Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 15 de janeiro de 2025


País

Analistas reveem a virada política do ex-presidente Lula

Letícia Fernandes * - Da sala de aula

05/01/2012

 Arquivo Pessoal

Há um ano no cargo mais importante do país, a presidente Dilma Rousseff personifica o poder político de seu antecessor, o presidente por dois mandatos consecutivos (2002 e 2006) Luiz Inácio Lula da Silva. Na campanha de 2010, Dilma era chamada de "poste" político, e muitos analistas apostavam que a força de Lula não seria suficiente para içá-la ao Planalto. A equipe da candidata tinha, no entanto, um trunfo óbvio mas que se mostraria infalível: a imagem de Lula, que voltou à planície com espantosos 76% de popularidade. Dilma Vana Rousseff, até então desconhecida por grande parte do eleitorado brasileiro, foi eleita no segundo turno com 56% dos votos válidos, derrotando o tucano José Serra.

No ano em que a primeira eleição presidencial vencida por Lula e pelo PT completa uma década, é historicamente relevante pensar nas causas dessa vitória e no momento em que ocorreu. O ex-torneiro mecânico e líder sindical já tinha sido derrotado nas três eleições anteriores. Sua imagem radical causava pânico nos mercados. À medida em que ficava claro que ele venceria, o país entrou numa crise econômica, com o dólar chegando a R$ 4, a saída de capital estrangeiro e o aumento dos juros. Mas, dessa vez, Lula e sua equipe, capitaneada pelo marqueteiro Duda Mendonça, não disputaria eleição para perder:

– Através de várias pesquisas qualitativas, os coordenadores de campanha verificavam que o partido, a agressividade, a cor vermelha e até a barba do Lula afugentavam a classe média. Então ele aparou a barba, começou a usar terno. A figura dele ficou acima do partido – avalia Carlos Augusto Montenegro, presidente do Ibope.

Foi essa guinada para o centro, a ampliação das alianças políticas para além da esquerda e a queda de popularidade do então presidente Fernando Henrique Cardoso que fizeram com que o candidato petista fosse vitorioso nas urnas, apoiado pela classe média. “Essa grande classe média, que resolvia a eleição, decidiu dar um voto de confiança a ele, já que também não estava satisfeita com o Fernando Henrique”, completa Montenegro.  Além disso, o Brasil passava por um momento em que havia espaço para uma mudança de agenda política. Se antes ela era fundamentalmente econômica e costumava ditar sozinha o rumo das eleições, em 2002, com a estabilização da moeda, a agenda social pôde ser aprofundada.

– A eleição em 2002 se deve a uma agenda social que já existia desde o início dos anos 80, mas que o PT e seus aliados conseguiram colocar como principal. E para cumprir essa agenda, só podia ser o ex-operário, o batalhador – diz Luis Reznik, professor de História da PUC-Rio.

Os debates entre candidatos à Presidência promovidos pelas principais emissoras de televisão do país também influenciam frequentemente o resultado das eleições. O impacto deles para o esclarecimento da população é importante em qualquer ano eleitoral.

– A ideia (em 2002) era fugir do bate-boca da campanha e priorizar o debate de ideias. O formato que bolamos para 2002 foi inovador. Fomos a primeira TV do Brasil a fazer entrevistas com os candidatos, ao vivo, nos telejornais de maior audiência. Lula, depois de três tentativas de se eleger, se saiu bem em todos os debates. Mas ele ganhou a eleição porque a mensagem dele teve mais impacto no eleitorado, não por causa dos debates – ressalva o jornalista Ali Kamel, diretor da TV Globo e autor do livro "Dicionário Lula".

Outro fator que fez com que o Partido dos Trabalhadores passasse de oposição a governo foi a política de alianças com líderes de oligarquias regionais, principalmente com José Sarney. Isso deu a Lula um crescimento significativo no interior do Nordeste. Ao longo da campanha, ele alcançou uma presença expressiva no país inteiro, um mapa coeso e parecido com o que elegeu FHC por duas vezes. Nas últimas três disputas eleitorais, o presidente, que até então só se aliava com partidos de esquerda, percebeu que tinha um teto político. A esquerda não lhe daria mais do que 32% dos votos. Sem o apoio de outros partidos, Lula representava apenas a classe operária, tinha um discurso de líder sindical e angariava a maior parte dos votos nos centros operários industriais, mas nunca seria eleito. Era feroz defensor de um tema específico, e por isso sofria rejeição. Tinha um piso eleitoral, mas também um teto. Na tentativa de ir ao segundo turno, assumiu o ar de socialista moderno europeu.

– Naquele ano, Lula soube passar a mensagem que o povo queria aprovar, e fez isso de uma maneira eficaz: na forma e no conteúdo. Carta aos Brasileiros, Lulinha Paz e Amor, tudo isso acalmou o eleitorado, apesar de deixar nervosos os mercados – observa Kamel.

* Texto produzido para a disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso, lecionada pelo professor Arthur Dapieve.