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Rio de Janeiro, 27 de julho de 2024


Cultura

Preço, a parte mais sensível da bilheteria

Letícia Simões - Do Portal

02/06/2008

Sempre que um ciclo de debates sobre cinema é organizado, uma mesa discutindo o mercado do cinema brasileiro não pode faltar. Distribuição, exibição, produtoras, público, preço do ingresso: palavras sempre presentes. O Socine não poderia ser diferente. Para Leandro Mendonça, da Universidade Federal Fluminense, é preciso esquadrinhar os processos econômicos do cinema para criar uma nova paisagem hoje. Sua tese é sobre o modo de produção e distribuição na década de 50 – mais especificamente, o modo de produção da Atlântida Cinematográfica e do grupo Luiz Severiano Ribeiro. Os dois funcionavam através da substituição de importações, em um modo cooperativo. O Severiano, segundo Mendonça, conseguiu até construir um sistema próprio, com a sua legislação, e entrar em um mercado dominado pelas produtoras de cinema americanas.

Se a fala de um foi sobre produção, a de João Guilherme Barone, professor da PUC do Rio Grande do Sul, roteirista e documentarista, foi sobre a exibição. O modelo de exibição americano dominou o mercado: filmes blockbusters, com grande número de cópias e pesado sistema de mídia. Mas a produção do cinema brasileiro vem aumentando – e o número de salas, diminuindo. Como fazer para esses filmes serem exibidos?

É uma máxima de qualquer diretor brasileiro: o filme tem que ser visto na primeira semana. Se não, vai para o limbo. As grandes produtoras – as chamadas majors, como a Columbia e a Fox – funcionam no esquema americano: o sucesso de uma produção será medido pela renda feita no primeiro fim-de-semana. Que tipo de filme pode encarar essa briga com o cinema americano? Qualquer filme precisa de divulgação para lotar as salas e o responsável por fazer isso é a distribuidora. Para Barone, a Embrafilme funcionava muito bem como distribuidora nacional, mas ela foi extinta no governo Collor. Hoje, não existe nada nesse molde – e as produções brasileiras ficam presas às estratégias das majors.

“Tem que acabar com a falácia de que filme brasileiro com menos de um milhão é um fracasso”, reclama Barone. Para ele, cada filme tem seu espectador. O importante é encontrar seu público e saber distribuir, saber operar dentro das perspectivas de cada um. Como exemplo, ele citou o novo filme de Carlos Gerbase, “3 Efes”. Ele não foi co-produzido nem será distribuído pela majors. Apóia-se no roteiro: quer contar uma história sem grandes produções.

“3 Efes” é uma co-produção da Casa de Cinema de Porto Alegre com outras produtoras gaúchas. A Casa de Cinema e a Vortex entraram com o dinheiro e as outras com serviço – no total, foram gastos 96 mil reais. O filme estreará sem dívidas. Ou seja: o que ele arrecadar, a partir de seu lançamento, é lucro. Não será distribuído em cópias de 35 mm – custaria 110 mil para passar do digital para a película – mas, sim nas salas da Rain, rede exibidora de filmes digitais.

A última fala foi de Allan Rodrigues, advogado especializado em direitos autorais. Ele explicou como funcionam os contratos entre produtoras e distribuidoras. Para ele, há um excesso de amadorismo jurídico no meio audiovisual brasileiro. O produtor não sabe quais são suas responsabilidades, e isso acaba prejudicando o filme. Segundo Allan, a primeira dificuldade do produtor é conseguir as autorizações de todas as pessoas envolvidas: sem a base jurídica, o filme fica enlatado. Depois, ele tem a obrigação de realizar o filme. Se isso não acontecer, o profissional pode sofrer uma indenização. Cartaz do filme “3 Efes” Lançamento em dezembro.

“Tropa de Elite” continua sendo tema presente em qualquer discussão sobre cinema. O público perguntou a Barone se ele achava que era ou não estratégia de marketing o vazamento do filme três meses antes da estréia. O professor ficou desconcertado com a pergunta, e acabou respondendo que a distribuição nos camelôs realmente ajudou – potencializou algo. Leandro Mendonça foi mais incisivo: “o modelo atual está fazendo água”. Segundo ele, a pirataria foi responsável pelas classes populares irem ao cinema: eles compraram o filme, aprovaram e reviram na telona. Allan encerrou a discussão dizendo que o problema era a infração aos direitos autorais – o filme distribuído não foi o filme que o diretor escolheu.