos esforços para resguardar a transparência e controlar os excessos associa-se às regras do jogo eleitoral. A cada eleição, um conjunto de normas é formulado e reformulado. Neste ano, a maior mudança remete à publicidade na internet. Sob pena de cassação, a propaganda ficou restrita às páginas eletrônicas dos candidatos. Divulgação de vídeos, links patrocinados e blogs estão proibidos.

– Essa mudança precisa ser digerida – ressalvou Rogério – A lei atual passou da medida, está muito rígida – opinou.

Em relação à cobertura da imprensa, o procurador esclareceu que, segundo a lei, os jornais podem ser parciais, "desde que deixem isso claro para o leitor". Carla Siqueira lembrou o compromisso jornalístico com o interesse público e com o equilíbrio deve guiar o trabalho dos repórteres e editores.