Projeto Comunicar
PUC-Rio

  • Facebook
  • Twitter
  • Instagram

Rio de Janeiro, 17 de maio de 2024


Educação

Museus pensam em soluções para atrair novos públicos

Gisele Ferreira - aplicativo - Do Portal

24/09/2014

 Divulgação

Interatividade e tecnologia são aliados importantes, mas isoladamente não dão conta do desafio de atrair novos públicos aos museus, avaliam especialistas. A chave para a renovação e ampliação do público, acreditam, passa por programas educativos e por iniciativas de estímulo ao acesso que não fiquem restritas à simples gratuidade.

No Rio, pessoas com ideias e projetos interessantes para compartilhar sobre museus têm se reunido no Museums Showoff, iniciativa inspirada num modelo de apresentação criado no Reino Unido. Na segunda edição do encontro, mês passado, no Oi Futuro Flamengo, uma das questões debatidas foi a eficácia da gratuidade como estratégia para atrair diferentes públicos. Pesquisadora na área de museus e patrimônio, Renata Motta apresentou um projeto realizado junto ao Estado de São Paulo em que foram distribuídos passes para os 18 museus do estado. Porém, só ganhavam passes os visitantes que passavam pelas portas dos museus; logo, o público continuava o mesmo.

 Divulgação  Renata admite a necessidade de se pensar em outras estratégias para mudar essa perspectiva:

– Talvez a gratuidade pura e simples não seja suficiente, muito menos na perspectiva da necessidade de trazer as camadas econômicas mais baixas para os nossos museus. Temos que aprofundar a análise. A literatura mais consolidada na Europa e nos Estados Unidos indica que a gratuidade não garante a ampliação do perfil socioeconômico dos frequentadores. Não sei se no Brasil isso vale, pois não temos pesquisas de perfil nos nossos museus, quanto mais em relação à política de acesso. E aí outras estratégias talvez sejam bem-vindas.

Diretor do Museu da Vida, da Fundação Oswaldo Cruz, em Manguinhos, Zona Norte do Rio, Diego Bevilaqua concorda que somente a gratuidade não é suficiente para trazer novos públicos:

– A maior dificuldade que as pessoas encontram para ir ao museu é chegar nele. O fato de ser gratuito não significa que possam chegar ao museu.

Bevilaqua afirma que, mesmo não sendo suficiente, o passe livre nos museus é fundamental.

– Quando perguntamos o que, de fato, permitiu que as pessoas fossem ao museu, elas respondem que é a gratuidade. Então, se apenas a gratuidade não garante a mudança do perfil demográfico, é garantido também que sem ela não há mudança.

O diretor do Museu da Vida também destaca a importância de planos de interlocução com o entorno e com outros projetos da cidade.

– O campo de Manguinhos fica próximo de três grandes complexos: Manguinhos, Maré e Alemão, onde moram cerca de 235 mil pessoas, em uma região com alguns dos piores indicadores de desenvolvimento humano e econômico da cidade. Um projeto que unisse essas três comunidades seria um bem cultural para o entorno. Além disso, é importante incluir mais instituições no circuito de museus; quem olha o mapa de museus não vê o Museu da Vida. A maioria dos museus está concentrada na Zona Sul.

A pesquisadora Renata Motta, porém, não acredita que esse público vá se habituar a frequentar museus em curto prazo:

– Exige uma barreira simbólica. As pessoas de baixa renda não deixam de ir só porque não têm dinheiro para chegar, mas porque acham que aquilo não pertence a elas. É necessário haver um trabalho educativo para mudar esse quadro.

Programas educativos vem ganhando destaque em instituições como o próprio Museu da Vida, o Museu de Arte do Rio (MAR), o Museu do Amanhã e o Museu da Imagem do Som (MIS) do Rio, cuja nova sede está em construção na Praia de Copacabana.

 Divulgação Segundo a presidente do MIS, a historiadora Rosa Maria Araujo, o projeto educativo que será implantado estará focado em uma visão moderna da educação e buscará integrar escolas, famílias, turistas, idosos e moradores de Copacabana (veja também: Museu de Arte do Rio une cultura e sustentabilidade).

