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Rio de Janeiro, 18 de abril de 2024


Cidade

Eleitores calouros renovam a fé na participação política

Vitor Afonso* - Do Portal

08/10/2012

 Arte: Carlos Serra

O Brasil segue a tendência mundial do alheamento dos jovens em relação à política. Segundo recente estudo da agência paulistana Na Mosca, brasileiros entre 16 e 30 anos apresentam-se pouco participativos nessas questões. Dos 784 ouvidos, 57% identificam escassez de representantes políticos que lutem pelos interesses da juventude, apenas 10% se dizem satisfeitos com a prática política no país e 24% gostariam de ser mais engajados politicamente. Além disso, as eleições municipais de domingo registaram alto índice de abstenção no Rio: 20,45% do eleitorado faltaram às urnas. Na contramão deste cenário, eleitores abaixo de 18 anos contrariaram os números e renovaram a fé no processo democrático. Estimulados por redes sociais, votaram com orgulho, envolvimento, esperança. Assim fizeram os estudantes Cassio Cabral, Lucas Leite Padilha e Pedro Czarny, todos de 17 anos, faces do futuro político brasileiros. Os três calouros em votações têm em comum um engajamento de dar inveja a muitos veteranos.

Cassio tirou o Título de Eleitor no ano passado, quando completou 16 anos, e "já tinha intenção de votar desde aquele momento, mesmo sem ser obrigado". Desejo consumado ontem, entre os 4,7 milhões que votaram no Rio (veja a galeria de fotos). Ele conta como foi a estreia:

– Acordei por volta das nove e meia, tomei banho e café, e fui votar. Entrei na sala, entreguei meu documento e uma das mesárias ficou me olhando. Acho que estava surpresa por eu ser jovem. Gastei menos de um minuto para votar. Depois fui para casa, acompanhar as notícias sobre os resultados – empolga-se.

Cassio desconsidera o caráter facultativo do voto para quem tem menos de 18 anos. Para ele, o apelo está na possbilidade “fazer a diferença”, não numa determinação legal:

– Acredito que o voto é um meio pelo qual eu posso fazer a diferença. Ficar parado não muda nada, mas votar conscientemente pode melhorar aquilo que não está bom.

 Caio Cidrini Morador da Vila da Penha, Zona Norte, acompanhou a apuração das urnas pela internet, mídia na qual também se informou sobre candidatos. Calouro empenhado, comparou biografias e propostas, e contou com os debates para decidir o voto:

– Assisti ao último debate entre os candidatos a prefeito do Rio para ter certeza em quem votar.

O estudante avalia que a relação entre os jovens e a política era "mais difícil" até pouco tempo atrás. Mas, percebe uma mudança positiva nestas eleições:

– A maioria dos jovens estava desencantada e só votava por obrigação. Agora eu vi um movimento, um comprometimento maior por parte de muitos jovens, procurando saber cada vez mais sobre o assunto, sobre os candidatos. Acredito que a relação do jovem com a política fique mais forte depois destas eleições.

Apesar da confiança, Cassio revela que poucos amigos menores de 18 anos votaram no domingo. A estabilidade econômica, segundo ele, pode ter causado um certo desinteresse:

– Os jovens do meu bairro não sentem tanto os problemas da sociedade, porque a maioria é de classe média, ou alta. Levam uma vida boa, diferente de outras pessoas que precisam de mudanças.

“O meio muda pelas pessoas”, ressalta jovem eleitor.

O universitário Lucas Leite Padilha, também fez sua estreia como eleitor. Amante das discussões políticas, estava ansioso para votar pela primeira vez. Ele acredita que possa influenciar outros jovens:

– Sempre gostei de me posicionar politicamente.  Acho que posso mudar outras cabeças e, assim, influenciar o resultado. Não acho que a pessoa mude pelo meio, mas o meio muda pela pessoa – argumenta. Carlos Serra 

Morador de Nilópolis, na Baixada Fluminense, diz que "a falta de opções em sua região dificulta a escolha eleitoral". Mesmo assim, lembra a importância do processo democrático:

– É complicado votar aqui. Apesar disso, eu me senti muito importante. Votar sendo menor de idade faz deste ato algo especial.

