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Rio de Janeiro, 21 de dezembro de 2024


País

Valorização no currículo move recorde de voluntários

Caio Cidrini - Do Portal

10/12/2012

 Arte: Caio Cidrini

Quando a bola rolar pela primeira vez na Copa do Mundo de 2014, em 12 de junho, os torcedores de todo o planeta voltarão os olhos para o Brasil durante um mês. Sem poder assistir a nenhuma partida das 64 programadas, os voluntários jogam nos bastidores. Desde o meio do ano, começaram a ser escalados para diversas funções associadas à organização do torneio, que carrega a respondabilidade de corresponder à hegemonia verde-amarelo nos gramados.

O primeiro teste será a Copa das Confederações, que também abre oportunidade para brasileiros e estrangeiros participarem do programa de voluntários criado pela Federação Internacional de Futebol (Fifa), com apoio do Comitê Organizador Local (COL) da Copa do Mundo. Em um mês, o programa recebeu recorde de inscrições: 130.919. O número é superior às duas Copas anteriores: 48 mil na Alemanha, em 2006, e 70 mil, na África do Sul, em 2010. Em comum, esses jovens de variadas formações têm a certeza de que a experiência trará benecífios para a vida pessoal e a carreira. Assim pensa, por exemplo, a psicóloga Mariana Meneses, uma das mais de 130 mil inscritas para trabalhar no Mundial brasileiro. Aos 25 anos, ela atua como head hunter numa empresa de Osasco, região metropolitana de São Paulo. Mariana se diz "encantada pela gratificação que é ajudar as pessoas":

– Além disso, sempre me deslumbro com a festa pela televisão que é a Copa nos outros países. Desta vez será bem aqui. Quero ajudar participando dos bastidores – justifica.

À possibilidade de ver e integrar os bastidores de um Mundial soma-se ao reforço no currículo e a convivência com voluntários e profissionais de diversos países, línguas, culturas. Traços, segundo Mariana, de uma "experiência muito rica e benéfica por vários aspectos". 

Como tática curricular, o trabalho voluntário tende a bater um bolão. De acordo com a consultora em Recursos Humanos Cíntia Bortoto, a iniciativa adiciona pontos positivos na luta por uma vaga de emprego, sobretudo na iniciativa privada. A especialista explica que esse tipo de envolvimento sugere, por analogia, "vínculo a valores organizacionais".

– O sentimento de identificação está comprovado com o trabalho voluntário. Mas, é o contratante que precisa persuadir o candidato com seus valores. O voluntarismo é uma virtude, porém, precisa ser pensado empresarialmente – ressalva.

 Arquivo pessoal Nem sempre a iniciativa se converterá num trunfo decisivo para o emprego desejado, ou mesmo será percebida como uma espécie de investimento para colher divididendos pessoais e profissionais. Mariana Meneses conta que, fora o namorado, parceiro também de inscrição no programa da Fifa, boa parte dos amigos achou curiosa a ambição de integrar o time de voluntários da Copa, especialmente pela lógica predominante segundo a qual é obrigatório remunerar o trabalho produzido:

– Fui questionada por uma amiga: "Por que você quer ser voluntária? Vai fazer o que lá?". Talvez eu não troque tanta experiência como espero, mas com certeza vou ganhar conhecimento. Há outros tipos de remuneração – pondera.

A psicóloga já acumula trabalhos do gênero. Trabalhou voluntariamente em hospitais para portadores de necessidades especiais e na organização dos Jogos de Comunicação e das Economíadas de São Paulo. Ela acredita que tais experiências contribuam para cumprir as exigências da Fifa.

Mariana terá 27 anos quando a bola rolar na Copa. Acredita que ainda não estará casada, nem com filhos. Portanto, terá supostamente facilidade para se deslocar até Itaquera, onde fica o estádio do Mundial Copa mais próximo de sua cidade, ou para outra cidade-sede. Se for selecionada, ela pretende conciliar os 20 dias de trabalho voluntário com as férias no emprego: 

– Ainda tenho dois anos para me organizar. Espero que compreendam o tamanho do evento e sua importância – diz ela, referindo-se a familiares e aos atuais empregadores.

Fifa determina turnos de até dez horas em, no mínimo, 20 dias de trabalho

São Paulo, o estado de Mariana, foi a unidade da Federação recordista em inscrições, com 33.208. Logo depois vêm o Rio, com 18.763 possíveis voluntários, e Minas, com 13.247. O restante dos candidatos dividem-se entre Amazonas, Bahia, Ceará, Pernambuco, Paraná e Rio Grande do Sul.O gerente do Voluntariado do COL, Rodrigo Hermida, comemora também o grande volume de estrangeiros inscritos:

– Tivemos 4.386 inscrições de outras nacionalidades. Além do intercâmbio cultural que caracteriza o voluntariado em grandes eventos esportivos, a participação de estrangeiros garante a oferta de voluntários para áreas que necessitam de pessoas que falem outros idiomas – destaca.

À primeira vista, as exigências da Fifa assustam. A entidade cobra dedicação por, no mínimo, 20 dias corridos, com turnos diários de até dez horas, e sem a chance de escolher a tarefa executada.  Como a própria a palavra sugere, o voluntário não recebe qualquer tipo de remuneração. Os auxílios restringem-se a uniforme, alimentação e transporte dentro da cidade-sede.

