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Rio de Janeiro, 8 de maio de 2024


País

Paes extrai cacife olímpico para voo mais alto em 2018

Renan Rodrigues* - Do Portal

09/10/2012

 Arte: Maria Christina Corrêa

Reeleito com aproximadamente 65% dos votos válidos, Eduardo Paes reconheceu que, como criticaram seus opositores, as deficiências na saúde e na "mobilidade urbana" revelam-se desafios prioritários nos próximos quatro anos; e considera o alinhamento com as administrações estadual e federal, um dos trunfos na campanha, essencial para superá-los. Outro desafio é converter o cacife olímpico extraído das urnas em voos mais altos. Não propriamente para a sucessão do governador Sérgio Cabral em 2014, pois a projeção de entrar para a história como o prefeito da Olimpíada 2016 reduz a chance de antecipar sua saída, mas para tornar-se o nome forte do PMDB ao Palácio Guanabara em 2018. Tendência que, segundo o cientista político Cesar Romero Jacob, depende, entre outros fatores, da capacidade gerencial amplificada pelos recursos e pela visibilidade decorrentes da Copa e dos Jogos.

– O principal desafio para o Paes, neste segundo mandato, é continuar desenvolvendo os projetos que envolvem a Copa, a Olimpíada e a revitalização do Porto. É o que vai ter mais visibilidade e dinheiro. Ele precisa fazer bons eventos e se mostrar capaz de gerenciá-los – avalia o professor da PUC-Rio, autor do recém-lançado A Geografia do Voto nas eleições para prefeito e presidente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo

 Arquivo Portal Ainda de acordo com o especialista, a expressiva votação de Paes reitera a hegemonia na região do grupo liderado por Sérgio Cabral e ajuda a lubrificar a máquina política do PMDB no país. Apesar da queda em relação a 2008, o partido manteve a liderança no volume de prefeituras: 1.008 eleitos, quantidade suficiente para conservar o capital político em composições voltadas às urnas de 2014. Outro grande vitorioso, observa Romero Jacob, revela-se o PSB de Eduardo Campos. Não só triplicou a quantidade de prefeituras (433), como protagonizou vitórias emblemáticas no Recife e em Belo Horizonte. Se o PMDB era tradicionalmente considerado uma noiva cobiçada no mundo das articulações políticas, o PSB insinua-se igualmente estratégico.

Embora os analistas evitem projeções precipitadas, não seria exagero considerar que o mérito eleitoral do PSB impulsiona a possibilidade de Eduardo Campos sair como candidato a presidente, ou a vice, em 2014. Também cacifado, mas ainda em âmbito local, o xará carioca apega-se às competições internacionais e a reformas de grande visibilidade, sobretudo a portuária, para também acalentar ambições majoritárias. O também cientista político da PUC-Rio, Ricardo Ismael, concorda que os recursos federais mostram-se decisivos para manter alta a popularidade do prefeito que parte para o segundo mandato:

– Paes aproveitou a onda de investimentos do governo federal para a Copa e a Olimpíada. As melhorias no Rio ajudam a popularizar a gestão municipal.

Deveres da casa para o segundo mandato de Paes

A saúde e a mobilidade urbana foram eleitos, pelo próprio prefeito, os grandes desafios para o segundo mandato. Apesar dos avanços observados, o sistema público de saúde do Rio ainda é um dos piores entre as capitais brasileiras, segundo ranking divulgado neste ano pelo SUS. Alçá-lo ao topo revela-se uma tarefa olímpica. Caso consiga cumprir o prometido, Paes pode anabolizar ainda mais a aceitação entre os eleitores, pondera a analista Maria Alice Rezende de Carvalho. A missão começa, segundo ela, com a ampliação do acesso à saúde. Para alcançá-la, acrescenta Ismael, é preciso aumentar o número de vagas nos hospitais:

– A construção de novos hospitais é fundamental para ampliar o número de atendimentos. Hoje, faltam vagas. A reforma dos hospitais recentes também pode ajudar na revitalização da saúde carioca.

Já sobre as políticas públicas para a mobilidade urbana, Ismael acredita que os corredores exclusivos de ônibus, os BRTs, seguirão como rumo predominante da prefeitura para dirimir os engarrafamentos. Maria Alice preferiria que os esforços se voltassem para o transporte sobre trilhos, mesmo sendo de responsabilidade do governo estadual:

– O grande transporte de massa é o transporte de trilhos. Acho que seria muito importante que os trens fossem modernizados e fosse feito um grande investimento de ramais ferroviários. Os acidentes indicam a necessidade de cuidado maior – argumenta a professora – Para reduzir o fluxo de automóveis, é preciso investir mais na qualificação do transporte público, que não pode se restringir ao BRT.

