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Rio de Janeiro, 25 de abril de 2024


País

"Governo precisa se preparar melhor para os verões"

Caroline Hülle e Thaís Bisinoto - Do Portal

04/01/2012

 Jefferson Barcellos

Os temporais que castigam São Paulo, Rio e Belo Horizonte desde o fim do ano passado – e põe a Região Serrana, por exemplo, em "alerta máximo" –, somados ao reconhecimento, pelo Planalto, da incapacidade em impedir mortes por causa das chuvas, como resignou-se há duas semanas o ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, reforçam a apreensão sazonal. Nos dois últimos verões, chuvas torrenciais deixaram quase 1.200 mortos no Rio (leia abaixo "Sucessão de tragédias"). Contabilizados os "desaparecidos", o número atinge 1.500. Para o professor de engenharia civil da PUC-Rio Alberto Sayão, especializado em geotécnica, “o governo precisa se preparar melhor para os verões”. Ele considera que o Centro de Operações inaugurado há um ano no Rio, com o monitoramento da capital fluminense por 450 câmeras, representa um avanço para a prevenção de tragédias do gênero – especialmente nas 117 áreas de risco no município, que reúnem cerca de 20 mil casas –, mas ressalva que, “apesar do sentido certo, o trabalho ainda não é suficiente”.

Na avaliação do especialista, a realocação de famílias é a principal prevenção contra aquele tipo de desastre, e deve ser feita "com mais seriedade". O ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, admitiu o atraso no mapeamento das áreas de risco identificadas em 251 municípios e na remoção das famílias destes locais. Só em 2014, segundo ele, tais iniciativas estarão concluídas.

A borracha nessa crônica da tragédia anunciada – pois "morrerão pessoas neste e nos próximos verões", previu Mercadante – exige, segundo o professor de geografia da PUC-Rio Marcelo Motta, especialista no estudo das dinâmicas do relevo (geomorfologia), mais investimento em planejamento urbano.  "Este é o primeiro passo para evitar outras tragédias como a do início do ano, na região serrana do Rio", observa Motta. Refere-se, sobretudo, à ocupação habitacional correta. Ele acrescenta que o mapeamento de risco e o treinamento da população para lidar com os deslizamentos também são importantes.

– A prioridade deve ser traçar um bom plano de habitação para a população. Sem política de habitação, as pessoas fazem por si só suas casas – alerta.

Sucessão de tragédias

Nos últimos dois verões, o Rio de Janeiro contabilizou mais de 1.200 mortos devido aos deslizamentos das encostas em áreas de risco. No primeiro dia do ano de 2010, 53 morreram em Angra dos Reis, na Costa Verde (RJ). A maioria das vítimas estava hospedada em uma pousada. Três meses depois, cerca de 160 pessoas morreram soterradas no Morro do Bumba, em Niterói, onde as casas foram construídas em cima de um lixão.  No início de 2011, mais de 900 pessoas morreram na região Serrana. As cidades de Friburgo, Teresópolis e Petrópolis foram as mais afetadas.

De acordo com a Secretaria Municipal de Habitação (SMH), o programa Morar Carioca, de planejamento urbano, investe R$ 2 bilhões em cerca de 73 mil domicílios, em 29 comunidades da cidade. Nelas foram construídos os Postos de Orientação Urbanística e Social (Pousos), órgão vinculado à Secretaria de Urbanismo, com a função de ordenar e normatizar a ocupação das comunidades. Ainda de acordo com a SMH, a prefeitura fez 14.508 reassentamentos, desde janeiro de 2009, por motivo de chuvas, obras públicas do Morar Carioca e de outros órgãos.

Sayão, ex-presidente da Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica (ABMS), sugere a criação de um órgão nacional para a coordenação de atividades relacionadas às áreas de risco:

– Fala-se em fazer análise de risco, mas isto não funciona. Precisa ser organizado um órgão nacional que dê continuidade às medidas em todos os estados do país – recomenda – Mais ou menos o trabalho que a Geo-Rio realiza na cidade do Rio.

Motta explica que o relevo montanhoso do Rio, associado ao clima tropical, cria condições favoráveis a deslizamentos, que "ocorrem antes mesmo de os humanos existirem sobre a Terra". Ele observa, no entanto, que esta dinâmica "natural das montanhas" é intensificada com a intervenção do homem:

Alberto Sayão esclarece que áreas de risco são "volúveis", crescem e variam de acordo com a ocupação desordenada e, na maioria das vezes, ilegal das encostas. Segundo ele, a metodologia para análise do risco deve se tornar mais precisa, considerando a probabilidade de deslizamento e as consequências.

"Possibilidade de novas tragédias não está excluída", afirma meteorologista do Inmet.

Segundo o meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) Lúcio Souza, o verão no Rio terá chuvas e temperaturas "dentro da média". Na região metropolitana, precipitações variam de 300mm a 600mm e temperaturas de 20 a 33 graus (entre mínimas e máximas). Assim, a chance de chuvas fortes e de transtornos "não está excluída":

– Vai ter dia de chuva forte, que causa transtornos. Novas tragédias ainda podem acontecer, e isso não é o anormal, é o esperado. O verão é a época do ano em que isso ocorre.

De acordo com o meteorologista, os modelos oceânicos apontam para a configuração do La Niña, fenômeno climático caracterizado pela redução da média da temperatura no pacífico equatorial, o que gera uma deficiência de chuvas no sul do país e um excesso no norte e no interior (muitas vezes, os açudes ficam inundados).

Novo sistema de monitoramento é integrado a 30 órgãos públicos  

Inaugurado em dezembro do ano passado, o Centro de Operações Rio (COR) é uma espécie de quartel-general da prefeitura. Composto por 300 computadores, faz o monitoramento da cidade 24h por dia, auxiliado por 450 câmeras espalhadas pela cidade. Integrado a cerca de 30 órgãos públicos, como Guarda Municipal, CET-Rio, Geo-Rio, Comlurb, Light, CEG e Metrô, o COR registra ocorrências como chuvas fortes, deslizamentos, acidentes de trânsito, e envia as informações para os órgãos responsáveis. 

Outro sistema de vigilância é o Alerta-Rio, que monitora em "tempo real" as chuvas no município e responde pela emissão de dois tipos de avisos: condição das chuvas (vigilância, atenção, alerta e alerta máximo) e probabilidade de escorregamentos (baixa, média, alta e muito alta). Este sistema existe desde 1997, mas foi integrado ao Centro de Operações no ano passado e ganhou uma nova página na internet (http://www.climatempo.com.br/alerta-rio/index.php), por meio de parceria entre a empresa de meteorologia Climatempo e o Geo-Rio, vinculado à Prefeitura do Rio. Meteorologistas comentam as condições climáticas e os usuários podem interagir via redes sociais. O serviço foi aprimorado com a instalação de um radar meteorológico no Sumaré, Zona Norte, em dezembro do ano passado.