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Rio de Janeiro, 18 de abril de 2024


País

Tons gerenciais esboçam desenho político para 2014

João Pedroso de Campos - Do Portal

18/12/2012

 Arte: Carlos Serra

Aberta a temporada de balanço e projeções de ano-novo, o cenário político promete um 2013 animado. Não só pelos desdobramentos das urnas municipais e os ensaios preliminares para 2014, mas também pelas derivações de resultados judiciais emblemáticos, como os relativos ao julgamento do mensalão e a decisão sobre a nova divisão dos royalties do petróleo – que, depois do veto parcial da presidente Dilma Rousseff, também deve ganhar o Supremo Tribunal Federal (veja quadro abaixo). Ingredientes que esquentam o tabuleiro político e talvez o deixem até imprevisível, do que a participação da Família Scolari parte 2 na Copa das Confederações, em junho, principal laboratório para o nosso Mundial. 

As eleições municipais fragmentaram o poder nas prefeituras das capitais e principais cidades brasileiras entre onze partidos. A oposição nacional, liderada por PSDB e DEM, fez 1.103 prefeitos, 22% a menos do que em 2008, mas pode considerar a mudança no perfil de eleitorado – deslocando-se do Centro-Sul para o Norte e Nordeste – como uma vitória frente à derrota em São Paulo. Principais bases do governo da presidente Dilma Rousseff, o PT levou a prefeitura de São Paulo, maior colégio eleitoral entre os municípios, e governará 636 cidades (cerca de 37 milhões de eleitores), e o PMDB elegeu pouco mais de mil prefeitos. Entre as 26 capitais, o PSB somou cinco eleitos e ganhou projeção nacional. Fortalecido, o partido do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, já movimenta o xadrez das alianças rumo a 2014. Especialistas da PUC-Rio ressalvam, no entanto, que as votações municipais – multipartidárias e mais voláteis – não devem ser consideradas um parâmetro fiel para as presidenciais, polarizadas entre PT e PSDB, as duas principais legendas de São Paulo.

Na avaliação do cientista político Cesar Romero Jacob, diretor do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio, o palanque paulista condiciona e polariza o jogo político no Brasil porque o estado responde por um terço do Produto Interno Bruto (PIB), a soma das riquezas do país, e por um quarto do eleitorado nacional, além de concentrar as elites empresarial e sindical brasileiras, que se alinham a PSDB e PT, respectivamente. "É um equívoco projetar os resultados das eleições municipais no pleito presidencial", esclarece o especialista, autor, ao lado de Dora Rodrigues Hees, Philippe Waniez e Violette Brustlein, de A geografia do voto nas eleições para prefeito e presidente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo: 1996-2010 (Editoras PUC-Rio e Vozes, 2012, 195 pgs.).

Romero Jacob reforça o time de analistas para os quais a oposição dos tucanos tem se complicado com a pequena representatividade no Congresso, pouco mais de 20% das cadeiras, e as medidas de bem-estar social consolidadas ou anunciadas pela presidente Dilma, como as propostas para a diminuição de tarifas no setor elétrico e o corte de impostos na cesta básica. Outros deveres de casa para os oposicionistas, acrescenta o cientista político, são a busca por unidade entre paulistas e mineiros em torno da candidatura de Aécio Neves e a renovação do discurso. Já no outro lado a principal missão da presidente em 2013 e 2014 será, ainda de acordo com o pesquisador, conter a sobrecarga na infraestrutura nacional provocada pela inclusão de mais de 30 milhões de brasileiros na nova classe média ao longo dos nove anos do PT no poder:

– Quem pode ser contra diminuição nos preços da comida e da energia? Numa campanha eleitoral, Dilma poderia dizer que o PSDB foi contra uma medida que tornaria a conta de luz mais barata. Mas, por outro, a presidente deve fazer com que a inclusão dos 30 milhões à classe C não deteriore os setores diversos, como aeroportos, telefonia e saúde. Ela tem uma imagem de gestora a zelar – pondera.  