Deflagrada a corrida para o Palácio Guanabara

O cacife obtido com a votação histórica permite a Paes ambicionar voos mais altos. Ainda assim, Ricardo Ismael acredita que o prefeito cumprirá, como garantiu em discursos e entrevistas, o mandato até o fim – especialmente pelo "glamour de ser o prefeito na Olimpíada", confessou ele à BandNews Fluminense. Assim, o vice-governador Fernando Pezão será o provável candidato do PMDB à sucessão de Cabral.

– O PMDB aproveitou a própria comemoração do Paes e lançou o Pezão. Ele já aparecia ao lado do Sérgio Cabral e esteve, agora, ao lado do Eduardo Paes. A vitória expressiva dele o firma como uma liderança do partido. Embora seja cedo, acredito que o momento do Eduardo Paes seja em 2018, quando Pezão não poderá se reeleger – projeta Ismael.

Por outro lado, Maria Alice afirma ser “quase impensável que um candidato com 65% de voto na capital não seja lançado”. Segundo a professora, a enorme quantidade de votos dá margem para uma candidatura antecipada, mas ressalva:

– É só uma possibilidade. O Paes diz que não vai deixar a prefeitura. É preciso esperar para ver o compromisso dele com o Pezão.

O efeito Freixo, que concentrou votos de protesto

: Arquivo Portal Embora os holofotes cariocas concentrem-se na reeleição de Eduardo Paes, no que representa para cidade e para o futuro político fluminense, Maria Alice considera que os 28% dos válidos obtidos pelo segundo colocado, Marcelo Freixo (PSOL), significam o ponto “mais importante do processo eleitoral” no Rio. Segundo a professora, o significativo resultado frente à aliança de 17 partidos do atual prefeito foi importante para a democracia:

– Essa campanha colocou os jovens na rua para o debate público. Ela inaugura uma etapa mais interessante com temas, agendas, problematização das políticas e dos procedimentos. A cidade não pode viver sem uma oposição – lembra a analista política.

Romero Jacob pondera que parte da votação de Freixo não veio de eleitores tradicionalmente de esquerda. Refletiu um descontentamento de parte do eleitorado:

– O Freixo teve, em parte, votos de protesto. Na orla, onde teve votação expressiva, os eleitores não são tradicionalmente de esquerda. Não é um voto ideológico no PSOL, mas um voto de protesto. Tirando a votação expressiva que a esquerda sempre tem na região da Grande Santa Tereza (Santa Tereza, Lapa, Maracanã, Laranjeiras, Vila Isabel e Tijuca), os votos que teve na Zona Sul vêm dos descontentes com o PT e o PSDB na cidade.

Fim da tradição brizolista na capital fluminense

Ainda no balanço das eleições municipais, ele depura, da vitória do PMDB, a consolidação do grupo comandado pelo governador Sérgio Cabral (PMDB). Em viés oposto, a derrota da aliança entre Cesar Maia e Garotinho indica, conforme o analista, o fim da tradição brizolista na cidade:

– O resultado desta eleição aponta a hegemonia inconteste do grupo político que controla a cidade hoje. A derrota de Rodrigo Maia, que significa a derrota do Garotinho e do Cesar Maia, mostra o declínio da força da família brizolista na cidade, que dominou o Rio por 25 anos.

A reeleição de Rosinha Garotinho em Campos, com 69% dos votos, indica a força que o grupo do ex-governador do Rio de Janeiro ainda possui no Norte Fluminense. Ricardo Ismael acredita que Anthony Garotinho, governador entre 1998 e 2002, pretende sair, novamente, como candidato:

– O Garotinho quer ser candidato. Só não será se a justiça eleitoral torná-lo inelegível. Ele tem um potencial de voto, mas é difícil ganhar pela rejeição na capital.

Cesar Maia foi o terceiro vereador mais votado nesta eleição, com 44 mil votos. Considerado uma força antiga na capital, o ex-prefeito do Rio de Janeiro garante, ao menos, a sobrevivência do partido:

– Cesar Maia mostrou que o DEM não acaba, por enquanto, no Rio. A força dele caiu comparada com os anos 90, mas considero que a votação dele foi alta para uma eleição como vereador, onde existe uma divisão dos votos. Agora, não podemos garantir sua permanência até o fim do mandato – ressalva Ricardo Ismael.

“Padrinhos influenciarão menos em São Paulo”

Do outro lado da Dutra, um contraste com a folgada vitória de Eduardo Paes. Após liderar boa parte das pesquisas de intenção de voto para a prefeitura da cidade de São Paulo, Celso Russomano, do PRB, ficou de fora do segundo turno, com aproximadamente 22% dos votos. José Serra, do PSDB, e Fernando Haddad, do PT, conseguiram, respectivamente, 31% e 29%. Agora iniciam a caçada pela herança de Russomano e de Gabriel Chalita (PMDB). Cesar Romero acredita que Haddad terá de aumentar sua força na periferia e avançar para o Centro, onde o eleitorado tucano é mais forte. Serra tentará descolar-se da imagem de continuísmo.