O estudante de Direito revelou que o primeiro domingo como eleitor foi um “dia atípico”. Diferentemente dos demais fins de semana, a ansiedade o fez levantar relativamente cedo :

– Eu acordei umas oito horas, com vontade de ir votar. Cheguei na seção às onze.

Contagiado pelo fervor democrático, Lucas incentivou os primos também menores de 18 anos a votar. Ele reeforça que "os jovens unidos podem fazer a diferença":

– Por exemplo, o Freixo (candidato do PSOL à prefeitura do Rio) foi muito votado pelos jovens. Não foi suficiente para levá-lo ao segundo turno, mas fez uma diferença. Um voto sozinho não faz diferença, mas a coletividade pode mudar.

Redes sociais mobilizam os jovens

 Arquivo pessoal Mudança, para Pedro Czarny, outro calouro em votação, significa "consciência". Ele é contrário, por exemplo, à anulação do voto, pois "isto não é uma forma de exercer a democracia". O envolvimento nas eleições deste ano foi pavimentado pela internet:

– A rede social colocou os jovens dentro da campanha política. Eu comecei, a partir daí, a me interessar mais por política. A exposição de ideias nas redes sociais me fez tirar o título. Comecei a me preocupar de verdade por política graças aos debates das redes.

A iniciação de Pedro começou, no entanto, bem antes, quando o ainda garoto acompanhava a mãe, Joelma Czarny, nas votações. Desta vez, a sensação foi "diferente":

– Quando eu votava com minha mãe, ela deixava eu apertar os números. Agora eu tive o poder de votar de verdade. Fiquei até com um friozinho na barriga quando a urna eletrônica fez o barulhinho que indicava o fim do voto. 

A aproximação da polítiva desdobra-se na carreira que pretende seguir. Pedro quer cursar Ciências Sociais, para ficar ainda mais próximo daquele universo:

– É uma forma de fazer com que a política faça parte da minha vida sem necessariamente seguir a carreira política – justifica – Acho a nossa geração diferente da anterior neste sentido. A conectividade é maior, o debate político expande-se para as redes sociais.

O estudante estava tão empolgado com a sua primeira vez que sonhou com a urna na véspera de concretizar o desejo:

– Dormi tarde e sonhei que estava votando. Quando acordei, fui logo votar. O dia não tinha cara de domingo, a vibe estava diferente. Não sei explicar, mas não foi um dia comum. A expectativa era muito grande.

Velho problema e belo exemplo também marcam as eleições.

Embora Cassio, Lucas e Pedro representem um reencontro da juventute com a política, a relação de L.N., também de 17 anos, morador da Baixada, confirma a distância que democracia representativa ainda precisa percorrer até o ideal. Ele revela que recebeu propostas de vender o seu voto por R$ 50 e até pensou em aceitá-las. Receberia a mesma quantia se topasse fazer boca de urna, o que é proibido pela Justiça Eleitoral.  Carlos Serra

– Mesmo não sendo obrigado a votar, tirei o meu título. Os políticos são iguais, não ajudam em nada. Não me sentiria culpado por vender meu voto. Assim poderia ter alguma vantagem, já que os políticos roubam todos nós – dasabafa o jovem, destilando sua desesperança na classe política.

Por outro lado, Neuza Costa, de 73 anos, é mais um retrato da confiança, apesar das falhas, na política e nas instituições democráticas. Mesmo desobrigada a votar, diz que continuará indo às urnas “enquanto tiver fôlego”:

– Enquanto eu tiver pernas e ânimo, estarei votando por uma cidade melhor – orgulha-se, com um sorriso largo.

Ela aproveita a onda cívica para pedir uma "maior atenção dos brasileiros nas eleições":

– Se nosso município, estado e país estão desse jeito, é por causa de pessoas que acham que tudo é festa e só pensam em seus próprios interesses. Os brasileiros têm os governantes que merecem.

* Colaboraram Caio Cidrini, Carlos Serra, João Pedroso Campos  e Renan Rodrigues