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Rio de Janeiro, 27 de julho de 2024


Mundo

Maduro herda eleitores e economia combalida

João Pedroso de Campos - Do Portal

15/04/2013

 Arte: Nicolau Galvão

A primeira eleição presidencial na Venezuela depois dos 14 anos de Hugo Chávez no poder confirmou a vitória do seu herdeiro político, Nicolás Maduro, do Partido Socialista Unido (PSUV). As urnas apontaram, todavia, que o chavismo e o país vizinho encaram novos desafios, ou velhos desafios num ambiente novo: uma terra dividida. Maduro, que assumira a presidência depois da morte de Chávez, há 40 dias, foi eleito para o mandato de pelo menos seis anos com uma vitória apertada: 50,75% dos votos, apenas 300 mil a mais em relação ao governador do estado de Miranda, Henrique Capriles, do Partido Primeira Justiça.

A pequena diferença expõe a polarização num país onde o populismo produziu novas demandas sociais, que, segundo analistas, começam a pôr em xeque o assistencialismo chavista. O recado das urnas deve fazer o presidente incorporar à retórica bolivariana certo equilíbrio e disponibilidade em dialogar com a oposição. Mais do que manter ou não o chavismo, o objetivo principal, ainda de acordo com os especialistas, deve ser garantir crescimento com qualidade depois das expectativas criadas pelo tom distributivo do ex-presidente e amenizar as dificuldades econômicas. A inflação em março foi estimada em 25% e a produção de petróleo caiu 21% desde 1998, quando Chávez chegou ao poder.

Para o professor do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio (IRI) Pedro Cunca Bocayúva (foto) o maior desafio a Maduro é lidar com uma sociedade que superou em parte a pobreza – de 53,9%, em 2004, a 31,9%, em 2011, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) – mas manteve a desigualdade que sustenta o alto índice de criminalidade, outro problema da Venezuela, e gera interesses variados na população. Cunca Bocayúva ilustra a recente variedade de interesses no país a partir de um exemplo brasileiro.

 Arquivo Portal PUC-Rio – A dificuldade é como governar com a polarização e depois de um ciclo de crescimento que gerou expectativas. O ciclo político e as contradições desse sistema chegaram ao seu máximo com a distribuição de Chávez. A Venezuela mudou com o desenvolvimento de novos grupos sociais para o consumo, e isso aguçou a desigualdade. E da desigualdade vem interesses diferentes. Não se pode colocar no mesmo bloco, no Brasil, por exemplo, quem é do ProUni e quem recebe o Bolsa Família.

Maduro afirmou, na semana passada, que dificilmente a oposição chegará ao poder na Venezuela no século 21. O primeiro pleito sem Hugo Chávez na cédula, contudo, mostrou um país mais polarizado do que há seis meses, quando Chávez venceu Capriles com uma diferença de 12% dos votos, e uma crescente valorização do discurso mais ao centro da oposição. Segundo Cunca Bocayúva, a evolução do discurso da oposição, que não reconheceu o resultado das eleições de ontem, também passa por um populismo adequado à democracia da Venezuela. O especialista pondera que Maduro deve levar em conta este crescimento da oposição e abrir-se ao diálogo, especialmente depois da tomada de Lula como exemplo de governança: “Isso significa fazer reformas distributivas dentro do sistema liberal capitalista”.

– A oposição mudou, tentou sair de um perfil oligárquico, golpista, para um mais reformista. Eu acho que esse tom equivale à política venezuelana. Isso faz parte do jogo. A Venezuela não joga só para dentro, ela joga para fora. A imprensa pró-capital estará do lado de Capriles. Usar esse discurso mostra ao mundo como o país é decisivo, como o discurso venezuelano é energizado. Capriles é obrigado a igualar o machismo e o tom: a oposição é populista também. É uma linguagem. Maduro deve manter a retórica mobilizadora e sustentar políticas distributivas que respondam à complexidade. O diálogo com a oposição precisa melhorar.

O professor do Departamento de História da PUC-Rio Maurício Parada (foto) observa que outros líderes e discursos dentro do próprio chavismo, como militares e sindicalistas, devem de algum modo concorrer com o presidente eleito. Como o voto na Venezuela é facultativo, Parada avalia que a ausência de Chávez afastou seus eleitores e esvaziou a votação de Nicolás Maduro. O fator Chávez, contudo, não será determinante nas próximas eleições, segundo o professor a grande preocupação do PSUV.Arquivo Portal

– Os desafios econômicos são os maiores. Mas os desafios políticos não são secundários. Há uma prioridade econômica, mas política e economia não estão dissociadas. A vitória apertada significa que a gestão não vai ser tão simples porque a população já tem uma posição mais crítica. Os chavistas não conseguiram evitar a evasão de quem vota com o governo. A questão fundamental, e que deve estar preocupando Maduro e os chavistas, é a próxima eleição. Agora a vitória seria certa pelo fator Chávez. Maduro deve inventar um personagem político forte pra si.