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Rio de Janeiro, 5 de maio de 2024


Cidade

Promessas para o porto

Juliana Maiolino de Queiroz - Da sala de aula

15/08/2011

 Divulgação

Cidades europeias que tiveram projetos para seus portos até hoje são referência para os que ainda querem se modernizar. A revitalização da Zona Portuária do Rio de Janeiro é um projeto antigo (2001), cuja inspiração é o de outras revitalizações de áreas semelhantes em diversos lugares do mundo, como Barcelona, Buenos Aires, Londres e Hamburgo. A ideia original de cada um deles foi aproveitar uma região central para suprir o déficit habitacional da cidade e ainda usar as atividades culturais como forma de valorizar a região.

O projeto alemão HafenCity, por exemplo, visa transformar a zona portuária abandonada numa área com cinco mil apartamentos e 40 mil empregos. Prédios residenciais, comerciais e uma extensa área de cultura e lazer vêm sendo construídos. As obras tiveram início em 2007 e a previsão de término de todo o complexo é em 2025. A área de lazer ficou pronta em 2010, movimentando a economia da cidade, que tem seu centro a apenas 800 metros do complexo cultural.

Outro projeto de revitalização, o do Port Vell, em Barcelona, foi concebido no fim dos anos 1980 no embalo da realização dos Jogos Olímpicos de 1992, incentivando a criação de espaços culturais que pudessem integrar aquela área à Cidade Velha e, com isso, abrir a cidade ao mar. No Rio, essa ideia não foi possível de ser realizada devido à existência dos armazéns tombados junto à Baía de Guanabara. Mas há importantes semelhanças do projeto do Porto do Rio com a história da revitalização do Porto Vell.

Com a escolha do Rio de Janeiro para cidade sede dos Jogos de 2016, a prefeitura preferiu trazer alguns dos itens olímpicos para a região do porto, tais como vila de mídia e de árbitros, que originalmente ficariam na Zona Oeste. A ideia é, posteriormente, transformar essas edificações em habitações de baixo custo, gerando movimento no local e suprindo o déficit habitacional da cidade.

O arquiteto Júlio Bentes, associado ao Laboratório de Estudos sobre Urbanização, Arquitetura e Preservação da Universidade de São Paulo (LAP/FAU-USP), afirmou em entrevista que, por iniciativa do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), foi sugerido que parte dos equipamentos olímpicos de apoio fossem implementados. Para isso, foi necessário mudar o caderno de encargos dos Jogos Olímpicos após já ter ocorrido a escolha do Rio como cidade olímpica.

Se realmente houver interesse que a revitalização faça parte dos planos dos Jogos, as obras devem estar prontas até 2016, já ultrapassando a Copa de 2014, que terá o Rio como uma das sedes. Contudo, a exemplo das intervenções realizadas em outras cidades do mundo, o tempo para que elas sejam efetivas é bem mais longo, podendo levar até um par de décadas para que o Porto do Rio realmente funcione. 

A relação mais direta entre a revitalização do porto e os Jogos Olímpicos reside no fato de que o evento trará projeção mundial para o Rio. Sendo assim, seria importante que o local estivesse em boas condições, com grande oferta de serviços, e fosse um espaço urbano capaz de causar boa impressão aos visitantes. Os projetos de revitalização do Porto do Rio são bastante anteriores ao anúncio do Rio como sede olímpica e o Brasil como sede da Copa do Mundo.

As obras apenas começaram e os trabalhadores atuam principalmente na infraestrutura e, para isso, já foram feitas em grande número as remoções da população local.

O projeto Porto Maravilha engloba também serviços e espaços culturais, tais como o Museu do Amanhã, do arquiteto espanhol Santiago Calatrava, e o MAR (Museu de Arte do Rio), este já em execução, com prazo atual de entrega para 2012. Nos armazéns da linha do cais acontecem atividades culturais e exposições temporárias, mas há também o uso como parte da estação de passageiros e outros que ainda com fins portuários.

Para além da questão puramente cultural, Júlio Bentes lembra que o Porto do Rio continua como um grande exportador brasileiro, o segundo em valor agregado na relação dólar/tonelada, perdendo apenas para o Porto de Santos, embora nos últimos anos a área venha sendo subutilizada. Porém, a cultura não é uma novidade da revitalização, e sempre esteve presente na região, seja a oriunda da cultura africana, seja de estrangeiros – samba, jongo, candomblé – e, mais recentemente, pelas escolas de samba.

– Há mais de 30 anos, entes públicos e privados apresentam propostas de recuperação e renovação da área. As novas âncoras culturais são, na verdade, atrativos para a implantação de grandes empreendimentos – afirma Bentes.

Quem paga a conta?

O município do Rio de Janeiro se dispõe a investir nos espaços públicos a partir do dinheiro recebido com as CePACs (Certificados de Potencial Adicional Construtivo). Na última grande oferta, em junho, foram vendidos em lote único para a Caixa Econômica Federal todos os certificados da região do Porto do Rio, acumulando um montante de R$ 3,5 bilhões para os cofres da cidade. Essa verba está destinada à segunda fase de execução do projeto Porto Maravilha, que já começou. Uma das empresas que vai trabalhar com o governo é o Consórcio Porto Novo, que vai fazer as obras e gerir a área, sendo responsável pela conservação e manutenção urbana, como a limpeza de parques e vias públicas, coleta de lixo e sinalização de trânsito. A agenda da cidade está cheia para os próximos cinco anos, mas os itens que mais se destacam são a demolição do Elevado da Perimetral e a reconstrução de 700 quilômetros de redes de infraestrutura urbana, como água e esgoto.

Para a arquiteta Maria Fiszon, da M&T Arquitetura e Planejamento, a entrada dessa verba foi muito importante para a melhoria no entorno da Zona Portuária para que o projeto de revitalização funcione:

– Revitalizações urbanas têm que ser feitas com apoio do governo municipal. Senão, não há possibilidade de funcionar. Não existe intervenção urbana isolada: não basta mexer em uma pequena faixa e torná-la mais aprazível se não há mudança no sistema de transportes e nas regiões de acesso.

A união faz a força

Município, estado e União estão trabalhando juntos para o projeto de revitalização. O Governo do Estado do Rio é o que possui menos influência no Porto Maravilha, por ter poucos terrenos na região (6 %), enquanto o Governo Federal detém a maior parte dos lotes (62%) e a Prefeitura, com outros 6% dos lotes, atua coordenando a proposta. O capital privado possui 25% dos lotes do terreno da Zona Portuária. Mas, além da verba interna brasileira, espera-se que investidores estrangeiros participem financeiramente das obras, trazendo também o know-how internacional para o país.

– Nesse tempo de vacas gordas no Brasil e vacas magras na Europa e nos EUA, aparecem muitos consultores querendo prestar seus serviços, mas diretamente não há parcerias com europeus – disse Júlio Bentes.

O prefeito Eduardo Paes afirmou que é também intenção da prefeitura fazer parcerias com a iniciativa privada para a revitalização da região.

* Esta reportagem foi produzida para a disciplina Laboratório de Jornalismo Impresso, ministrada pela professora Carla Rodrigues, que debateu com os alunos, ao longo do primeiro semestre de 2011, a recuperação da cidade do Rio de Janeiro, seus desafios, perspectivas e impasses. O trabalho resultou numa série de cinco reportagens, publicadas no blog Rio de Janeiro em Debate, e agora pelo Portal. Leia também Uma marca para a Cidade Maravilhosa e Rio, o paraíso cinematográfico