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Rio de Janeiro, 20 de abril de 2024


Cultura

"Clipes conservam função decorativa da mulher"

Thaís Bisinoto - Do Portal

25/10/2011

“No Brasil, a mulher é mais explorada com papel decorativo do que em outros países, como a França”, afirma a professora de Comunicação da Uerj Denise Siqueira. Embora pareça deslocada desse tempo de projeção feminina no mercado e no comando político (Cristina Kirchner, reeleita na Argentina domingo passado, é o exemplo mais recente), a constatação escora-se nos videoclipes nacionais.  Segundo pesquisa de pós-doutorado de Denise, apresentada no seminário internacional História das sensibilidades: um campo em questão, organizado pela PUC-Rio em parceria com a Fundação Casa de Rui Barbosa, percebe-se uma contradição entre o formato produzido pelos jovens e para os jovens e o caráter conservador atribuído ao papel da mulher.

 Jefferson Barcellos  

De acordo com a doutora em Comunicação pela ECA-USP, a tinta conservadora revela-se mais forte no Brasil. Pelo menos em relação à França, onde foi feita parte da pesquisa.

– O universo do videoclipe é essencialmente masculino. Normalmente, a mulher aparece na função decorativa, relacionada à figura masculina. Infelizmente, no Brasil, as mulheres têm muito menos destaque do que na França – avalia.

A partir da seleção de mil clipes brasileiros e mil franceses, a pós-doutoranda estudou o comportamento não verbal dos jovens, ou seja, a linguagem corporal. Pois o corpo, observa Denise, é um elemento fundamental para se "falar em juventude", assim como a moda. Das formas corporais contemporâneas de comunicação entre jovens do meio urbano, a pesquisadora destaca o parkour – atividade desenvolvida na França, cujo objetivo é deslocar-se de um ponto a outro o mais rápido e eficientemente possível, usando as habilidades do corpo –, o hip-hop, o funk carioca e o basquete de rua.

Ainda em relação ao corpo, a professora de História Cultural da PUC-Rio Flávia Eyler compara as apropriações atuais aos significados observados na Grécia de Homero. Ao analisar textos do poeta grego, a especialista em história antiga e medieval e em teoria da literatura identifica uma "completa diferença" entre o corpo homérico das epopeias e a noção de corpo que se tem hoje:

– Na nossa tradição, o corpo, como palavra, está associado a trabalho. Da perspectiva filosófica, corpo relaciona-se com beleza. Em Homero, o corpo liga relações aparentemente tensas: ser e devir, necessidade e contingência. Questões trabalhadas pelo ser humano, mortal, que almeja a imortalidade.

Já a antropóloga Jane Russo, professora do Instituto de Medicina Social da Uerj, acrescenta que, a partir dos anos 1990, com a inauguração da terceira e atual etapa da sexologia – ciência da sexualidade –, instalou-se uma mudança no tratamento da sexualidade:

– Ela era tratada pela psicologia e psiquiatria como um processo simplesmente fisiológico, e passou a ser cuidada por urologistas e, também, pela indústria farmacêutica, que teve grande florescimento nesta época.

Jane ressalta o "fracasso da tentativa da ciência de medicalizar as disfunções sexuais femininas". Na avaliação da especialista, a rejeição por parte de cientistas e intelectuais feministas reforça a diferença de gêneros e é negativa para as mulheres.

Segundo a coordenadora do programa de pós-graduação em História Social da Cultura da PUC-Rio, professora Maria Elisa Mäder, o seminário internacional teve o mérito de "cruzar diversas áreas de interesse, como a história, a antropologia, a medicina e a comunicação". Ela reforça que iniciativas do gênero são importantes para aguçar a pluralidade necessária ao avanço acadêmico.