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Rio de Janeiro, 5 de maio de 2024


Cidade

Rio, o paraíso cinematográfico

Lucas Moretti - Da sala de aula

22/08/2011

 Divulgação

Ao mesmo tempo em que o Rio de Janeiro entra no circuito dos cenários dos roteiro de Hollywood, se firmando como capital das grandes estreias mundiais, a construção de salas de cinema na cidade segue o ritmo e expande a oferta de filmes para novos públicos. A cidade conta com 40 salas de cinema, número cuja tendência é aumentar ao longo dos próximos anos pelo estímulo do projeto ‘Cinema Perto de Você’, que visa desenvolver a cultura do entretenimento no mesmo público.

Inaugurado em 25 de dezembro de 2010, o Cine Carioca Nova Brasília, no Complexo do Alemão, acabou se tornando o símbolo dessa pacificação, levando a cultura do cinema a regiões anteriormente ignoradas pelas grandes empresas. Com 91 lugares e tecnologia 3D, a sala vem mantendo a média semanal de 54% de ocupação dos assentos, a maior do município.

– Este cinema ajudou na culturalização de toda a comunidade. Antes da ocupação não tínhamos opções de entretenimento. Já estava até pensando em me mudar e procurar oportunidades em outros estados – revela o gerente do cinema Welinton Cardoso, de 29 anos, morador da comunidade desde que nasceu, e que sente a emoção na pele ao sair de casa e ir todo dia ao cinema para trabalhar. – As pessoas ficam deslumbradas com o que veem. Para muitos, foi a primeira vez que puderam assistir a um filme no cinema – completa.

 Divulgação Há quase dois meses, os moradores de Irajá viveram uma experiência semelhante. O Cinesystem Via Brasil foi construído dentro do shopping do mesmo nome do bairro, com seis salas digitais, sendo duas 3D. Na mesma linha, o Cine 10 Sulacap abriu outras seis salas no fim do ano passado, atendendo a população da Zona Oeste.

– Toda avaliação de local para abertura de um novo cinema é baseada num estudo minucioso de itens como mercado local (oferta versus demanda), perfil de público, segurança e acessibilidade – explica a gerente de marketing do grupo Severiano Ribeiro, Patricia Cotta, que participou da estruturação dos cinemas Kinoplex Grande Rio e do Iguaçu Top, voltados para a Classe C e D, de onde saem os melhores resultados para a empresa. – Com o crescimento do poder aquisitivo das classes C e D, essas pessoas passaram a ter mais acesso a cultura e entretenimento. O retorno do Kinoplex Iguaçu, por exemplo, é tanto que é o líder na maioria das ações de venda antecipada – lembra.

As duas salas foram montadas a partir de investimento e financiamento do ‘Cinema Perto de Você’. O programa estimula os exibidores a abrirem salas em bairros populares das grandes cidade para ampliar a frequência nas salas, principalmente para os novos consumidores da classe C, que muitas vezes nunca viveram a experiência do cinema. De acordo com a Ancine, em todo o Brasil, R$ 500 milhões estão disponíveis para os projetos. No caso do Via Brasil, foram investidos R$ 4,6 milhões e o Cine 10 Sulacap, R$ 6,5 milhões.

– O projeto foi criado para ampliar, modernizar, fortalecer o mercado interno de cinema e acelerar a implantação de salas em nosso país. Quanto maior o mercado de salas de cinema, melhor para o filme brasileiro que depende do mercado interno para se viabilizar. O escoamento maior da produção nacional será uma consequência natural desse processo, levando em conta o bom momento que vive o setor da produção no Brasil, com uma média próxima a 80 lançamentos por ano – afirma o presidente da Ancine, Manoel Rangel.

 Mercado carioca

O crescimento do número de salas e o incentivo a construção de novos complexos parece ter tido efeito imediato. Perfil do consumidor de cinema do carioca levantado pelo Instituto Pereira passos indica que, em 2005, 2,8% dos frequentadores de cinema, iam à alguma sala somente uma vez por semana. Hoje em dia, esse número cresceu e já atinge os 5%, segundo dados de pesquisa do Sindicato das Empresas Distribuidoras Cinematográficas do Município do Rio de Janeiro. Pensando a frequência única às salas em um mês, a diferença é ainda maior. Seis anos atrás, apenas 6,8% tinham esse hábito. Hoje, já são 15%.

