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Rio de Janeiro, 20 de abril de 2024


Cultura

Histórias que o cinema conta

Letícia Simões - Do Portal

09/06/2008

João Ubaldo Ribeiro, no prólogo ao seu romance “Viva o povo brasileiro”, parafraseando Nietzsche ("Não há fatos, só interpretações"), escreve: "O segredo da Verdade é o seguinte: não existem fatos, só histórias.” Estaria o cinema refazendo a história? Sob essa perspectiva, as pesquisadoras Mariarosa Fabris, Isabel Regina Augusto e Ana Rita Mendonça discutiram a capacidade do cinema contar histórias, na mesa "Cinema, Releituras e História". A professora Mariarosa Fabris (USP), abriu a discussão citando a parte americana do épico construído por Clint Eastwood sobre a II Guerra Mundial (são dois filmes sobre o mesmo tema com as visões opostas: a norte-americana e a japonesa). “A Conquista da Honra” critica a veracidade do herói de guerra – figura tão presente no cotidiano dos Estados Unidos. Já em "A batalha de Iwo Jima", seis soldados norte-americanos ergueram a bandeira de seu país e a cena virou fotografia, registrada por Joe Rosenthal. A imagem ficou famosa e serviu para angariar fundos no país a fim de continuar a batalha. O que o filme de Eastwood questiona é: até onde esses soldados foram heróis apenas por hastear uma bandeira?

Mariarosa propõe ainda outro questionamento: até que ponto essa foto foi forjada, reconstruindo a história? “A II Guerra tinha uma lógica e esta precisava ser explicitada – a razão desta foto ter existido”, ela explica. Ou seja, segundo ela, a fotografia pode ser usada para mentir, e em uma maior extensão, o cinema também. Porém, observa a professora, apenas os regimes totalitários usaram a fotografia de modo errado. Como outro exemplo, o filme de Sergei Eisenstein, "O Encouraçado Potemkin". Ela diz que o diretor russo transformou uma derrota histórica – a revolta dos marinheiros do encouraçado – em uma vitória propagandística.

A influência do neo-realismo italiano nos filmes brasileiros da primeira fase do Cinema Novo foi o tema da tese discutida por Isabel Regina (UFES). Para Isabel, a escola cinematográfica de Roberto Rosselini e Vittorio DeSica dialoga – que muitas vezes é copiada – por Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e Paulo César Saraceni.

Para isso, ela analisou os filmes “Barravento”, “Vidas Secas”, “Porto das Caixas” e “O Desafio”, examinando desde aspectos estéticos como luz, enquadramentos de câmera e perspectiva, até questões de roteiro. A conclusão? “’Barravento’, de Glauber, é um remake de “La Terra Trema”, do diretor Luchino Visconti, adaptado para o Brasil. ‘Vidas Secas’ tem cenas copiadas de “Ladri di Biciclette”, de DeSica e Saraceni – diretor de “Porto das Caixas” e “O Desafio” – têm muito de Rosselini”, ela conclui.

Ana Rita Mendonça (UFF), encerrou a discussão falando da seção sobre cinema brasileiro na revista Cultura Política, lançada durante a Era Vargas, para fazer propaganda do regime. O curioso é que nesta coluna havia reflexões de desafio e oposição ao governo. Ela foi extinta no número 27, mas é  fonte de informações preciosas sobre história do cinema e da impresa brasileira.