A sede, que será inaugurada no primeiro semestre de 2015, atendendo a critérios internacionais de sustentabilidade, interatividade e tecnologia, terá exposições permanentes e temporárias distribuídas pelos três pisos, a partir de 300 mil documentos recolhidos ao longo de 49 anos e 29 coleções contando a história de centenas de personalidades ligadas à cultura brasileira, ao rádio, ao samba, ao choro, à noite carioca. Para incentivar e trazer novos públicos ao museu, Rosa Maria aposta em atividades interativas com auxílio da tecnologia:

– O visitante pode sentar e assistir a um filme de 15 minutos. Também pode ouvir se formar uma roda de choro em turnos interativos. Pesquisar desde músicas de Carmen Miranda até todos os acessórios e figurinos usados por ela. Estarão disponíveis tanto quizzes sobre novelas como clássicos da bossa nova para serem contemplados.

Inaugurado em 3 de setembro de 1965 na Praça XV (onde ficará a reserva técnica, o MIS Pro), o MIS foi pioneiro ao instituir um novo modelo de museu audiovisual. Agora, Rosa Maria afirma que é hora de criar formas de acessibilidade a novos públicos, dando ênfase à vocação do MIS de ser um museu sobre a memória cultural e a identidade do Rio.

 Divulgação – Cabe aos museus ter uma política, uma forma de atrair as famílias, as escolas, pessoas de comunidades carentes. Um museu é atraente quando você sai da visita com perguntas, querendo conhecer mais, com vontade de voltar e de ir a outros museus. É interessante que o museu desperte interesse não só por conhecimento, mas também permita a experiência de contemplar, se maravilhar, ter momentos de alegria, de reflexão, de sentimento.

Rosa Maria acredita, porém, que já foi superada a ideia de que museu é sinônimo de algo ultrapassado, antigo e chato, principalmente entre as novas gerações: “As crianças de hoje já são de uma época em que o museu é divertido e interativo”.

Para a cravista e pesquisadora musical Rosana Lanzelotte, a idealizadora do projeto Musica Brasilis, que desde 2009 disponibiliza áudios, partituras e vídeos de compositores brasileiros na internet, qualquer exposição sem interatividade hoje é impensável. A interatividade permite criar coleções virtuais como as que o Musica Brasilis faz desde 2009. A exposição Rio 450 anos de Música, com curadoria de Rosana, reúne instalações digitais com sons que vão dos índios tupinambás antes da chegada dos portugueses até o funk, no Galpão das Artes no Espaço Tom Jobim, no Jardim Botânico, até 2 de novembro. Lá, recursos interativos como uma mesa de compor servem como meio de acesso aos conteúdos da exposição:

– Isso já faz parte do cotidiano. Temos uma porta de entrada para milhares de conteúdos que não poderíamos mostrar de outra maneira.

‘Selfies’

Rosa Maria comenta outra prática cotidiana presente em praticamente todas as experiências contemporâneas: a de se fotografar em todos os ambientes:

– Este não é um problema de uma exposição nem de um museu, é da modernidade, da nossa atualidade. Uma coisa é tirar a foto de uma personalidade, ou de um momento para eternizar um pôr do sol. Mas em certas situações fico perplexa, como quando se está assistindo a um balé ou outro espetáculo. A pessoa está usufruindo de um momento e fica mais preocupada com a foto, com o registro, do que com o que está sentido, o que é uma pena.

Avaliações do público

O público brasileiro tem compartilhado mais do que fotos nas exposições, mas também recomendações. As esculturas hiper-realistas do australiano Ron Mueck atraíram mais de 233 mil pessoas ao Museu de Arte Moderna do Rio no primeiro semestre. No Centro Cultural Banco do Brasil (CBBB), 1 milhão foram à exposição de Dalí, que acaba de se despedir, depois das também bem-sucedidas exposições de Escher, as bolinhas da artista plástica japonesa Yayoi Kusama. O site de turismo Trip Advisor divulgou na última semana a lista dos 25 museus mais bem avaliados pelos viajantes em todo o mundo, e duas instituições nacionais estão na lista: o Instituto Ricardo Brennand, em Pernambuco; e o Museu de Arte Contemporânea de Inhotim, em Minas Gerais.