Considerada decisiva para alçar Haddad ao segundo turno, a participação de Lula não será tão importante agora, avalia Ricardo Ismael. Ele afirma que a polarização entre dois candidatos favorece o debate e reduz o peso das alianças na disputa entre o “novo” e o “experiente”:

– O PMDB e o PRB devem apoiar o Haddad, mas isso não garante voto. Os debates terão um peso maior, enquanto os padrinhos influenciarão menos. O resultado em São Paulo é imprevisível.

A cientista política da Universidade de São Paulo (USP) Maria do Socorro Souza Braga projeta que Fernando Haddad será o maior beneficiado com o alinhamento de candidatos adversários derrotados no primeiro turno. Para ela, Chalita, que obteve 13,6% dos votos, e Celso Russomano tendem a apoiar o ex-ministro da Educação. Já Soninha Francine (PPS), que obteve 2,65% dos votos, declarou apoio a Serra.

– Eu imagino que, devido aos atritos nessa campanha, o Chalita se alinhe ao Haddad. A maior dúvida fica por conta do Russomano, mas, como o partido dele faz parte da base do governo, ele também tende ao candidato do PT. Parte dessa votação crescente do Haddad veio justamente da queda do Russomano nas duas últimas semanas de campanha – lembra a professora.

A especialista da USP arrisca uma previsão. Baseada neste alinhamento de Chalita e Russomano e na rejeição de José Serra principalmente na periferia, Maria do Socorro aponta como mais provável a vitória de Haddad:

– As chances de Serra ser derrotado num segundo turno seriam menores numa disputa com Russomano. Mas, como seu oponente será Haddad, estas chances aumentaram. Serra tem muita rejeição em São Paulo, principalmente nas periferias, que são mais simpatizantes do PT e podem ser decisivas ao Haddad. Eu vejo como tendência uma vitória do Fernando Haddad nestas eleições.

Sob o fantasma do mensalão

Caso confirme a previsão da analista e vença na capital paulista, Haddad aliviará um pouco as derrotas sofridas pelo PT no Recife e em Belo Horizonte. Maria do Socorro atribui esta queda do PT nas votações ao "efeito-mensalão":

– Vejo um “efeito-mensalão” nessa eleição. Considerando o Brasil como um todo, o PT teve uma votação abaixo da esperada. Parte desse declínio na votação pode se explicar pelas apurações sobre o mensalão e julgamentos de pessoas como José Dirceu. O segundo turno coincide justamente com o fechamento deste processo, quando as coisas ficarão mais quentes. Isso pode ser um trunfo do Serra, mas Lula, Dilma e PT saem fortalecidos com o segundo turno em São Paulo.

Ainda sobre o mensalão, Ricardo Ismael concorda com a certa influência do julgamento em curso no STF nas urnas, mas é precavido sobre a sua extensão da interferência:

– Não há como não ter uma consequência de um julgamento durante a eleição. Em São Paulo, houve uma pesquisa segundo a qual 19% dos eleitores disseram que tinham o mensalão como uma das referências para decidir o voto. Ele é um dos temas que o eleitor analisa, mas não dá para precisar ao certo o tamanho dessa influência.

Vitoriosos de 2012

 Arquivo Portal O atual governador de Pernambuco e presidente do PSB, Eduardo Campos, foi apontado por analistas como o maior vencedor dessas eleições. As vitórias da legenda em Belo Horizonte e Recife, ambas sobre o PT de Lula, tornam Campos um dos principais alvos das especulações associadas à corrida presidencial. Ismael levanta três possibilidades, mas acredita que a escolha só será tomada em 2014:

– Eduardo Campos pode continuar na base do governo Dilma, sair como presidente, o que ele mesmo deseja, ou fazer dobradinha com Aécio neves do PSDB. É difícil precisar agora o caminho que será tomado.

Com a vitória de Márcio Lacerda (PSB) sobre Patrus Ananias (PT) na capital mineira, o senador Aécio Neves confirmou sua força política e manteve acesa a possibilidade de ser o candidato tucano ao Palácio do Planalto em 2014. Mas a grande surpresa nas urnas, para Ricardo Ismael, veio do PSD, partido fundado em 2011 por Gilberto Kassab, atual prefeito de São Paulo. O partido fez, em todo o país, 493 prefeitos, perdendo apenas para o PMDB, o PSDB e o PT:

– O partido do Kassab teve um desempenho muito bom e mostra que ganhou musculatura- explica o professor.

* Colaboraram João Pedroso Campos, Tiago Coelho e Rodrigo Serpellone.