Apesar de indicar, na inscrição, a área de preferência, o voluntário pode trabalhar somente em dois grupos: os especialistas e os generalistas. Os especialistas atendem áreas como imprensa, departamento médico e serviços de idioma. Os generalistas contemplam a maior parte dos setores e ficam centrados no  atendimento ao público em geral. Para se determinar o grupo do voluntário, o perfil individual é verificado, assim como as habilidades específicas. Cada vaga requer conhecimentos, competências e disponibilidade próprios. 

A Fifa pretende escalar 7 mil voluntários para a Copa das Confederações e 22 mil para a Copa do Mundo. Números que geraram críticas de parlamentares e do setor privado, pois a legislação brasileira restringe o recrutamento de voluntários às entidades públicas e instituições sem fins lucrativos. Porém, a Lei Geral da Copa abriu uma exceção para a Fifa e o Comitê Organizador.

A inscrição foi feita de maneira única: ao se cadastrar, concorre-se a vaga de voluntário na Copa das Confederações, na Copa do Mundo e os respectivos sorteios de grupos.  Os primeiros 167 selecionados já trabalharam no sorteio da Copa das Confederações, no sábado passado. Mariana Meneses não estava nesta primeira equipe, mas não deve jogar a toalha: de acordo com o COL, a lista final para a Copa das Confederações sairá só no fim do mês.

Os 7 mil selecionados passarão por dinâmicas de grupo, entrevistas e treinamentos geral e específicos. Este processo começará em fevereiro e se repetirá em dezembro de 2013, com os  voluntários selecionados para a Copa do Mundo. 

Calouro quer  "treinar o inglês e conhecer pessoas"

Também na expectativa por ser voluntário em uma das competições, o pedagogo Bruno Lima  Caio Cidrini não desanimou com a reposta negativa para o sorteio da Copa das Confederações. Ele ainda espera conseguir a primeira experiência com voluntarismo:

– Foram só 167 vagas para trabalhar na capital paulista. Vou esperar dezembro todo por uma resposta positiva.

O jovem de 23 anos se inscreveu de olho na perspectiva de "treinar o inglês e conhecer novas pessoas".  A vontade de ter esse tipo de experiência é tanta que ele também se inscreveu como voluntário para Jornada Mundial da Juventude de 2013, no Rio. A falta de remunação não o incomoda:

– Dinheiro é bom, mas acredito que alguns sacrifícios nos acrescentam muito mais para o futuro. A experiência contará para alguma coisa.

Lima acrescenta que "uma cultura de trabalho voluntário pode mudar o rumo do país e colaborar com os anseios da sexta maior economia do mundo". Por ora, torce que seus anseios sejam atendidos pela Fifa. 

Quando o voluntarismo vira oportunidade profissional

Pedro Cunha resolveu fazer do voluntarismo sua vida. O estudante de Economia é idealizador do projeto Viva Hoje, organização não governamental voltada à construção de  qualidade de vida e qualidade ambiental. Cunha tem experiência com trabalho voluntário desde os 14 anos, quando se confrontou com uma série de dificuldades em torno do tratamento de um câncer diagnosticado na sua mãe. Foi voluntário do projeto Renascer, grupo que conduz atividades de reinserção social com crianças que passam meses em hospitais.

Antes de ingressar no ensino unievrsitário, Pedro participou, por seis meses, de trabalhos voluntários na Nova Zelândia, inclusive no Greepeace. Na volta ao Brasil, decidiu desenvolver o próprio projeto e fazer dele seu ofício e sua filosofia de vida. Criou, no ano passado, a ONG Viva Hoje.

– Todas as pessoas que se envolveram com o projeto são colaboradores e voluntários. Especialmente, na troca de conhecimentos – conta. ­

 Arquivo pessoal O "voluntário profissional" acredita que o voluntarismo pode somar valor a qualquer profissão. Ele lembra, contudo, que teve de vencer a resistência da família, desejosa de um estágio tradicional na área econômica. Ele oberseva ainda um preconceito em relação ao voluntarismo:

– No Brasil, o trabalho voluntário ainda é visto como uma pessoa que se doa e ajuda por caridade, não como uma experiência para o mundo profissional – critica.

Orgulhoso da ONG, ele argumenta:

– É uma troca de experiências, onde o dinheiro não é o mais importante, nem o meio de troca.

 

Jornada Mundial da Juventude reunirá, no Rio, 60 mil voluntários

Faltam pouco mais de 200 dias para a Jornada Mundial da Juventude, um dos grandes eventos internacionais programados para o Rio nos ppróximos anos. Na edição passada, em 2011, o encontro reuniu 30 mil voluntários. Eles receberem os cerca de  1 milhão de peregrinos que foram até a capital espanhola. No Rio, a expectativa é que o número de fiéis chegue a 2 milhões. A organização, portanto, espera contar com o dobro de voluntários. As inscrições ainda podem ser feitas na página do voluntariado da JMJ na internet

Já as inscrições para o programa de voluntários das Olímpiadas do Rio, em 2016, só abrirá em 2014. As regras do processo seletivo ainda não foram divulgadas, mas a natureza da função e o processo de seleção são similares aos da Copa. A diferença é o número de participantes: o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) pretende convocar cerca de 60 mil luntários para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Para Londres 2012, cerca de 240 mil se inscreveram e 100 mil foram entrevistadas.