Inclusão social sobrecarrega serviços e pode prejudicar Dilma 

Desde que chegou ao poder, em 2003, o PT procurou dirimir a resistência nas camadas mais populares e despolitizadas, refratárias ao partido até então. Com o Bolsa Família, o presidente Lula, apoiado pela classe média urbana de esquerda e movimentos sociais organizados, aproximou-se desse segmento e ganhou força para as eleições de 2006. No seu segundo mandato, tal eleitorado já não era mais resistente e o presidente tratou de se aproximar do empresariado com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O PT sinalizou que também seria capaz de atender aos interesses empresariais e de proporcionar a ascensão de cerca de 30 milhões de brasileiros à classe média.

O especialista em geopolítica nacional (foto) projeta que os próximos passos do partido – e da presidente Dilma Rousseff – seguirão rumo à classe média conservadora. Buscarão conquistá-la via aspectos gerenciais e valores compatíveis a este setor social que, segundo Cesar Romero, tem encontrado correspondência na figura da presidente, brasileira de classe média, com nível superior de ensino e comportamento mais comedido e menos polêmico do que o de Lula.

 – Dilma tenta quebrar a resistência ao PT que existe na classe média conservadora. Ela não teria 88% de popularidade só com a camada popular. É claro que a presidente seria mais bem aceita pela classe média conservadora, porque ela é de classe média e tem formação universitária, ao contrário do Lula, sempre rejeitado pela classe média urbana escolarizada, a não ser a de esquerda, por não ter formação universitária. Sem perder as classes D e E, e até ampliando o apoio com o projeto Brasil Sem Miséria, ela aposta num comportamento menos polêmico que o do ex-presidente Lula. Dilma é a candidata do PT. Aparentemente, não está no palanque. Mas está ­– avalia Romero Jacob.

O também cientista político da PUC-Rio João Roberto Lopes Pinto, coordenador do Instituto Mais Democracia, afirma que a candidatura petista em 2014 está indefinida. Embora reconheça um tom mais político nos últimos discursos de Dilma – em especial, na renegociação das tarifas junto às federações das indústrias de São Paulo e Rio de Janeiro, Fiesp e Firjan, para a diminuição em 20% dos custos do setor aos consumidores e à indústria até 2024 –, ele considera que o principal desafio da presidente, na esteira das ambições para 2014, esteja menos associado a gestão do que a liderança no poder central:

– Setores ligados à mídia buscam um desgaste de Lula. A oposição também preferiria Dilma [como adversária nas eleições de 2014], porque Lula tem habilidades políticas muito maiores – acredita Lopes Pinto – A presidente fez um governo de continuidade e administrou bem, mas fez pouca política. Lula tem se resguardado. Dilma tem procurado deixar a marca dela, como na questão do setor elétrico. Mas há uma fragilidade da presidente enquanto liderança politica. Não é esta a origem da formação dela. Ela tem uma competência reconhecida na área técnica, particularmente no setor de energia.

Já Cesar Romero Jacob aponta como uma das grandes missões do governo, cujo peso pode tornar-se representativo no xadrez eleitoral, a capacidade de gerir a inclusão de milhões de brasileiros na nova classe C. Para ele, os avanços socias não foram acompanhados de avanços estruturais e, mesmo que o país passe relativamente incólume pelas crises externas e o discurso da presidente endureça com bancos, planos de saúde e operadoras de telefonia, a sobrecarga destes setores, somada à recorrência nas falhas, pode respingar na imagem de gestora competente. "A mágica só funciona uma vez", lembra o analista:

– Trinta milhões de pessoas ascenderam à classe C. Trinta milhões passaram a ter um poder de consumo para o qual o país não está preparado estruturalmente. Os aeroportos são um exemplo disso. Para a classe C, as filas que se formam nos aeroportos não são nada comparadas aos dias que antes passavam na estrada. Mas as pessoas que já estavam incluídas no sistema aeroviário ficarão enfurecidas, porque o serviço piorou. O mesmo ocorre com os planos de saúde. A classe C começou a comprar plano de saúde, e eles não estavam preparados para essa demanda. Assim como os aeroportos, os planos de saúde pioraram o seu funcionamento. A telefonia e o IPI reduzido são casos semelhantes – compara.

Ainda que saia com ferimentos leves das crises nos Estados Unidos e na Europa, o Brasil deve crescer 1,5% neste ano, pior taxa entre o grupo das economias emergentes que formam os Brics (Rússia, Índia, China e África do Sul) e segunda pior na América Latina, à frente apenas do Paraguai, segundo projeção do Fundo Monetário Internacional (FMI). As dificuldades econômicas, observa o analista político e professor da PUC-Rio Ricardo Ismael, também podem minar o caminho do governo rumo às eleições de 2014. Especialmente se forem transformadas em munição pela frente oposicionista,  carente de um discurso consistente em meio aos 88% de aprovação com os quais a presidente deve fechar o segundo ano de mandato.

