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Rio de Janeiro, 27 de julho de 2024


Cultura

Botafogo, passagem para o luxo do século XIX

Alice Sant'Anna - Da sala de aula

25/09/2008

Botafogo é um bairro injustiçado. Hoje, ele leva a fama de servir apenas como passagem, ter a rua mais barulhenta do Rio – a Voluntários da Pátria – e, pior, não ser charmoso. Mesmo assim, nenhum outro lugar da cidade tem o privilégio de preservar duas preciosidades do país: a Enseada de Botafogo e a vista do Cristo Redentor de frente. Mas no período em que viveu o escritor Machado de Assis, o bairro era um dos endereços mais sofisticados da então capital.

Os moradores e freqüentadores mais atentos podem observar que Botafogo conserva requintes do século XIX. Naquela época, a cidade começou a se libertar do colo do Centro, onde tudo se concentrava, e passou a se interessar pelo litoral. A esposa de Dom João VI, Carlota Joaquina, escolheu a praia de Botafogo para instalar a sua mansão. Até aquele momento, o bairro não passava de uma área rural deserta. Não demorou para que famílias cariocas endinheiradas construíssem na região chácaras e casarões suntuosos.

Botafogo teve o seu auge no século XIX. Foi quando a São Clemente se tornou a rua mais nobre do Rio e a São Joaquim da Lagoa – atual Voluntários da Pátria – virou um ponto comercial importante da cidade. A região aparece constantemente na obra machadiana. Como exemplo, temos os romances "Esaú e Jacó" e "Quincas Borba", bem como um dos contos mais conhecidos do escritor, "A Cartomante".

De acordo com coordenador do núcleo de pós-graduação do departamento de História da PUC-Rio, Antônio Edmilson Rodrigues, a relação dos personagens com o espaço é um conceito-chave nos livros de Machado.

- Ao falar em Botafogo, Machado indica não a paisagem, mas a vida e as relações privadas que marcaram um bairro aristocrático. Os moradores buscavam no isolamento a tranqüilidade bucólica de outro tempo – esclarece Rodrigues.

Tranqüilidade talvez não seja o traço mais marcante do bairro hoje. Construções como a Casa de Rui Barbosa, o antigo Colégio Jacobina e o enorme casarão da empresa Forever Living Products fazem parte da memória do bairro, que convive com edifícios modernos e menos elegantes. Esta se tornou uma das características de Botafogo: o ar heterogêneo.

As referências urbanas abrangem o Cinema Estação, os hospitais Casa de Saúde São José e o Pró-Cardíaco, a linha 1 do Metrô, o Palácio da Cidade, o Canecão, o shopping Rio Sul, o Museu Villa-Lobos, os colégios Santo Inácio e Andrews, o cemitério São João Batista e por aí vai. A diversidade é tanta que há até uma árvore tombada na Rua Marquês de Olinda, um pau-ferro plantado em 1867.

Jornalista e botafoguense, Cláudio Henrique, 42 anos, é um defensor ferrenho do bairro. Ele faz uma espécie de defesa da área no livro "Botafogo", da coleção Cantos do Rio, patrocinada pela Prefeitura.

- O livro conta a história do bairro num discurso de exagero, cheio de hipérboles. Botafogo virou o “patinho feio” da cidade, mas é o lugar mais importante do Rio, por ser o elo entre a zona sul e a cidade antiga – conclui.

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