Apesar da ascensão evidente, o público de classe C e D ainda não conseguiu construir o hábito de frequentar o cinema. Segundos dados dos distribuidores de cinema, esse é o público-alvo do crescimento, com uma perspectiva de expansão em torno de 11% no Rio, o que equivale a três milhões de pessoas apenas no município. O grande desafio passa a ser conquistar esse público, uma vez que é formado, principalmente por mulheres, idosos e adultos com a escolaridade apenas até o ensino fundamental.

– No Brasil, filmes como Nosso lar e Se eu fosse você são blockbusters com público de todas as idades, mas Tropa de elite, Cidade de Deus e Carandiru repetem a fórmula "masculina" em termos de tema. Assim, seria necessário que um produtor interessado nesses públicos carentes de oferta fizesse pesquisas de opinião e de mercado para levantar seus interesses, e, então, produzisse para eles – responde o economista Marcondes Neto.

Para completar o desafio da indústria cinematográfica, as pesquisas apontam que elas não podem apenas abrir salas desenfreadamente. Ao mesmo tempo, é preciso descobrir uma fórmula de atrair e conquistar o consumidor, sem deixar de se preocupar com as necessidades deles. E nesse caso, esbarra justo no bolso. Hoje, o maior motivo de reclamação é a falta de tempo (36%) e o preço (29%) gasto durante o programa. Afinal, o gasto médio do carioca no cinema é de R$ 45,80.

Pacificação carioca

Desenvolvidas e postas em prática desde 2008 as Unidades de Polícia Pacificadora, as UPPs, serviram para dar um paço fundamental na revitalização urbana e recuperação do Rio. Áreas antes dominadas por traficantes, hoje, estão sob o poder do Estado. Até agora, 18 comunidades já foram ocupadas pelas forças armadas. A última favela a receber operações foi a da Mangueira, no último domingo.

A ocupação foi a conclusão de um planejamento inicial das autoridades para fechar o chamado cinturão de segurança na região da Grande Tijuca, área que circunda o estádio Maracanã, que será palco da final da Copa do Mundo de 2014. Para completar a agenda do Mundial, ainda é preciso entrar e dominar o Complexo da Maré, o que ainda não tem data prevista. A pacificação da Mangueira, já iniciada, beneficiará, diretamente, cerca de 21 mil moradores. Na região, pode atingir até 550 mil pessoas, de acordo com dados fornecidos pelo site official da própria oficial da UPP.

Planejadas e articuladas pelo Secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, as novas UPPs são anunciadas à população com antecedência, o que acaba permitindo a fuga dos bandidos. Mas o secretário minimiza o efeito colateral:

– Nosso objetivo principal é a retomada do território dominado pelo tráfico. Armas e bandidos vamos prendendo com investigações, sem traumas – escreveu em seu twitter.

Apesar da presença policial nessas regiões, isso não significa que as vendas de droga acabaram, apesar do crescimento de apreensões nas áreas ocupadas.

– Só no Alemão, apreendemos 36 toneladas de maconha e 418 quilos de cocaína. No Dona Marta, o volume de apreensões aumentou 300% – comenta o secretário, que ainda lembra dos últimos traficantes que foram presos justamente em regiões dominadas pela UPP – Semana passada prendemos o traficante Playboy no Alemão. Na Cidade de Deus, já prendemos 576 criminosos desde a implantação. No Pavão-Pavãozinho, 125 – completa.

A primeira UPP instalada no Rio foi no Morro Santa Marta, em Botafogo. Inaugurada no dia 19 de dezembro de 2008, é operada até hoje com 123 recrutas que foram preparados em um curso de especialização. Além delas, Cidade de Deus (Jacarepaguá, Zona Oeste), Jardim Batan (Realengo, Zona Oeste); Babilônia e Chapéu Mangueira (Leme, Zona Sul); Pavão-Pavãozinho e Cantagalo (Copacabana e Ipanema – Zona Sul); Tabajaras e Cabritos (Copacabana, Zona Sul); Providência (Centro); Borel, Andaraí, Formiga, Salgueiro e Turano (todos na Tijuca, Zona Norte) já receberam a unidade pacificadora.

* Esta reportagem foi produzida para a disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso, ministrada pela professora Carla Rodrigues, que debateu com os alunos, ao longo do primeiro semestre de 2011, a recuperação da cidade do Rio de Janeiro, seus desafios, perspectivas e impasses. O trabalho resultou numa série de cinco reportagens, publicadas no blog Rio de Janeiro em Debate, e agora pelo Portal. Leia também Uma marca para a Cidade Maravilhosa e Promessas para o porto.