– Apesar da grande receptividade no Congresso, Dilma deve desatar o nó do crescimento. Se começar a se manter com as dificuldades, a oposição ganhará terreno no sentido de propor uma outra alternativa de política econômica – ressalta Ismael.

PSB ganha espaço e torna-se parceiro cobiçado 

O salto do PSB, partido que mais cresceu nas eleições municipais deste ano, também revela-se um fato nada desprezível nas preliminares para a disputa de 2014. O partido comandado pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos, elegeu 130 prefeitos a mais do que em 2008, o maior crescimento absoluto e proporcional entre todas as legendas envolvidas no pleito. A região em que o PSB mais contabilizou prefeituras foi o Nordeste (263), e o estado com mais prefeitos socialistas eleitos foi o Piauí (53). O PSB vai comandar, a partir de 2013, o dobro de eleitores amealhados há quatro anos.

Se tais número aumentam o cacife do partido no tabuleiro político, seria prematuro ou mesmo equivocado deduzir que tenham força para fazer de Eduardo Campos uma terceira via nas eleições presidenciais, afirma Cesar Romero Jacob. De acordo com o cientista político, o pernambucano só teria chance se fosse um dos dois principais candidatos, o que é dificultado pela inexpressividade do PSB em São Paulo. "Quem dará apoio a ele para ser uma segunda via?", argumenta.

Desde a redemocratização, os candidatos que fogem à polarização entre PT e PSDB não mantêm suas candidaturas por mais de uma eleição, mas influenciam a arquitetura de forças dos segundos turnos. Assim observou-se em 1994, com Enéas Carneiro candidato pelo Prona; em 1998, com Ciro Gomes, então no PPS; com Heloísa Helena, candidata pelo PSOL em 2006; e com Marina Silva, pelo PV, em 2010. Segundo Romero Jacob, a terceira via "é sempre para uma eleição, não há sequência". 

– Uma terceira via é difícil porque, além de PT e PSDB, não há partido com base sólida em São Paulo. É muito difícil tirar a diferença nos outros estados depois de ir mal em São Paulo. É possível que Eduardo Campos se lance como candidato. Mas há um calcanhar-de-aquiles no PSB. É claro que Campos teve boa projeção, mas os governos estaduais e prefeituras do PSB precisam do apoio do governo federal. Para ser candidato, ele teria de romper agora as relações, ou pelo menos esfriá-las: não dá para começar a bater na presidente só em 2014 – explica.

 Divulgação Lopes Pinto destaca a imagem positiva deixada por Eduardo Campos nas eleições passadas como chamariz a PT e PSDB, já supostamente interessados numa aliança com o governador de Pernambuco. Apesar do xadrez das candidaturas e alianças estar em aberto, o analista acredita que um alinhamento do PSB ao PSDB seja o mais provável:

– O PSB teve um importante acúmulo de forças e é uma variável importante, porque Eduardo Campos surge como uma liderança estratégica às alianças para 2014. As alianças em cada estado, no contexto das eleições para governador, também vão influenciar bastante o desenho político. O PSD de (Gilberto) Kassab fica como um segundo fiel da balança. Há a possibilidade de o PSB tentar uma candidatura própria no primeiro turno, para consolidar o seu capital político, e depois negociar com o PSDB.

PSDB procura discurso e candidato

Principais partidos da oposição, PSDB e DEM somam apenas 111 dos 513 deputados federais no Congresso, que correspondem a pouco mais de 20% das cadeiras. Quando se observa o número de senadores, a diferença revela-se ainda mais expressiva. A situação reúne 59 deles e a oposição, 22. Ainda que não tenham influência direta sobre o pleito presidencial, as eleições municipais também mostram declínio dos dois principais opositores da base da presidente Dilma Rousseff. Enquanto os tucanos elegeram 81 prefeitos a menos do que em 2008, entre os quais o de São Paulo, os democratas perderam 218 prefeituras. Em meio ao processo de encolhimento da representatividade, a oposição carrega, para Ricardo Ismael, "uma missão difícil, mas não impossível":

– O PSDB tem uma tarefa difícil porque está na oposição e tem uma base pequena no Congresso. O DEM, principal aliado, mais uma vez declinou nessas eleições, apesar das vitórias em Salvador e Aracajú. A maior dificuldade da oposição será encontrar um discurso para enfrentar a Dilma. O PSDB terá que quebrar essa aliança em torno da presidente. Mas isso não é impossível, porque os indicadores econômicos, pelo menos os do fim de 2012, são muito ruins. A tendência é que o poder de barganha do PT diminua.

