Projeto Comunicar
PUC-Rio

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Rio de Janeiro, 19 de abril de 2024


Cultura

Jornalistas propõem um olhar além da notícia

- Da sala de aula

28/04/2008

 Gabriela Ferreira

A impressa precisa cultivar uma visão menos imediatista, para combater o risco da redundância, do sensacionalismo e do preconceito. Sem cair no lugar-comum das cartilhas, o alerta foi o tom convergente das palestras de três craques de diferentes áreas do jornalismo impresso: João Marcello Erthal, editor de polícia de O Dia; Rodrigo Fonseca, repórter e crítico de cinema de O Globo; e Bruno Agostini, editor-executivo da agência de comunicação Selulloide. No auditório (102 K) lotado de alunos do curso de Comunicação, os profissionais converteram fragmentos de suas rotinas em lições e risos - não necessariamente nesta ordem.

Seis meses à frente da editoria de polícia foram suficientes para o ex-editor de Cidade do Jornal do Brasil e ex-repórter especial da revista Carta Capital inaugurar uma lente mais amadurecida na cobertura policial. Um começo.

- Minha missão é tirar o ranço de "presunto" das reportagens - brincou Erthal, também reconhecido no meio jornalístico pelo senso de humor afiado.

"Como assim?", replicou uma aluna.

- É preciso cobrir o crime além do fato - disse o jornalista - Não basta listar os mortos, os feridos. Não basta contar que houve bangue-bangue neste ou naquele morro. Para que a imprensa cumpra o papel de esclarecer e discutir questões importantes da sociedade, é preciso contextualizar o crime. Enxergá-lo dentro do contexto da segurança pública.

A mudança de linha editorial não significa um descompromisso com o furo, com a notícia exclusiva, ressalva Erthal: "Significa manter um olho no fato e outro nas suas implicações sociais". Neste olhar duplo repousa a esperança de amealhar mais leitores numa era dominada pela exposição audiovisual e pelo avanço da internet. Missão impossível sem a velha habilidade do repórter em garimpar boas histórias.

- As novas tecnologias não substituem o apetite do repórter para encontar novidades, tampouco dispensam a construção de fontes de notícia. Na cobertura policial, a construção de fontes é especialmente delicada. Um trabalho de formiga - comparou Erthal.  

Na corrida por audiência, a busca pela informação exclusiva não deve romper as fronteiras da ética e da segurança, lembrou o especialista. Segundo ele, a morte de Tim Lopes, assassinado por traficantes junho de 2002, impôs à imprensa um modelo mais precavido de cobertura policial:

- Repórteres passaram a usar colete contra balas e a entrada nos pontos mais altos das favelas tornou-se proibitiva. A coragem indispensável ao bom jornalista não deve ser sinônimo de irresponsabilidade.    

Para Rodrigo Fonseca, coragem também deve fazer parte da rotina do crítico de cinema. Uma vacina contra julgamentos prévios, preconceitos. Como os que põem os filmes de super-heróis, por exemplo, na berlinda.

- Eu adorei "Rocky Balboa" porque ele me tocou - disse Rodrigo, para espanto de parte da platéia - Não posso negligenciar o diálogo que tenho com o filme na sala escura. É preciso fazer uma imersão, dialogar com o filme, o que fica impossível se entrar na cabine (sala de projeção) com uma idéia pré-concebida.  

Especialista também em quadrinhos, Fonseca esclareceu que a crítica jamais deve ser considerada um oráculo, uma verdade absoluta, e sim a descrição de uma experiência estética supostamente útil à vida dos leitores. "Não há pretensão de produzir algo definitico", afirmou.

Aos que pretendem virar críticos, o repórter do Globo fez uma recomendação com a habitual originalidade:

- Mergulhem na literatura, na poesia. Ela abre os horizontes, aguça a sensibilidade, o que é mais importante do que se informar sobre filmes, atores e diretores. Quando entro na cabine (para avaliar um filme), levo o meu ferramental técnico, mas também o meu ferramental afetivo.

Originalidade e sensibilidade, além de versatilidade, também são ingredientes essenciais para entrar no admirável mundo novo da comunicação integrada - prestação de serviços de comunicação por uma mesma empresa. A orientação de Bruno Agostini é quase uma auto-referência. Na Selulloide, organiza produtos editoriais para clientes variados, de siderúrgica a operadora de telefonia. Também escreve sobre carros, para a revista Vogue, e sobre turismo, para a Abril. Faz ainda críticas gastronômicas. Como isso cabe em 24 horas?

- É preciso administrar o tempo e estabelecer prioridades - aconselhou.

Sobre a tendência da convergência dos serviços de comunicação numa agência, Agostini destacou o crescimento da chamada "comunicação de conteúdo":

- Em busca de novos caminhos para falar com o público, as empresas estão investido em publicações que cativem os clientes em potencial. Isso representa um mercado em expansão para os jornalistas.