Para Cesar Romero Jacob, a competitividade de Aécio Neves – suposto favorito a aposta tucana em 2014, depois de ter sido "lançado" pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso – passa pela adesão do PSDB paulista à candidatura. Pesa contra Aécio, lembra o cientista político, o fato de que ele não se empenhou como deveria nas últimas três eleições presidenciais, em que os candidatos do partido, Geraldo Alckmin (2006) e José Serra (2002, 2010), foram derrotados pelo PT. O "bom exemplo" mora ao lado:

– Aécio será um candidato muito competitivo se conseguir que o diretório de São Paulo trabalhe por ele, coisa que o próprio Aécio não fez pelos paulistas nas três eleições passadas. O contrário acontece com o PT. Em 2002 e 2006, o candiadato a vice de Lula era o mineiro José Alencar, o que favoreceu as vitórias do ex-presidente em Minas. Em 2010, Lula lançou Dilma, que é uma mineira radicada no Rio Grande do Sul, dois estados que sempre fizeram parte do jogo político. Como resultado, Dilma ganhou em Minas e no Rio Grande do Sul e perdeu por pouco em São Paulo. Isso é competência política. Nas eleições de 2002, 2006 e 2010, o PSDB nacional perdeu as presidenciais e Aécio ganhou tudo em Minas. O recado dele aos paulistas é que tem de haver um rodízio.

 Mauro Pimentel Ricardo Ismael (foto) observa que o PSDB tem pecado por falta de renovação no discurso, excesso de disputas internas e pela demora para a definição do presidenciável. Assim, avalia o especialista, a opinião pública e os possíveis aliados não têm conseguido decifrar para onde vão os tucanos. Dificuldade que pode ser aplacada, ainda segundo Ismael, com o lançamento precoce de Aécio como candidato oficial.

– Nas últimas duas eleições, mesmo enfrentando adversários fortes, os tucanos passaram muito tempo brigando e só lançaram o candidato no ano da eleição. Isso retarda, para a opinião pública, a ideia de um candidato que una as oposições. E dificulta as alianças, pois os partidos que poderiam dar apoio ficam aguardando a definição do PSDB. Acho inevitável esse lançamento, porque o PSDB tem que encontrar unidade interna, aliados e a contrução de um discurso, uma mensagem que possa colocá-lo como alternativa ao governo Dilma. Por outro lado, lançado tão precocemente, Aécio será vidraça para a imprensa chapa branca ligada ao PT – ressalva.

Se no plano estadual paulista observa-se uma enorme força do PSDB, nas eleições para a prefeitura da capital, o partido não tem se saído tão bem. Os tucanos levaram só uma das últimas sete eleições. O malufismo venceu três eleições, com Maluf, Pitta e Kassab; o PT foi eleito com Erundina, Marta e, a mais recente, com Fernando Haddad. O professor Lopes Pinto reafirma que, a despeito da frágil ligação entre a derrota municipal e as perspectivas estaduais e federais, a recente derrota mostra-se signifcativa para os tucanos. E ele já enxerga perda de espaço do partido no médio prazo:

– Não se pode perder de vista o palanque que é São Paulo. Mas o PSDB continua sendo o partido referência entre opositores, posição que pode ser perdida a médio prazo. É dificil localizar uma nova postura do PSDB. O partido não consegue assumir um discurso renovado e fazer, de fato, oposição, porque a política do governo do PT tem muitos pontos em comum, além dos avanços inegáveis nos crescimentos da renda e dos investimentos. Bater muito na Dilma por causa do crescimento abaixo do esperado pode fazer crescer a [perspectiva de] volta do Lula. Enfraquecer Dilma é fortalecer Lula, enfraquecer Lula é fortalecer Dilma. Não há como desgastar os dois ao mesmo tempo.

No Rio, aliança entre PT e PMDB prepara sucessor

Satisfeito com os dois milhões de votos (65%) que garantiram a vitória de Eduardo Paes no primeiro turno das eleições municipais no Rio, o PMDB já se movimenta para fazer o sucessor de Sérgio Cabral no Palácio da Guanabara. Luiz Fernando Pezão, atual vice-governador, esboça favoritismo numa candidatura apoiada por Dilma e Lula, mas, segundo os especialistas, pode ser ofuscado por Paes caso não consiga a visibilidade e as intenções de voto esperadas pela cúpula peemedebista do Rio. Ancorado na Copa e na Olimpíada, o prefeito descarta a alternativa de deixar o cargo para concorrer à sucessão de Cabral.

O senador petista Lindbergh Farias tem, contudo, combatido a preferência pelos candidatos do PMDB ao governo do estado: "Respeito o Pezão, mas sou candidato de qualquer forma. As pesquisas mostram isso", disparou. No segundo turno do pleito presidencial e estadual de 2006, e no segundo turno municipal de 2008, fez-se um pacto de apoio mútuo entre PT e PMDB. O PT nacional reconhece a hegemonia do grupo de Sérgio Cabral, que por sua vez reconhece o poder do PT nacional. O pacto vem beneficiando os dois, avalia Cesar Romero Jacob. "O PT colhe votos e abre as torneiras dos investimentos federais ao estado do Rio", sintetiza.

O especialista em geopolítica acredita que Pezão deve receber o apoio da aliança PT/PMDB. Ele pondera, entretanto, que, por ter tido um resultado expressivo nas urnas, Eduardo Paes seria o Plano B das forças políticas em torno de Cabral para garantir a continuidade da aliança nos níveis municipal, estadual e federal. Quanto a um possível "efeito Serra", caso Paes abandone a prefeitura para concorrer ao governo, o professor mostra-se cético:

– É provável que o governador renuncie, em algum momento, para o Pezão assumir, ganhar visibilidade e ser testado. Quanto ao Eduardo Paes, talvez não seja vantajoso entrar numa disputa sem garantia de vitória para quem está se preparando para ser o prefeito na Olimpíada. Mas não haveria "efeito Serra", porque o Serra abandonou a prefeitura em dois anos e o Paes abandonaria em seis.

Já Ismael crê no pragmatismo: "Na corrida para o governo do Rio em 2014, o que vai valer são as intenções de voto". Ele considera Eduardo Paes uma sombra a Pezão e, mais que isso, vê o atual prefeito do Rio, auxiliado pela máquina do partido no interior do estado, como mais forte do que o vice-governador:

– Daqui a um tempo, o que vai valer serão as intenções de voto. Se o Pezão fracassar nas pesquisas, sua candidatura poderá ser questionada, porque o partido já tem um candidato forte na capital, o Eduardo Paes. A estrutura do PMDB no interior o levaria a outros municípios. Eu acho que vão tentar o Pezão. Se isso der certo, for viável eleitoralmente, tudo bem. Mas a possibilidade de Paes é grande.

Ismael também analisa a candidatura de Paes sob a ótica do PT:

– A ideia de 2014 é que o PT e o PMDB fiquem juntos. Se Paes se candidatar a governador, o PT ganha a prefeitura da capital de presente. É uma questão que pode ser explorada pelos petistas. Eles rifariam o Lindbergh e ganhariam a prefeitura da capital.

Para Cesar Romero Jacob, a oposição ao grupo de Sérgio Cabral é uma indefinição. Ele lembra que os antigos desafetos políticos Anthony Garotinho e Cesar Maia não compuseram bem a aliança municipal que tinha Rodrigo Maia como candidato a prefeito e Clarissa Garotinho como vice na chapa DEM/PR em 2012.

– A aliança de Garotinho com Cesar Maia não foi boa a nenhum dos dois. Os respectivos eleitorados rejeitaram a aliança. Foram anos de cada um deles falando mal do outro. Não tenho a impressão de que por aí vá dar alguma coisa...

Lopes Pinto brinca que, se fosse do PSDB do Rio, saberia por onde começar as articulações rumo a 2014:

– Para PT e PMDB, a aliança não pode azedar. Se eu fosse do PSDB, procuraria minar o acordo entre PT e PMDB no Rio, porque isso poderia se refletir no cenário nacional.

"Corrupção e ditaduras só são insuportáveis quando se mexe no bolso do povo"

Os efeitos do mensalão no jogo político revelam-se ainda difusos e dividem analistas. Um dos casos mais complexos e simbólicos da história recente do país, o esquema de compra de apoio político ao governo no Congresso, supostamente comandado por José Dirceu, ministro-chefe da Casa Civil no primeiro mandato do ex-presidente Lula, foi levado ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012. A Ação Penal 470, ou simplesmente julgamento do mensalão, contabilizou 25 condenados, entre os quais os ex-líderes do PT José Dirceu e José Genoíno, além do operador do esquema, Marcos Valério. A última etapa do julgamento ainda tramita no STF, que decidirá nos próximos dias se é tarefa da Câmara ou do próprio Supremo determinar a saída dos parlamentares condenados.

Apesar do imenso interesse público em ver condenados os participantes do simbólico caso de corrupção, traduzido na popularidade do relator e presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, o PT passou relativamente incólume às acusações e ao processo com contornos midiáticos. Lula foi reeleito em 2006, um ano depois do escândalo, e fez a sucessora, Dilma Rousseff, quatro anos depois.

Cesar Romero Jacob afirma que o mensalão conteve, até certo ponto, o crescimento do PT, mas não influenciou o resultado de nenhuma eleição. O especialista explica que a corrupção e os regimes ditatoriais só revelam-se insuportáveis e relevantes para as urnas quando vêm associados a crise econômica, quando mexem no bolso da população:

– Por que o povo se mobilizou contra o Collor e não se mobiliza contra o mensalão? Porque ele mexeu diretamente na poupança, no bolso – pondera – Mas, quando se vive uma situação de prosperidade, a tendência das pessoas é deixar para lá. É indiscutível que o Rio de Janeiro, sob o governo de Sérgio Cabral, vem melhorando de vida, mas também são indiscutíveis as relações de Cabral com Fernando Cavedish e, portanto, com a Delta. Não se fala nisso porque estamos numa boa maré. A ditadura brasileira é outro exemplo. Só se percebeu que ela existia quando o milagre econômico acabou. Houve Primavera Árabe no Egito, onde há dificuldades econômicas. Por que não há na Jordânia, onde o rei é tão ditador quanto o foi Mubarak? Porque ele beneficia a população.

O cientista político acrescenta que também é difícil levar o tema corrupção ao grande debate político porque muitos partidos tem "telhado de vidro":

– O tema da corrupção não é tão relevante porque todos têm o seu telhado de vidro. Como é que o DEM vai falar da corrupção no PT com o caso de Demóstenes Torres? Como é que o PSDB vai falar de corrupção se existe o mensalão tucano em Minas? Por isso niguém explora muito estes pontos na campanha eleitoral.

Vista como "boa moça", Ficha Limpa deve ser complementada

A Lei Ficha Limpa foi aprovada a partir da mobilização de milhões de brasileiros. A sua promulgação, em 2010, e a sua entrada em vigor, nas eleições de 2012, a consolidaram como um marco da luta contra a corrupção no país. Entretanto, especialistas avaliam que ainda há o que melhorar.

O professor João Roberto Lopes Pinto considera a lei um avanço do ponto de vista pedagógico e de cidadania. Ele, no entanto, ressalva: leis que punam o corruptor e que regulamentem o financiamento público de campanha não permitiriam que a iniciativa da Ficha Limpa ficasse tão frágil e, além disso, atingiriam a base dos cíclicos problemas que despejam, a cada ano, 50 bilhões de reais no ralo da corrupção do Brasil:

– O principal avanço é pedagógico, de conscientização da população sobre a importância do voto. Mas há campanhas que, se avançassem, dariam mais efetividade à Ficha Limpa, como a lei contra a corrupção, que pretende punir também os corruptores, e a discussão sobre financiamento público de campanha. A Ficha Limpa é o início, é educativa, mas, do ponto de vista concreto, fica frágil sem outras medidas.

Ricardo Ismael avalia ser necessário algum tempo para que a população, a mídia, as organizações políticas e a Justiça absorvam as mudanças que a lei provoca no modo de se fazer política no país. Ismael também dimensiona a importância do exemplo do alinhamento político a valores republicanos por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 30/2010, que exige ficha limpa aos servidores públicos:

– A cultura política precisa de um tempo para absorver certas mudanças. O eleitor não percebeu os benefícios que a lei traz. Talvez, no futuro, a justiça eleitoral possa se aparelhar melhor para divulgar dados, quantas e quais candidaturas não foram homologadas e o por quê. Fazer um balanço dá mais transparência a esta análise, porque esta lei faz um papel que poderia ser feito pelo eleitor, caso se tivesse mais interesse no pleito e na politica.  É importante os candidatos terem ficha limpa. É tão importante que pretende aplicar a Ficha Limpa aos servidores públicos. Mas isso leva tempo, não é em uma eleição, porque ainda estamos em cima desta mudança.

Cesar Romero reconhece que há maneiras de se burlar a Lei da Ficha Limpa, mas acredita que os resultados positivos da legislação serão colhidos aos poucos. Para eliminar a necessidade de leis deste tipo, o cientista político idealiza mudanças drásticas no ensino público brasileiro:

– A lei vai dar frutos aos poucos, não de uma vez só. O fato de ir eliminando o ficha-suja, em si, não é uma garantia, porque os familiares se candidatam e usam o nome e o prestígio deles. O principal mecanismo contra tudo isso seriam ensinos fundamental e médio de qualidade, que permitam a formação de uma classe média escolarizada, com sua propria renda e serviços públicos que funcionem. Barra, Zona Sul e Tijuca votam com mais independência porque é a classe média urbana do Rio que tem renda e escolaridade. Onde o problema é mais sério? Nas camadas populares, em que o politico usa o centro social para angariar votos da população com menos renda e escolaridade. O ficha-suja atua predominantemente na necessidade dos mais pobres.

Caso chegue ao STF, questão dos royalties deve levar anos

Os royalties são os pagamentos feitos pelas empresas produtoras aos governos para a exploração de recursos naturais. No Brasil, os maiores valores pagos em 2012 são os R$ 2,2 bilhões da água, dos quais 45% vão para os municípios produtores, o R$ 1,9 bilhão da mineração, que destina 65% para os municípios afetados pela produção, e as compensações pagas por hidrelétricas e mineradoras, que somam mais de R$ 4 bilhões e ficam nas mãos apenas das regiões produtoras.

A descoberta de petróleo na camada do pré-sal, nas bacias de Campos-RJ e Santos-SP, em 2006, deve proporcionar ao Brasil uma receita de US$ 28 bilhões em exportações até 2020. Segundo pesquisa da auditora Ernst & Young e da FGV Projetos são esperados, até o final desta década, volumes de 600 mil barris exportados por dia. Se estes números se confirmarem, será um aumento de 73% em relação a 2010, o equivalente a US$ 16,1 bilhões. Entretanto, a distribuição desses valores entre os estados e municípios brasileiros despertou um discurso que quebraria os contratos vigentes e faria os estados produtores, como Rio de Janeiro e Espírito Santo, perderem dinheiro. A parcela cairia dos atuais 26% para 20% já a partir de 2013. Só o Rio perderia R$ 3,4 bilhões em 2013, o que comprometeria os investimentos para a Copa e as Olimpíadas e levou cerca de 200 mil pessoas a protestarem no centro do Rio, em novembro. O projeto, aprovado pelo Congresso, foi vetado por Dilma Rousseff, que lavou as mãos: “Eu já fiz todos os pleitos. O maior é vetar. Não tenho mais o que fazer”, afirmou a presidente em visita oficial à Rússia.

As bancadas ligadas aos estados não produtores, contudo, já se manifestaram e colhem assinaturas para derrubar o veto presidencial. Caso a derrubada do veto da presidente se concretize no Congresso, Rio de Janeiro e Espírito Santo devem entrar na Justiça e, segundo Cesar Romero Jacob, a questão pode se arrastar por anos no Supremo Tribunal Federal (STF): “os estados não produtores ganhariam, mas não levariam”.

– A preocupação fundamental da Dilma é menos o Rio de Janeiro e mais que o assunto entre na esfera da Justiça. Se isso acontece, não se consegue fazer leilão algum na área do pré-sal tão cedo. Os governadores querem outras coisas, como a renegociação das dívidas dos estados. Eles pressionam aqui para ganhar ali. Sabem que todos perdem caso o veto de Dilma seja derrubado. (J.P.C)